Ser alvo de “piadas”, “brincadeiras”, frases pejorativas e ofensivas, além de agressões físicas e outras tantas formas de expulsão social. Infelizmente essas são algumas das situações que atravessam a vida de pessoas trans todos os dias no Brasil. Só para você ter uma ideia, quase a totalidade da população trans (94,8%), afirma ter sofrido algum tipo de violência motivada por discriminação devido à sua identidade de gênero, segundo o estudo Assassinato de Travestis e Transexuais Brasileiras, realizado pela Antra, em 2020.
Encarar essas situações todos os dias é muito desgastante, machuca e cria um sentimento de não pertencimento e leva nossa saúde mental à exaustão! Tanto que estudos sobre saúde de pessoas transgêneros, da revista The Lancet, revelaram, em 2018, que aproximadamente 60% da população transgênero sofre de depressão.
E tudo isso tem um impacto nos índices de suicidio dentro da comunidade trans e travesti, já que o autoextermínio é um comportamento multifatorial, ou seja, não é um fenômeno apenas individual ou psíquico. As diferentes formas de exclusão social também podem ser um gatilho. Segundo a Antra em 2020, foram catalogados 23 casos de suicídio, sendo sete (30%) casos de homens trans/transmaculinos e 16 (70%) travestis/mulheres trans.
Já a pesquisa realizada em 2015 pelo Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT e pelo Departamento de Antropologia e Arqueologia da UFMG ouviu 28 homens trans e constatou que 24 deles, o equivalente a 85,7%, já cogitaram ou tentaram o suicídio.
Além disso, um estudo do National Center for Transgender Equality revela que 40% das pessoas trans tentaram autoextermínio. Já a pesquisa da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, aponta para o fato de essa comunidade pensar em suicídio 14 vezes mais em comparação à população geral.
Já falei isso em outros artigos, mas é sempre importante reforçar: sua falta de empatia, suas “brincaderinhas”, apelidos transfóbicos e o seu desdém nunca são atitudes inocentes! Essas ações impactam diretamente a saúde mental da comunidade trans e travesti.
Tenho a sensação que o tempo todo precisamos provar o nosso valor, precisamos provar que existimos, que merecemos respeito, que merecemos viver.
Para muitas pessoas, nós, comunidade trans e travesti, sequer podemos sonhar em constituir família ou ter um trabalho digno. É como se nossas vidas fossem uma porteira aberta, em que a violência psicológica e física são rotineiras e naturais. Como se nossas vidas fossem uma grande chacota.
E, para piorar, infelizmente algumas pessoas que são LGB cis (lesbicas, gays e bisexuais cisgênero), também acabam reproduzindo falas e atitudes transfóbicas. Por várias vezes senti isso na pele. Sei que não posso e não vou generalizar, mas às vezes nem mesmo dentro da comunidade LGBTQIA a população trans tem paz. E essa falta de acolhimento só prejudica ainda mais nossa saúde mental.
Eu não o conhecia pessoalmente e nem cheguei a trocar ideia com o Paulo Vaz nas redes sociais, mas acompanhava o trabalho incrível que ele desenvolveu! A vida do Paulo, do Demétrio Campos e de outras tantas pessoas trans e travestis que se foram são perdas imensuráveis! Essas pessoas têm história, nome, sobrenome, família, amigos, tinham sonhos, desejos e planos. Nossas vidas não são números frios, nossas vidas não são entretenimento, não somos seres exóticos. Somos seres humanos, e é muito cansativo e doloroso ter que diariamente “lembrar” a sociedade disso.
Ontem foi o Dia Internacional da Visibilidade trans, e diante de tudo que apresentei aqui fica nítido que precisamos avançar muito ainda. Desejo que a família e amigas/amiges/amigos de Paulo Vaz sejam confortados e que ele descanse em paz.