Jornal Estado de Minas

O ambiente de trabalho também precisa ser uma Ilha de Acolhimento


 
“Só volto a trabalhar de carteira assinada em outra empresa, quando ela comprovar que existe cultura inclusiva lá”. Essas foram as palavras de uma mulher transexual, que se repetiram durante uma entrevista que ela me concedeu, no início de 2020. Ela me contou que trabalhou durante um ano em uma empresa, onde sofreu diferentes perseguições e preconceitos por ser quem ela é. Depois de muita pressão, ela acabou pedindo demissão. 





Infelizmente, a experiência dessa moça não é a única. Muitas pessoas trans têm seus nomes e pronomes desrespeitados no ambiente de trabalho, algumas não se sentem à vontade ou seguras em utilizarem o banheiro e muitas até já sofreram constrangimentos na hora de fazer suas necessidades. E muitas empresas estão longe de oferecer um banheiro neutro para todas, todes e todos. Ter um nome e utilizar o banheiro. Dois direitos básicos negados. 
 
 
 
No ambiente de trabalho, criamos alguns laços e proximidades, não é mesmo? E é impossível não compartilhar alguma intimidade durante um cafezinho. “Meu marido está de ferias”, “minha namorada formou nessa faculdade”. Esses momentos são naturais e ajudam a manter o clima mais leve. Mas, para vários integrantes da comunidade LGBT%2b, essa conversa é evitada ao máximo, por medo de julgamentos e perseguições dentro da empresa. Muitas e muitos não se sentem à vontade para falar sobre sua orientação sexual e/ou sua identidade de gênero e isso acaba contribuindo diretamente no sentimento de não pertencimento. Só para você ter uma ideia segundo pesquisa da consultoria PwC, apenas 38% das mulheres atraídas pelo mesmo sexo se assumem no ambiente profissional. 

Quantas vezes colaboradores negros e negras já foram alvos de piadas na empresa que você trabalho e a liderança não fez nada? Aliás, quantas vezes você até já presenciou seu líder sendo o autor da piada racista? Pesquisa da plataforma de empregos Indeed, em parceria com o Instituto Guetto, entrevistou mais de 200 profissionais negros e constatou que 47,8% não têm a sensação de pertencimento nas empresas em que trabalham.%u2800





E quantas mulheres infelizmente foram assediadas no trabalho e ainda precisam conviver com seus agressores? O número é alarmante! 47% das brasileiras já sofreram algum assédio sexual no trabalho, segundo pesquisa do LinkedIn e da consultoria de inovação social Think Eva. O estudo ouviu 414 profissionais em todo o país, de forma online. Entre elas, 15% pediram demissão do trabalho após o assédio. E apenas 5% delas recorrem ao RH das empresas para reportar o caso. Além disso, de acordo com esse levantamento, a maioria dessas mulheres assediadas no ambiente de trabalho  são mulheres negras (52%) e recebem entre dois e seis salários mínimos (49%). 
 
Sem falar nos preconceitos que pessoas com deficiência, com obesidade ou sobrepeso, acima dos 50 anos, entre outras diversidades sofrem dentro das empresas. 
 
 
 
Já deu para entender que nem sempre o ambiente de trabalho é um lugar seguro para todos os colaboradores, não é mesmo? E é justamente aí que muitas empresas, algumas que até iniciaram o processo de promoção à diversidade, erram. Entre elas, existe uma resistência muito grande em entender que não existe diversidade sem inclusão! 

Ou seja, não basta apenas contratar pessoas que são negras, mulheres, LGBT , por exemplo, sem investir em ações para criar e fortalecer uma cultura inclusiva.

No artigo da semana passada, escrevi sobre a importância de sermos lhas de Acolhimento. Pessoas, grupos, lugares que são seguros, acolhedores e inclusivos. E o ambiente de trabalho também precisa ser uma Ilha de Acolhimento!
 
E não estou falando de oferecer uma palestra isolada ou uma semana da diversidade uma vez por ano na empresa. Sejamos sinceros: isso não muda nenhuma cultura. Estou falando de planejar, organizar e executar um projeto de diversidade e inclusão robusto que pode incluir: 
 
  • Repensar os critérios de contratação 
  • Capacitação e treinamento para o RH 
  • Palestras, rodas de conversa e treinamento para todos os colabores 
  • Palestras, treinamentos e mentorias  para chefias e lideranças 
  • Criação de Comitês
  • Programas de Trainees 
  • Formação para líderes que fazem parte da diversidade 
  • Investir em uma linguagem inclusiva e transparente 
 
Essas são algumas das maneiras de investir efetivamente, e de forma contínua, em Diversidade e Inclusão e iniciar o processo de mudança de cultura. 




 
E ninguém sai perdendo com isso, pelo contrário. Além de ter a promoção da justiça social, as empresas também podem ganhar ao investir efetivamente em diversidade e inclusão. Uma pesquisa da Harvard Business revela que empresas que têm esse comprometimento conseguem reduzir os conflitos em até 50% em relação às organizações que não investem em diversidade. Ainda segundo esse estudo, em empresas nas quais o ambiente de diversidade é reconhecido, os funcionários estão 17% mais engajados.
 
Com as equipes de colaboradores mais envolvidas e satisfeitas, a produtividade das empresas pode aumentar e isso resulta em maior lucro. Segundo a pesquisa da empresa de consultoria e gestão  McKinsey & Company, empresas com diversidade étnica e racial, por exemplo, têm 35% mais chances de ter rendimentos acima da média do seu setor.
 
 
 
Só para você ter ideia, já existem grandes acionistas pressionando empresas nos Estados Unidos para efetuarem investimentos reais em Diversidade e Inclusão. De acordo com dados compilados pela Bloomberg Intelligence, um recorde de 30 resoluções com foco em diversidade, equidade e inclusão estará na pauta das próximas reuniões anuais das empresas. 
 
Aí fica a pergunta, quais ações a empresa onde você trabalha tem adotado para realmente ser uma Ilha de Acolhimento? Onde você trabalha é um lugar inclusivo para todas, todes e todos? 





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