Jornal Estado de Minas

PADECENDO

Perdendo o juízo ao se deixar fotografar sem maquiagem?

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Que mulher, em seu juízo perfeito, marcaria um ensaio fotográfico e apareceria lá para ser fotografada com a cara lavada, sem um pingo de maquiagem, com o cabelo amarrado num rabo malfeito, deixando à mostra seu rosto, suas manchas, seus lábios secos, a sobrancelha por fazer?

Foi assim que eu apareci no estúdio em julho de 2021. Eu não queria fotos produzidas. Queria uma recordação com a minha cara, aquela que eu vejo no espelho todos os dias quando acordo. A cara de quem estava com 46 anos e já tinha muita história pra contar.




 
O sol e o vento batendo no rosto nos passeios de bicicleta da infância. A brisa salgada do mar embaraçando o cabelo. A pequena cicatriz no nariz.
 
O bullying por causa dos óculos e do aparelho na adolescência. A história de cada vez que furei as orelhas.
 
Os sorrisos, as lágrimas. Os beijos. Os olhares. As noites em claro nas baladas.

A depressão, o câncer, a menopausa, as marcas provocadas pelo líquen escleroso e atrófico.

As noites em claro amamentando, medindo a temperatura de filho com febre, ou tentando controlar a ansiedade.




 
Alguns tratamentos estéticos também, preenchimento das olheiras e das maçãs, sem excessos.

O cabelo que está ficando branco, mas já foi pretinho, vermelho, azul, rosa, laranja...

O cabelo, que ficou bem comprido, foi doado e agora está curtinho. Aquele curtinho que diz: sou livre para ser como eu quiser.
 
Uma vida inteira em uma foto.

Gosto de me ver arrumada, aquele supermaquiagem, com cílios postiços e os olhos bem carregados na sombra e no delineador. Mas também gosto assim, da cara lavada. Gosto mesmo é de poder escolher como vou me apresentar de acordo com o humor do dia. Com uma maquiagem leve, ou pesada, ou sem maquiagem nenhuma. Cinderela ou gata borralheira? As duas existem e são uma só. Ambas estão em paz com o espelho.
 
O caminho do envelhecimento tem que vir com uma carga de aceitação. Há muito, deixei de perseguir um padrão impossível. Não dá para querer passar a vida em busca da juventude perdida. Aliás, a minha não foi perdida, foi bem vivida, e continua sendo.
 
Por dentro eu sigo muito jovem, muito aberta para as mudanças do mundo! Estou deixando de lado o juízo de valor, aquele julgamento baseado nas minhas percepções individuais. Não quero conservar nada! Sigo querendo quebrar todos os padrões. Me libertar de todos os preconceitos, ficar bem velhinha, no meu juízo perfeito e sem juízo nenhum.