Jornal Estado de Minas

PADECENDO

Desaprendendo

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Descobri que muito do que aprendi precisava ser desaprendido, para que eu pudesse reaprender. Informações são passadas de uma geração para outra, a gente absorve aquilo e repassa. Mas tem coisa que precisa mudar, precisa ser passada de forma diferente.





Nascemos em uma sociedade que discrimina pessoas, que é cheia de conceitos errados. Crescemos acreditando que esse é o correto, pois são comportamentos que vemos à nossa volta. Que estão na TV, nos livros, nos filmes, nas novelas, na publicidade, nas falas e nas ações das pessoas com quem convivemos.

Seguimos reproduzindo o que aprendemos, sem refletir. Às vezes, precisamos que alguém nos aponte o que está errado para que consigamos enxergar os erros. Às vezes, nem assim conseguimos vê-los, porque não que- remos ver. É difícil aceitar que pessoas que amamos nos ensinaram coisas tão erradas. Mas podemos aprender e entender que elas apenas reproduziram o que aprenderam, como nós também fizemos por muito tempo.
 
Nos falta ver o mundo com mente de principiante. Com a percepção atenta do momento presente, sem julgamento, com curiosidade e aceitação. Mente de principiante é olhar as coisas como se fosse a primeira vez. Quando a gente olha a vida com mente de principiante, conseguimos ser mais leves. Deixamos os preconceitos de lado e abrimo-nos para o mundo.





É com mente de principiante que tento apresentar o mundo ao meu filho. Como mãe, me vejo na obrigação de ver o mundo com os olhos de quem ainda tem muito a aprender.

É preciso viver desaprendendo.

Desaprendi com a maternidade que filho não vem do jeito que planejamos. Filho é uma caixinha de surpresas, que o filho que a gente idealizou não existe, e a gente ama o que vem, do jeito que vier. E que quando temos filhos a gente aceita o pacote completo.

Desaprendi com o câncer que não tenho controle de nada. E que a vida segue, mesmo com desafios inesperados. Que antes de tirar o tumor eu me sentia saudável, e que o tratamento faz com que eu me sinta doente.

Desaprendi com amigas que casamento pode ser uma prisão sem muros e que existem formas de violência contra a mulher que são muito sutis, difíceis de identificar. Que a mu- lher separada é muito corajosa, porque não é fácil lidar com uma so- ciedade que discrimina mulheres por suas escolhas.





Desaprendi com amigos que sexualidade a gente não escolhe, e que tentar se enquadrar no padrão heterossexual quando você não sente desejo pelo sexo oposto não é justo. Não é porque eu sou heterossexual que todas as pessoas têm que ser também.

Desaprendi com pessoas transexuais que tem gente que não se identifica com seu próprio corpo, como se tivesse nascido no corpo errado. E que se sentir dentro do corpo errado já é duro o bastante para ainda ter que ser tratado como aberração pela sociedade, como se tivesse sido uma escolha passar por um caminho tão difícil.

O ser humano é muito diverso, mas ainda insistem em querer colocar todo mundo dentro de uma cai- xinha chamada Normal. De perto, ninguém é normal. E a beleza está em todas essas diferenças.

“Narciso acha feio o que não é espelho.”

Foi desaprendendo um monte de coisas que eu aprendi que entendi: tudo fica melhor quando a gente julga menos e ama mais.

audima