“Eu tô só vendo, sabendo
Sentindo, escutando e não posso falar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar”
(Chico Buarque)
Hoje, quem canta é só a chuva. Lágrimas caindo do céu. É fevereiro e não tem carnaval.
Não tem bloquinho, não tem charanga. É só silêncio. Silêncio e pandemia. Ansiedade de quem espera tudo isso passar. Tudo tão quieto. Tão vazio.
Larissa chorou porque não colocou a fantasia que combina com a do filho Davi.
Flávia chorou porque não foi para a Savassi, não abraçou as amigas.
A saudade do carnaval apertou o coração da Renata.
O surdo da Débora emudeceu. Parece que o tempo parou.
A Ana não passou semanas preocupada com a previsão do tempo.
A Rachel seguiu no bloco. O bloco dos pacientes com COVID-19. Vacinada, se vestiu de jacaré.
A harmonia não ensaiou o repertório. Ninguém se emocionou ouvindo Eva.
Silêncio do agogô. Silêncio do pandeiro. O repique espera o dia de voltar para a avenida.
Hoje não tem carnaval. Tem coração partido de quem está vivendo uma longa espera. As ruas vazias: respeito pela vida. Máscara no rosto de quem se cuida e sabe cuidar. Coletividade agora é manter distância.
Já tem marchinha pedindo vacina? Tem sim, a do Chico César. Boa para cantar em casa.
Se a rua está vazia, podemos encher nossos corações de esperança. Já tem vacina, ela só precisa chegar mais depressa. Acelera tempo! A gente quer que isso passe logo. Manda a tristeza embora.
“Levanta, sacode a poeira
Dá a volta por cima”
Faz confete com papel picado. Liga o som e dança! Este ano não tem carnaval, só tem a quarta-feira de cinzas. A gente sobrevive.
A gente sobrevive ao isolamento. Sofre com a abstinência. Melhor que sofrer vendo uma pessoa querida sendo levada por essa doença.
Um dia a máscara vai voltar a ser só a da fantasia. Festejando a vida! Comemorando que tudo passou.
É só a pausa de uma vírgula para não ter que ser ponto final.
Fica em casa e se cuida. Batuca na janela. Canta um samba. Desafina. Bate panela. Veste aquela fantasia e se apresenta para o espelho. Não tem carnaval na rua, mas tem carnaval na alma brasileira.
Não deixe samba morrer que o sol há de brilhar mais uma vez.
“A luz há de chegar aos corações
Do mal será queimada a semente
O amor será eterno novamente
É o juízo final
A história do bem e do mal
Quero ter olhos pra ver
A maldade desaparecer”
(Nelson Cavaquinho)
Quando tudo isso passar, a gente comemora dobrado. Amanhã vai ser outro dia!