Vivo com medo da discriminação. Na minha faculdade, sou a única negra da minha turma, em minha volta não vejo pessoas da minha raça. Ajude-me!”
Maria Alice, de Belo Horizonte
Todo preconceito é um erro de visão. É uma distorção visual com relação ao mundo. Não existe ninguém igual a outro. Cada um de nós é único e diferente das demais pessoas. Essa diferença e singularidade vão se manifestar na cor da pele, no tipo físico, na condição social, na escolha religiosa, na opção sexual, na nacionalidade etc.
Esse é um lado da questão. Existe outro. Embora desiguais, somos profundamente semelhantes aos outros. Pelo fato de sermos gente e pertencermos à família humana, no essencial nos assemelhamos. O branco não é o contrário do velho, assim como mulher não é o contrário do homem. As pequenas diferenças entre os seres não nos dão o direito de colocá-los em campos opostos, como inimigos e competidores.
O preconceito é fruto de focarmos exageradamente as diferenças, esquecendo-nos da semelhança humana que nos faz partícipes da mesma festa da vida. Antes que negro, que mulher, que homossexual, que rico, que jovem, que muçulmano, somos gente. Há dois erros lógicos na postura preconceituosa.
Primeiro, enfatizamos o secundário, o periférico em detrimento do essencial. Por que enxergar a Maria Alice e defini-la como “preta” se, no essencial, ela possui um corpo com mesma beleza e funções de qualquer ser humano? Outro erro na maneira de pensar preconceituosamente é a generalização. Situamos o outro dentro de uma classe ou categoria e perdemos contato com aquela pessoa específica.
Assim não nos relacionamos com Maria, Vicente, Jacó e Pedro, mas com o velho, o judeu, o estrangeiro, o pobre ou o rico. E ao generalizarmos, atribuímos àquelas pessoas todas as características que fantasiamos a respeito de sua categoria: “todos os homens são iguais”, “todos os velhos são bons”, “os brasileiros são criativos”, “os muçulmanos são terroristas”, “os políticos são desonestos”.
A discriminação de uma raça, da mulher, do homossexual ou qualquer outra serve a um propósito: Compensar o sentimento de inferioridade daquele que discrimina. Para nos sentirmos superiores, elegemos no outro uma diferença que, na nossa maneira míope de enxergar, o coloca em situação inferior a nós.
Elevado ao extremo, nosso ímpeto dominador e arrogante face aos “inferiores” nos conduz à hostilidade, e até a tentativa de destruir o outro na sua diferença secundária.
Historicamente, temos um exemplo disso nas suas piores consequências. Hittler, do alto de sua inferioridade, exterminou milhões de judeus. Todo preconceito é insano e cruel e é a negação do amor na relação com o outro. A diferença é bonita. Ela institui o direito de cada pessoa ser ela mesma. A diversidade enriquece a vida e amplia o mundo. Admiramos a quantidade de flores diferentes, de distintos animais e não conseguimos ter o mesmo olhar para a grande maravilha da natureza: o ser humano.
Sonhamos com um mundo padronizado, onde todas as pessoas devam ser feitas à nossa imagem e semelhança. Tememos o diferente, o estranho, o esquisito, o “anormal”. E como o preconceito é cultural, até mesmo as pessoas objeto da discriminação também internalizaram o preconceito.
A leitora acima é preconceituosa com relação ao negro. Ela confessa a sua sensação de inferioridade, a sua autoestima enfraquecida. Se assim não fosse, porque compensar sua cor, tentando ser a melhor aluna, apresentar o trabalho mais brilhante? Ela se sente isolada, separada dos demais colegas e sente falta de outras pessoas da sua raça negra. Ela não consegue consentir que todos da sua sala pertencem à mesma raça humana. A sensação de superioridade ou de inferioridade é mental. É fruto de uma comparação. Se cada pessoa é única, completa em si mesma, como pode haver superiores e inferiores?
Contemplar a semelhança humana, admirando as diferenças individuais é a única forma de nos aproximarmos uns dos outros e de nos encaminharmos para o amor, o afeto e o respeito. Preconceito é uma doença emocional provocada por uma forma burra de ver o outro.