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Estado de Minas DIREITO

O 'não lugar' de grupos minoritários

O direito à cidade é negado de diferentes formas a esses grupos; e não é por acaso


14/04/2023 09:00 - atualizado 14/04/2023 11:09

Vista da Praça Sete durante o dia. Há circulação de carros e pessoas.
Praça Sete, em BH (foto: PBH/Reprodução)

Por várias vezes nesta coluna, já compartilhei vivências, relatos e dados que mostram como é comum o sentimento de não pertencimento entre pessoas que fazem parte de grupos minorizados. Isso também influencia na forma como nós ocupamos a cidade.

E não é por acaso. Por exemplo, eu como homem negro retido e trans já senti na pele violências fisicas e psicológicas em ambientes públicos, sobretudo por meio do peso do “olhar zoológico”. Aquele olhar fixo e invasivo, que tenta reduzir a humanidade de pessoas que fazem parte de grupos minorizados. E esse “olhar zoológico” sempre manda alguns recados: “Um corpo negro aqui? Ele não deveria estar aqui”; “esse corpo trans não deveria andar livremente assim, não deveria ocupar esse espaço, não deveria nem existir”. 

Quer mais exemplos? Quantas vezes mulheres são assediadas em ambientes públicos? Diante dessa cultura machista, quais territórios essa mulher acessa com segurança? Quantas mulheres, com medo, evitam esperar o ônibus em determinados lugares porque a iluminação dos postes próximos ao ponto de ônibus foi danificada e ninguém toma a providência de resolver o problema? 
 
Quantas pessoas com deficiência deixam de ir a determinados lugares e eventos na cidade porque não existe acessibilidade? 

Além disso, como é o deslocamento de pessoas que fazem parte de grupos minoritários pela cidade? Posso te garantir que é marcado por retirada de direitos, por exclusão e por diferentes assédios. Por exemplo: quantas mulheres já foram assediadas ou presenciaram assédio sexual dentro do transporte publico em BH? Só para você ter uma ideia, segundo pesquisa realizada pelos institutos Patrícia Galvão e Locomotiva em 2019, 97% das mulheres no Brasil já sofreram algum tipo de assédio no transporte público.

Quantas vezes pessoas que moram em periferias enfrentaram dezenas de dificuldades para acessar serviços, trabalho e lazer nos centros das cidades? Quantas vezes deixei de ir em eventos culturais porque sabia que não teria transporte público para voltar depois das 22h para o meu bairro? 

O direito à cidade é para quem? 

Faço parte do Movimento Nossa BH e, na penúltima segunda-feira (3), participei da abertura do Curso Mobiliza de Políticas Públicas 2023, promovido pelo movimento. Nesse dia, foi possível escutar muitos relatos que demonstram como, infelizmente, a cidade é pensada sem levar em conta a existência de pessoas que fazem parte de grupos minorizados e periféricos. O curso se dedica à discussão acerca da constituição dos direitos sociais, bem como suas violações, a partir das lutas dos movimentos sociais populares que se organizam na cidade. 

Quem contundiu a abertura do curso foi a Áurea Carolina, ativista com trajetória nas lutas de mulheres, negritude, juventudes, povos e comunidades tradicionais e populações periféricas. Foi vereadora de Belo Horizonte e deputada federal por Minas Gerais. Em uma de suas falas, Áurea falou sobre a relação entre territórios e afetos, territórios e o sentimento de pertencimento e acolhimento. Algo que me fez pensar muito. 

Ter acesso à cidade e conseguir circular livremente, sem medo, sem o peso do “olhar zoológico”, e com infraestrutura para todas as pessoas é um direito! 

Leia também: 'Não sou racista, até tenho amigos negros': você já ouviu essa frase?

Segundo a cartinha “Cidade Em Movimento”, do Movimento Nossa BH: “Direito à cidade é um conceito que diz respeito à forma como as pessoas usam o espaço urbano. Segundo esse conceito, todos os habitantes de uma mesma cidade têm o direito de usufruir dos seus espaços e serviços. E mais: eles também têm o direito de participar da construção desses espaços e serviços. Infelizmente, o que acontece na prática é muito diferente. Existem várias barreiras que impedem as pessoas de acessar os espaços e serviços de uma cidade.

Quem mora longe, por exemplo, tem mais dificuldade de ir até o centro, onde é possível resolver diversas demandas cotidianas. Mas também temos outros tipos de barreiras, como o racismo… O acesso à cidade é ainda mais difícil para as pessoas negras. A escravização deixou vários estigmas, levando a população negra à pobreza e a sofrer preconceitos e violências, inclusive de agentes públicos. Por causa desse histórico, a construção das nossas cidades foi desigual e criou territórios separados – e muito diferentes – para ricos e pobres, brancos e negros.”

Os territórios também precisam ser pensados pela ótica da diversidade e inclusão. 

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