Depois de passar por dois traumas – câncer de mama e de intestino –, o assunto me atrai sempre, com um agravante. Não entendo por que não sou beneficiada com a liberação da cobrança de Imposto de Renda, pois conheço muitos casos de sobreviventes beneficiados com essa graça.
Como ando de olho em tudo o que acontece, estou atenta a um exame de sangue novo para detectar a doença. Ainda é realizado só no exterior, plano de saúde nenhum banca, por causa do custo. Na última vez que pesquisei, o preço superava R$ 15 mil.
Fato é que a oncologia de precisão ganhou importante aliada: a biópsia líquida, que detecta a presença de materiais tumorais por meio da análise de amostra de sangue colhida como um simples exame, igual àqueles comuns de laboratório. Trata-se de um avanço em comparação à atual biópsia, realizada em fração do tumor.
A novidade apresenta grandes vantagens, sendo quatro as mais importantes. É minimamente invasiva; dá agilidade ao diagnóstico, que até então só era possível por meio da biópsia de um fragmento do tumor retirado por cirurgia; revela a presença de câncer mais precocemente, aumentando as chances de cura; e viabiliza o tratamento medicamentoso mais assertivo.
O oncologista Paulo Pizão explica que essa tecnologia analisa o DNA tumoral circulante (ctDNA), uma vez que nos vasos sanguíneos de pacientes com câncer circulam várias substâncias ou biomarcadores derivados de tumores. Não é só no sangue que o fenótipo maligno está presente – a biópsia pode ser feita em outros líquidos do corpo, como humor aquoso, saliva, ascite, líquido pleural, líquor e urina.
“A biópsia líquida é uma técnica não invasiva que identifica as substâncias liberadas pelas células cancerosas em quantidades mínimas, permitindo a detecção da malignidade em estágio inicial, o que pode salvar vidas”, salienta o médico.
O doutor Pizão enfatiza que ela pode ser usada para monitorar o progresso do tratamento do câncer. Como o procedimento permite a detecção de mutações genéticas e outras alterações no DNA, pode-se avaliar a eficácia do tratamento e fazer ajustes, se necessário, com mais rapidez e segurança.
“A técnica ajuda a personalizar o cuidado, garantindo que o paciente receba a terapia mais adequada para sua condição”, destaca o oncologista.
Devido à possibilidade de realizar o exame diversas vezes, a biópsia líquida viabiliza o acompanhamento do efeito das terapias quase em tempo real. “O médico pode prever se o paciente precisará de tratamento adicional e se desenvolverá resistência a certos medicamentos, apontando os que são pertinentes a cada tipo de tumor”, enfatiza Pizão.
Ainda não há conclusões sobre a eficácia do exame para todos os tipos de câncer, que são mais de uma centena. Em várias partes do mundo, incluindo o Brasil, já são comercializados os kits para coleta do líquido, que, por enquanto, é enviado para análise nos Estados Unidos.
O exame ainda não é coberto pelos planos de saúde, mas a tendência, conforme o doutor Pizão, é que esse cenário mude no futuro.
Uma das principais evidências de sua eficácia foi o estudo japonês referente ao câncer de cólon e reto feito com mais de 5 mil pessoas e divulgado no final de 2022. De acordo com ele, a biópsia líquida aponta a existência de elementos cancerosos na corrente sanguínea com o tumor até 10 mil vezes menor em tamanho do que a aferição obtida nos exames de imagem convencionais.
“O oncologista recebe dados valiosos que podem transformar a condução da terapia”, afirma o doutor Pizão. Outra vantagem da biópsia líquida é a aplicação para verificar se há resíduo de células cancerosas após a extração cirúrgica do tumor.
“É comum, depois da cirurgia, passar por quimioterapia ou radioterapia a fim de inibir a chance de haver partículas tumorais que podem facilitar a volta do câncer. Quem faz a biópsia líquida e o resultado não indica a presença de material residual do tumor pode não precisar dessas sessões que debilitam o paciente”, conclui o oncologista.