Na última sexta-feira fomos à Casa Cor, que esse ano aconteceu no suntuoso Palácio das Mangabeiras, ex-residência oficial do governador de Minas Gerais.
Casa Cor, linda como sempre! Propostas arquitetônicas e decorativas fantásticas. Tudo impecável. Cantinhos e aconchego para sonhar com a vida próxima do paraíso.
Ali foram tomadas decisões que impactaram a vida de milhares de pessoas.
Estética e poder, união e cenário perfeito para que nossas vidas fossem cada vez mais alegres e perfeitas. Apesar da elegância das propostas estéticas, algo nos incomodou profundamente. Não me refiro à distância do paraíso estético da realidade econômica de 90% da população brasileira. Adoraria ver toda criatividade voltada para quem instalou a privada marrom e as pias de aço escovado dourado.
Universos distantes e desconexos.
O meu desconforto foi na realidade com o comportamento das pessoas. Em ambientes fechados, muitos sem máscaras.
Tiravam foto, comentava em voz alta com prepotência de artistas em transe. Sem máscaras!
Todo colorido se transforma em cinza monótono. Dança macabra e desrespeitosa, principalmente pela complacência dos monitores presentes em cada estande. Certamente não foram alertados para os princípios que regem o momento que o mundo vive. Obras de arte desconectadas do presente epidêmico.
Estética antiética dentro do templo histórico do poder não nos projeta um futuro promissor.
Fomos embora, mais impactados pelo desprezo às regras sanitárias do que pela beleza do ambiente.
Voltamos para casa e degustamos salada com o frango do almoço.
O mais saboroso, o sorriso de nossas filhas.
Crianças que ficaram em casa guardadas e restringidas de suas atividades para proteger adultos que, agora vacinados, esquecem da vulnerabilidade de seus próprios filhos e netos.
Apesar das crianças desenvolverem quadros mais brandos, não estão isentas de complicações graves quando infectadas. Já perdemos nessa epidemia mais de 2,5 mil crianças no Brasil. Filhos de quem, netos de quem? Só quem já comprou um caixão branco sabe o tamanho da dor.
Não há estética nessa dimensão de sofrimento.
A COVID-19 nos leva a refletir sobre princípios éticos de convivência em sociedade.
Máscaras no atual momento são símbolo de respeito mútuo. Eu te respeito e te protejo. Exijo reciprocidade. Máscara não é cueca. Cueca usa quem quer, máscara é obrigatório para que continuemos a usar, ou não, cuecas ou calcinhas.
Mas o Rio liberou, argumentam alguns. Mas, você está em Minas, Belo Horizonte. Minas Gerais, Brasil. A realidade epidemiológica e os princípios são distintos.
Vivemos em nossas montanhas. Adoramos o mar, mas não ficamos de costas para a realidade, principalmente a epidemiológica do momento atual.
O descompasso das medidas de controle da epidemia é fruto dos interesses políticos distintos que permeiam as condutas teoricamente técnicas adotadas.
Mas, e o futebol?! Desrespeitoso também! Êxtase e inconsciência. Prazer que coloca a comunidade em risco, assim como o boteco sem regra, o casamento sem regra, ou qualquer aglomeração sem respeitar os princípios sanitários estabelecidos.
Todos pagam um alto preço. Mais de 610 mil pessoas, apenas no Brasil, com a própria vida. Mais de 5 milhões no planeta.
As vacinas atualmente disponíveis induzem uma imunidade eficaz, mas temporária. Cerca de seis meses. Ruim?! Não!! Muito bom para quem não tinha perspectiva alguma há pouco mais de um ano.
Países que retiraram o uso obrigatório de máscaras precocemente, tiveram que voltar atrás. O que funciona nesse momento é a combinação de medidas de proteção não medicamentosas e vacinas. Novas estratégias medicamentosas virão em breve, mas ainda não estão disponíveis para todos, assim como as maravilhas da Casa Cor.
Reduzimos a possibilidade de colapso do sistema de saúde e chegamos mais próximo de tratamentos eficazes e vacinas mais definitivas e duradouras. Mas ainda não estamos lá.
Enquanto isso, máscaras nos protegerão como coletes salva-vidas para afogados e paraquedas em aviões em chamas.
Acima de tudo, máscaras no contexto atual são símbolo de consciência. Ingenuidade esperar que instrução, cultura e riqueza sejam imediatamente traduzidos em consciência. Obrigatoriedade de uso, sem controle e cobrança com penalidade, não funciona numa sociedade ainda imatura. Vide cinto de segurança em automóveis.
Já aprendemos que vírus que circulam sem controle, independente de ser ou não letais, geram variantes que podem não ser amistosas.
Quando tiraremos as máscaras?!! Certamente no momento que encararmos a realidade de frente e sem falsas ilusões.
Quando teremos carnaval?! Exatamente no mesmo momento que tirarmos as máscaras da hipocrisia e nos olharmos no espelho sem vergonha do que enxergarmos.
Prudência e canja de galinha versus folia e dane-se?! Decisão de foro íntimo de cada um de nós. Apenas, lembro que o futuro está sendo feito agora e que defunto não consome alegria, principalmente se for criança.