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Gaiola de ouro

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Passarinha era livre. Voava em busca de comida todos os dias. Comia o que encontrava. Voava sozinha, ou em bando. Via o mundo do alto. Certo dia achou uma vasilha cheia de alpiste e foi lá comer. Alguém apareceu, ela se assustou o voou para longe. Acabou voltando, não podia desperdiçar todo aquele alimento.





Todos os dias ia até lá, e sempre encontrava o alpiste. Depois passou a encontrar frutas. Foi se acostumando com o alguém que aparecia. Não fugia mais quando ele se aproximava. Ele foi ganhando sua confiança. Oferecendo alimentos diferentes. Sempre a agradando com flores e presentes.
 
Um dia, numa de suas visitas, Passarinha foi capturada, mediram tamanho de suas asas, o tamanho do seu bico, seu peso. E ela ganhou uma anilha de ouro. Ficou confusa. Não havia consentido. Ninguém lhe pediu permissão. Mas estava lá, com aquele anel preso à sua perna. Marcada.

Ele disse a ela que tudo aquilo era porque ele a amava e não queria perdê-la. Ela partiu. Não voltou lá por alguns dias, mas sentiu fome. Sabia que lá teria tudo que gostava. Voltou.

Ele a esperava, com comida, flores e presentes. Disse que sentira muito sua falta e havia comprado para ela um lugar onde ela poderia morar e ficar em segurança. Uma gaiola de ouro. Se ela ficasse ali, não correria perigos, ela a protegeria, a alimentaria, cuidaria dela para sempre.





Passarinha ficou feliz com a ideia. A gaiola era linda, espaçosa. Tinha três poleiros e um ninho. Não daria para voar, mas tinha todo o resto. Achou que poderia sair, voar um pouco e voltar. Mas desde que entrou lá, nunca mais pode sair.

Cantava para alegrá-lo. Esperando ganhar um presente. Ele não se importava. Seu canto foi ficando triste, e ele reclamava que ela não cantava mais como antes. Seu ninho estava sempre vazio.

Observou que suas penas estavam perdendo o colorido, deu um jeito de trocar a plumagem, ganhar novamente as cores que tinha. Quando ele viu a mudança brigou, jogou a gaiola no chão. Não queria que ela chamasse a atenção de ninguém. “Onde já se viu uma passarinha que se dá ao respeito usando cores tão espalhafatosas?”

Arrancou suas penas. A colocou em uma gaiola menor. Também de ouro, mas com um único poleiro onde ela deveria se equilibrar dia e noite. Sem espaço para dar nenhum pulinho.

Depois ele pediu desculpas pelas penas que havia arrancado. Prometeu que nunca mais a deixaria daquele jeito. Mas deixou claro que a culpa era dela, que ela o deixara nervoso. Ela disse que estava trinte, que queria voltar a voar, queria poder conhecer outros lugares. Ele a levou para viajar. Conhecer outros países, mas a gaiola foi junto. Passarinha dentro. Se equilibrando naquele pequeno poleiro.

Sem cores, com seu canto triste, ela já não conseguia dormir. Mais uma noite insone. A tristeza e a ansiedade e consumiam. Sozinha naquele poleiro, Passarinha sentia seu corpo frio. Seu coração batendo devagar. Uma dor a cada vez que seus pulmões se enchiam de ar. Se lembrou de todas as vezes que acreditou que seria feliz. Aproveitou um descuido e fugiu. Voou ziguezagueando, sem muita força nas asas, mas conseguiu. Encontrou outras passarinhas que a ajudaram na fuga. Nunca mais viu aquela gaiola. Recuperou suas cores e seu canto e voou para muito longe.

Depositphotos




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