Já parou para pensar como é a vivência de estudantes trans nas escolas e faculdades no Brasil? Estamos no mês da visibilidade trans e essa é uma excelente oportunidade para debater sobre esse assunto.
“Você não é mulher/homem de verdade”, “não adianta, você não engana ninguém”, “não vou te chamar de Alice, seu nome é Pedro”, “você nasceu mulher/homem e vai morrer mulher/homem”, “é menino ou menina?”. Infelizmente frases e piadas como essas acompanham a vida escolar e acadêmica de muitas pessoas trans.
Além disso, em diferentes momentos, como na chamada em sala de aula, o uso do nome social é desrespeitado e o acesso ao banheiro de acordo com o gênero com que a pessoa se identifica é negado para estudantes trans.
Só para você ter uma ideia, a pesquisa "Vivências reais de crianças e adolescentes transgêneres dentro do sistema educacional brasileiro", realizada pela ONG LGBTI+ do Grupo Dignidade, em parceria com a UNESCO, entrevistou 120 mães, pais e responsáveis que reconhecem ter uma criança ou adolescente transgênero. Entre os entrevistados, 77,5% informaram que seus filhos, crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos, já foram vítimas de transfobia no ambiente escolar.
E não se engane, muitas dessas “piadas” ou xingamentos e negações de direitos não são feitas apenas por colegas de classe. Segundo a pesquisa da “ONG LGBTI do Grupo Dignidade, entre os adultos autores das violências, 65% eram profissionais das instituições de ensino, sendo que 56% deles eram professores.
A pesquisa também mostra que 24% das famílias mudaram as crianças e adolescentes trans de escola em decorrência de transfobia sofrida na instituição. Além disso, 98% das famílias que compõem a amostra não acreditam que o ambiente educacional brasileiro seja seguro para crianças e adolescentes trans.
No mundo acadêmico, a situação não é muito diferente. Um mapeamento feito pela Coletiva Intertransvestigênere Xica Manicongo, de estudantes da Universidade de São Paulo (USP), mostrou que 52% dos 88 estudantes que se identificaram como transexuais, travestis, transvestigêneres e não-binários foram vítimas de ações transfóbicas na instituição.
Entre os problemas enfrentados estão a falta de preparo de professores, profissionais de segurança e terceirizados, o que acaba gerando situações de constrangimentos, além do desrespeito ao nome social dentro da instituição.
Imagine só: como você se sentiria se fosse alvo de piadas, frases ofensivas, “brincadeiras” e ameaças todos os dias na escola ou faculdade? Como você se sentiria vendo seu nome sendo desrespeitoso todo santo dia? Como se sentiria se sua simples ida ao banheiro que você se identifica fosse motivo de chacota? Sem falar das agressões físicas.
Diante de tanto violência e negação de direitos, não há saúde mental que aguente. O impacto é tão profundo, é tanta dor e traumas, que muitas pessoas trans abandonam a escola/faculdade.
Só para você ter uma ideia, de acordo com pesquisa realizada pela Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil, 82% das pessoas trans abandonam o Ensino Médio entre os 14 e os 18 anos.
Vale lembrar que, em 2016, a então presidenta Dilma Rousseff sancionou o decreto de número 8.727, garantindo o direito ao nome social. Já em 2018, uma portaria do MEC autorizou o uso do nome social de travestis e transexuais nos registros escolares da educação básica. A possibilidade foi garantida aos estudantes com mais de 18 anos. Já os menores de idade ficam condicionados à autorização de seus representantes legais.
Essas políticas públicas são extremamente importantes, mas é necessário criar mecanismos para fiscalizar e tirá-las do papel. Também é importante criar mais ações para ampliar o acesso e permanência da comunidade trans nas escolas e faculdades. Isso também envolve iniciativas da sociedade civil e instituições de ensino.
Direito à educação é para todas, todes e todos!