Seu pai era um homem forte, bravo. Nunca conversava. Quando abria a boca era para xingar ou ameaçar. Nunca ensinava com palavras ou gestos, achava que menino aprendia apanhando quando fizesse coisa errada. Aprendeu a ser daquele jeito com o pai dele, que aprendeu com o avô, que aprendeu com o bisavô...
Aprendeu com o pai a ser um homem agressivo. Fazia questão de mostrar sua virilidade. Função de mulher era servir. Homem não cuida, homem manda. Homem sustenta família, mas família precisa cumprir seu papel, senão ele some no mundo.
Não aceitava não como resposta. Dividia as mulheres em três categorias: as que ele queria e pegava à força; as que não mereciam ser estupradas; e as moças para casar. Casou-se com uma dessas, e seguiu pegando outras, porque precisava provar para si mesmo que era imbroxável.
Cobrava da mulher que ela cumprisse seu papel de esposa, na sala, na cozinha, na cama. Queria muitos filhos, de preferência homens para mostrar que não fraquejava.
Ela estava exausta, mas sempre soube que casamento era assim mesmo, pois foi assim que a mãe dela viveu. Sendo agredida pelo seu pai enquanto ele viveu. Tremia quando ele chegava em casa, torcia para estar bêbado demais e dormisse. Se não fosse assim, ela teria que suportar mais um estupro.
Nem sabia que sexo não consentido era estupro, mesmo dentro do casamento. Aprendeu que era obrigação. No culto, o pastor reforçava a crença: mulher deve servir ao marido. Afinal, para que um homem se casa, senão para garantir o sexo, sem precisar procurar mulher?
Nem sabia que sexo não consentido era estupro, mesmo dentro do casamento. Aprendeu que era obrigação. No culto, o pastor reforçava a crença: mulher deve servir ao marido. Afinal, para que um homem se casa, senão para garantir o sexo, sem precisar procurar mulher?
Ela foi adoecendo, e à medida que ela ficava mais fraca, ele a violentava mais, com palavras, com gestos. Dizia que ela não servia para nada. Que ela era inútil. Tiveram muitos filhos, mas quando ela perdeu aquele bebê, teve que sentir sua dor em silêncio. A culpa era dela, nem para isso servia mais.
Seguiu suportando tudo, até que viu um de seus filhos apanhar do pai. Toda a fúria de um homem frustrado, que não aprendera a lidar com as próprias emoções, descontada numa criança indefesa. Teve medo, mas era mãe, foi defender o filho. Usou o próprio corpo como escudo para a criança. Apanhou tanto que desmaiou. O menino correu e pediu ajuda, os vizinhos chamaram a polícia.
Foi preso, se sentiu humilhado, acreditava que era direito dele. Direito de marido, direito de homem imbroxável. Queria voltar para casa, mas ela tinha uma medida protetiva, a tal Lei Maria da Penha. Procurou outras mulheres, mas não conseguia. Depois daquele dia, ficou com disfunção erétil. Culpou a esposa, que agora era ex.
Naquele dia, ele a seguiu depois do trabalho e, quando ninguém estava olhando, usou a arma que sempre gostou de exibir.