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PADECENDO

Transição: o processo é longo e sofrido

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Era uma criança de 6 anos. Apaixonante, cheia de personalidade.  Uma menina de 6 anos, muito viva, falante, inteligente que tinha muitos amigos e adorava jogar futebol. Variava o corte de cabelo e gostava de usar meias com pares trocados.




 
Adolescência chegando, tantas descobertas, o processo de autoconhecimento, as mudanças no corpo. Foi nessa época que ela entendeu que não se identificava como menina. No meio da pandemia, cumprindo isolamento social à risca, assistindo às aulas on-line e interagindo com os amigos só pelas redes sociais.

E, por um bate-papo virtual, foi assim que contou para os amigos mais próximos sobre sua identidade e seu novo nome. Os amigos passaram a usar o pronome masculino sem questionar.
 
Demorou para conseguir contar para os pais. Quando conseguiu, chorou aliviado e foi acolhido. Nesse momento, eles sentiram o amor enorme por aquela pessoinha que estava se descobrindo. Ao mesmo tempo, veio o medo. Eles já sabiam muito bem como é a vida de uma pessoa transexual no Brasil.





A cada dois dias, em média, uma pessoa trans é assassinada no Brasil. Isso leva a expectativa de vida dessa comunidade para apenas 35 anos. A expectativa de vida da população cisgênero é de 75 anos. Todos os dias, a população trans é agredida e invisibilizada, expulsa dos espaços sociais.

Nenhum pai, nenhuma mãe quer que seus filhos passem por isso. Muitas crianças e jovens são violentados por não se enquadrarem em um padrão de comportamento visto como “normal”. Muitas vezes, a violência começa em casa por falta de conhecimento.
 
“A expressão gênero social possui respaldo científico. Surgiu através de estudos antropológicos que provaram que seres humanos, ao longo do tempo, atribuem papéis sociais distintos a homens e mulheres. Assim, a categoria homem e mulher, diferentemente do sexo biológico (macho e fêmea), é uma construção social, que muda com o passar do tempo e está ligada ao contexto cultural em que os indivíduos estão inseridos.




 
A questão de gênero gerou pesquisas sobre a condição de pessoas que possuem uma identidade de gênero que não coincide com a sua biologia, ou seja, pessoas que mesmo tendo uma anatomia que lhe vincula a um sexo biológico (macho ou fêmea) se identificam, desde a sua primeira infância, com os papéis sociais atribuídos ao sexo oposto – os transexuais.” – Larissa Figueiredo Gomes psicóloga

Filhos são caixinhas de surpresas. A gente os ama como eles são. É numa situação como essa que a gente entende o que é aceitar o pacote completo, e se dá a oportunidade de conhecer aquela pessoa que está se conhecendo também.
 
Aquela garotinha não existe mais. Escolheu outro nome. A gente chama por outro pronome. Continua sendo uma pessoa apaixonante. Ontem, eu o encontrei na rua, meu filho o abraçou como sempre fez. Ele me chamou de tia como de costume. Não sou tia de sangue, mas sou tia de coração.

Dei-lhe um abraço. Estava com saudades. Senti o amor transbordar. E a minha vontade de mudar o mundo cresceu. Desejei poder protegê-lo do mundo, das pessoas. O mundo precisa acolhê-lo como seus pais fizeram.
 
O processo é longo. Você, seus pais, seus amigos, todos vamos aprender muito nesse seu percurso.  Eu o vejo como você se vê. Eu o vejo como eu sempre vi, não importa o nome, não importa o pronome. Importa o amor que sentimos por você.