A mensagem foi para as elites empresariais, elites financeiras, órgãos de controle e a cúpula do funcionalismo público, representada na magistratura. Se eleito, não fará um governo olhando pelo retrovisor. Procurou demonstrar não ter mágoas, de um tempo em que lembrou ter sido alvo de lawfare. Prometeu um governo estável, previsível e com credibilidade. A política da pacificação foi enfatizada nas temáticas abordadas na entrevista ao Jornal Nacional. Quando fez críticas, isolou os adversários: defendeu o meio ambiente e a preservação das florestas e acusou os “maus empresários” do agronegócio de promoverem o desmatamento; ao mesmo tempo, poupou o agronegócio exportador, que considerou “sério” . Defendeu a divergência na política considerando-a saudável, mas atacou a extrema direita, o fascismo, que estimula o discurso de ódio.
Lula rebateu quando questionado se, no passado, teria estimulado a divisão do país do “nós” contra “eles”: considerou a polarização em política “saudável” e disse que ela não significa estímulo ao ódio. Salientando a diferença entre adversário político e inimigo, disse ter saudades dos tempos de polarização política entre PT e PSDB, quando as ideias brigavam, as pessoas não. Ex-adversário político, Geraldo Alckmin, egresso do PSDB, agora no PSB, foi também figura de imagem para a estratégia discursiva da conciliação: valorizou o seu vice, sinalizou que ele terá um papel importante em um eventual futuro governo e avisou que, se ganhar a eleição, os dois irão governar juntos, unindo experiências. Lula se respaldou em Alckmin para salientar ao setor produtivo, que, assim como em seu primeiro mandato presidencial, será bem-sucedido na condução da economia.
Lula driblou as perguntas sobre corrupção, cobradas pelo espectro do eleitorado para o qual escolheu se dirigir na entrevista. Defendeu a atuação do Ministério Público e da Polícia Federal dentro do regramento do estado de direito e tratou de assinalar a temática reversa: a corrupção só aparece quando há órgãos que a investigam, disse ele. "Eu poderia ter escolhido um Procurador engavetador. Sabe aquele amigo que você escolhe e que nenhum processo vai para frente? Eu poderia ter feito isso e não fiz. Escolhi da lista tríplice. Eu poderia ter impedido que a Polícia Federal tivesse um delegado que eu pudesse controlá-lo. Não fiz. E permiti que as coisas efetivamente acontecessem do jeito que precisava acontecer”, disse ele, em crítica implícita ao seu principal adversário na corrida presidencial.
Lula marcou forte contraponto a Jair Bolsonaro ao longo de toda a entrevista. Defendeu as instituições democráticas, mas, sinalizou que não pactuará com abusos: chamou de “escárnio” o denominado orçamento secreto em benefício de parlamentares inaugurado no governo Bolsonaro, que avisou, vai se encerrar em seu governo. Para isso, prometeu mágica: vai terminar com a farra das emendas secretas de centenas de milhões dialogando com deputados. E avisou que não entregará ao presidente da Câmara dos Deputados a tarefa presidencial de governar, portanto não aceitará o que chamou de “semipresidencialismo”.
O público com o qual Lula conversou ao longo da entrevista já tem candidato. Os recados ao setor produtivo e aos órgãos de controle prestaram-se mais àquilo que pode ser entendido como a construção de pontes para a governabilidade de um eventual futuro governo do que propriamente para conquistar votos. Mas, pela serenidade e segurança com que dialogou, tampouco os perdeu.