Eles falam de tudo, envolvem-se em polêmicas (deliberadas algumas) e confusões (que lamentam depois mas nunca se desculpam), e o tempo vai passando sem que anunciem os seus planos para superar o enorme atraso tecnológico do país, o buraco social de mais de dois terços da população e a estagnação econômica, que se transforma em regressão quando comparada aos avanços no resto do mundo.
No Brasil dos candidatos:
- O PIB cresce em V, o emprego vem forte, doméstica tirava férias na Disney antes da megadesvalorização do real, segundo Bolsonaro e o seu ministro liberal darwinista da Economia.
- Em seu tempo, pobre tinha vez, comia picanha, viajava de avião, havia emprego para quem quisesse trabalhar, segundo Lula.
- Mais reformas, mais mercado e menos Estado farão do Brasil um país europeu na América do Sul, segundo a turma da terceira via.
No Brasil real do IBGE:
- O salário mínimo médio real de 2022 é menor que o de 2019, quando Bolsonaro tomou posse.
- A renda per capita mal compra a cesta básica do mês.
- Em 12 dos 27 estados a população que vive do Bolsa Família, hoje Auxílio Brasil, excede a população com emprego formal.
- A população permanentemente fora da força de trabalho é 1,4 vezes maior que a população total da Argentina.
Alguns dados pinçados desses indicadores mostram o que deveria ser prioridade, bastando a PNAD, uma das muitas pesquisas do IBGE: da população de 172,2 milhões em idade de trabalhar, só 107,7 milhões estão na força de trabalho, dos quais 12 milhões estão desempregados. Significa que 64,5 milhões estão, permanentemente, fora da força de trabalho, sobretudo mulheres e jovens. Uma tragédia.
Motivos das frustrações
Tem-se como resultado uma massa de gastos sociais, em regra, alvo fácil, assim como o investimento público, dos programas de ajuste fiscal, diante da rigidez da folha salarial do governo federal, do Judiciário e do Congresso, além do déficit previdenciário.
A essa conta somam-se gastos que não geram impulsos estruturais em prol do crescimento econômico, como as emendas parlamentares, entre elas a aberração do tal “orçamento secreto” pilotado pelos chefes das Casas legislativas, em especial da Câmara, em comum acordo com a Casa Civil, braço político da gestão Bolsonaro.
Mínimo salário desde 1994
“Falamos de média anual, que é a que interessa às pessoas na vida real”, diz Montero. É o resultado do ajuste fiscal, que segurou a correção do salário mínimo à reposição da inflação. A constatação pode ter atenuantes (como a majoração e ampliação do Bolsa Família) e motivos (pandemia, inflação mundial, choques etc.). “Mas isso é um slide que falta nas apresentações oficiais”, ele ironiza.
E não é só isso. A cesta básica medida pelo Procon-SP subiu 3,35% em março, elevando o seu custo médio para R$ 1.137,20. “Nos últimos dois anos”, diz, “o salário mínimo perdeu quase R$ 200, comparado ao custo da cesta básica”. A perda é relevante para a maioria da população, os dois terços espremidos no piso da pirâmide de renda.
A recente cavalgada da inflação, puxada pelo preço dos alimentos, atinge mais os pobres, que gastam a maior parte do que recebem com comida e transportes, também pressionados pela gasolina e diesel. Como há mais gente recebendo bolsa que com emprego formal em 12 dos 27 estados, segundo compilação do Poder360 e estudo da FGV, os R$ 200 confiscados pela carestia fazem enorme diferença.
A situação é pior que a informada. Empregos com carteira são apenas 37,1 milhões, incluindo o trabalho doméstico, além dos 26 milhões por conta própria e 64,5 milhões à margem da população economicamente ativa.
Prisioneiros do passado
O traço eleitoral dos candidatos da tal terceira via repete o que se manifestara nas eleições de 2018: a sua dissociação absoluta dos anseios da maioria, ao se apegar a um modelo econômico que não mais conta com amplo apoio nas democracias ocidentais. Ou Joe Biden não estaria tentando mudar o “fundamentalismo de mercado”, travado pela direita Republicana (que cunhou o termo) não por divergir de seu programa, mas do identitarismo da esquerda do Partido Democrata.
Esses fragmentos ajudam a entender a nossa encrenca. Nem Bolsonaro consegue indicar um rumo que não seja o fracassado populismo autoritário, nem Lula parece informado de que não é com o mercado e o sindicalismo que se deve preocupar. É com a massa dos excluídos. Ela será atendida com crescimento gerador de empregos, movido a investimentos privados e públicos em infraestrutura e em tecnologia industrial. Nossos políticos continuam presos ao passado.