Quando você escuta a expressão "lápis cor de pele”, qual imagem vem a sua cabeça? É provável que você tenha lembrado dos primeiros anos na escola e de um lápis no tom bege bem clarinho, não é mesmo? Ou seja, de uma forma sutil, desde muito cedo o imaginário das crianças recebe estímulos que fortalecem a ideia que a pele branca é o tom correto, natural e belo, em detrimento de outros tons de pele.
Esse simples exercício diz muito como o mundo foi feito sem levar em conta a existência da população negra e suas demandas.
Só para você ter uma ideia, durante décadas, a indústria da fotografia não se preocupou em criar maneiras de retratar bem os diferentes tons de pele das pessoas negras. Pelo contrário, durante um longo tempo, essa indústria, conduzida por pessoas brancas, era voltada exclusivamente para pessoas brancas.
Não existia uma preocupação na prática em oferecer câmeras e materiais de revelação que favorecessem a pele negra. Sou um homem negro retinto e, por várias vezes, já fui alvo de racismo recreativo por não aparecer em fotos. Também já presenciei outras pessoas negras sendo alvos de piadas pelo mesmo motivo, principalmente nas décadas de 1990 e 2000.
Além disso, existem outros produtos que mostram como o mundo que nós conhecemos não foi pensado levando em consideração a população negra. Só para você ter uma ideia, foi apenas, em 2020, que a maior marca de curativos do mundo lançou de forma fixa uma linha de produtos em tons de pele negra. Em 2005, a marca chegou a lançar uma linha que oferecia diversas cores, mas foi descontinuada.
Só em 2018, que sapatilhas de balé em tons de marrom finalmente foram criadas, 200 anos após as brancas.
Isso também vale para produtos de beleza para a pele e cabelo. Apenas, recentemente, a indústria da beleza passou a oferecer com mais intensidade produtos que atendem as demandas da comunidade negra.
Outro produto que demorou para ser oferecido no Brasil são as toucas de banho e natação para cabelos volumosos, com tranças ou dreads. Isso só aconteceu com mais força a partir de 2018.
Sim, a lista é maior do que você imagina e essas ausências são frutos do racismo estrutural que muitas pessoas insistem em ignorar.
Lembra dos exemplos do lápis de pele e da indústria da fotografia que apresentei no início deste texto? Hoje é possível encontrar lápis de cor de diferentes tons de pele e a indústria da fotografia também evoluiu. Mas não se engane, essas mudanças não vieram porque simplesmente o mercado “acordou um belo dia mais consciente”. Essas mudanças só vieram na base de muita luta, reivindicações e resistência!
A representatividade desses e outros produtos, além de fortalecer a identidade da comunidade negra, também pode gerar emprego, renda e fortalecer a economia da comunidade negra.
Além disso, as empresas e marcas precisam entender que, de uma maneira geral, ano após ano, o consumo e representatividade irão ficar cada vez mais ligados. Isso também inclui a comunidade negra, que representa mais da metade (56%) da população brasileira.