Por várias vezes nesta coluna, já compartilhei vivências, relatos e dados que mostram como é comum o sentimento de não pertencimento entre pessoas que fazem parte de grupos minorizados. Isso também influencia na forma como nós ocupamos a cidade.
E não é por acaso. Por exemplo, eu como homem negro retido e trans já senti na pele violências fisicas e psicológicas em ambientes públicos, sobretudo por meio do peso do “olhar zoológico”. Aquele olhar fixo e invasivo, que tenta reduzir a humanidade de pessoas que fazem parte de grupos minorizados. E esse “olhar zoológico” sempre manda alguns recados: “Um corpo negro aqui? Ele não deveria estar aqui”; “esse corpo trans não deveria andar livremente assim, não deveria ocupar esse espaço, não deveria nem existir”.
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Além disso, como é o deslocamento de pessoas que fazem parte de grupos minoritários pela cidade? Posso te garantir que é marcado por retirada de direitos, por exclusão e por diferentes assédios. Por exemplo: quantas mulheres já foram assediadas ou presenciaram assédio sexual dentro do transporte publico em BH? Só para você ter uma ideia, segundo pesquisa realizada pelos institutos Patrícia Galvão e Locomotiva em 2019, 97% das mulheres no Brasil já sofreram algum tipo de assédio no transporte público.
Quantas vezes pessoas que moram em periferias enfrentaram dezenas de dificuldades para acessar serviços, trabalho e lazer nos centros das cidades? Quantas vezes deixei de ir em eventos culturais porque sabia que não teria transporte público para voltar depois das 22h para o meu bairro?
O direito à cidade é para quem?
Faço parte do Movimento Nossa BH e, na penúltima segunda-feira (3), participei da abertura do Curso Mobiliza de Políticas Públicas 2023, promovido pelo movimento. Nesse dia, foi possível escutar muitos relatos que demonstram como, infelizmente, a cidade é pensada sem levar em conta a existência de pessoas que fazem parte de grupos minorizados e periféricos. O curso se dedica à discussão acerca da constituição dos direitos sociais, bem como suas violações, a partir das lutas dos movimentos sociais populares que se organizam na cidade.
Quem contundiu a abertura do curso foi a Áurea Carolina, ativista com trajetória nas lutas de mulheres, negritude, juventudes, povos e comunidades tradicionais e populações periféricas. Foi vereadora de Belo Horizonte e deputada federal por Minas Gerais. Em uma de suas falas, Áurea falou sobre a relação entre territórios e afetos, territórios e o sentimento de pertencimento e acolhimento. Algo que me fez pensar muito.
Ter acesso à cidade e conseguir circular livremente, sem medo, sem o peso do “olhar zoológico”, e com infraestrutura para todas as pessoas é um direito!
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Segundo a cartinha “Cidade Em Movimento”, do Movimento Nossa BH: “Direito à cidade é um conceito que diz respeito à forma como as pessoas usam o espaço urbano. Segundo esse conceito, todos os habitantes de uma mesma cidade têm o direito de usufruir dos seus espaços e serviços. E mais: eles também têm o direito de participar da construção desses espaços e serviços. Infelizmente, o que acontece na prática é muito diferente. Existem várias barreiras que impedem as pessoas de acessar os espaços e serviços de uma cidade.
Quem mora longe, por exemplo, tem mais dificuldade de ir até o centro, onde é possível resolver diversas demandas cotidianas. Mas também temos outros tipos de barreiras, como o racismo… O acesso à cidade é ainda mais difícil para as pessoas negras. A escravização deixou vários estigmas, levando a população negra à pobreza e a sofrer preconceitos e violências, inclusive de agentes públicos. Por causa desse histórico, a construção das nossas cidades foi desigual e criou territórios separados – e muito diferentes – para ricos e pobres, brancos e negros.”
Quem mora longe, por exemplo, tem mais dificuldade de ir até o centro, onde é possível resolver diversas demandas cotidianas. Mas também temos outros tipos de barreiras, como o racismo… O acesso à cidade é ainda mais difícil para as pessoas negras. A escravização deixou vários estigmas, levando a população negra à pobreza e a sofrer preconceitos e violências, inclusive de agentes públicos. Por causa desse histórico, a construção das nossas cidades foi desigual e criou territórios separados – e muito diferentes – para ricos e pobres, brancos e negros.”
Os territórios também precisam ser pensados pela ótica da diversidade e inclusão.