Os dados epidemiológicos dessa semana (15 a 19/8) em Belo Horizonte e Região Metropolitana, seguem mostrando a tendência de queda das semanas anteriores. Essa tendência se repete em várias regiões do Brasil e do mundo.
Agora vai! Esse é o sentimento coletivo, exausto de restrições e limites. Cansado de ter medo e camuflar-se atrás das máscaras. Mas, será que agora vai mesmo? O vírus ficou bonzinho e já podemos tratá-lo, como disse Carlos Drummond de Andrade no poema O homem, as viagens, como um "falso touro espanhol domado"?
No último final de semana, Belo Horizonte sediou o tradicional Congresso Mineiro de Infectologia e Controle de Infecções Hospitalares, com a presença de colegas de todo o Brasil. Foram discutidos os prováveis rumos da pandemia, com a participação de dezenas de brilhantes e experientes profissionais.
Atenção! O uso de máscara foi obrigatório durante todo evento.
Todos foram claros em relação às suas incertezas quanto aos rumos da pandemia.
Vamos aos dados, fatos e possibilidades.
Em BH, entre os dias 4 e 17 de agosto, tivemos uma média diária de 104 pessoas infectadas pelo COVID-19 por 100 mil habitantes, ou seja, um risco ainda alto de transmissão viral.
Leia Mais
Varíola dos macacosA mudança Sonegar e falsear dados em boletim epidemiológico é também matar pessoasCadê a ciência no palanque dos candidatos?Quarta dose da vacina contra a COVID-19: para toda população?Essa calmaria atual pode ser entendida como resultado da cobertura vacinal associada à imunidade conferida pela infecção natural, a qual foi ampliada com a variante Ômicron e suas sub-variantes, dotadas de capacidade de transmissão raramente vista em outras doenças infecciosas.
Essa combinação de fatores construiu uma barreira significativa à circulação viral e consequentemente reduziu as internações e óbitos pela COVID-19.
Mas, será que daqui para frente será só alegria? Infelizmente não. Um mar de incertezas ainda torna o horizonte pandêmico nebuloso.
É sabido que essa imunidade cai de forma progressiva em cerca de quatro meses, fazendo com que a população previamente vacinada, ou infectada naturalmente, volte a ficar susceptível a novas infecções, até mesmo por subvariantes da própria Ômicron.
Quem se infectou no princípio do ano pela BA. 1 da Ômicron, em junho já estava susceptível a BA.5 da própria Ômicron.
Para ampliar ainda mais a incerteza pandêmica, uma nova subvariante da Ômicron, identificada como BA. 4.6 vem se mostrando bem mais adaptada que a BA.5, devendo substitui-la em breve.
Essa nova subvariante possui a mutação R346T, previamente identificada na proteína Spike (aquela que o vírus usa para aderir e invadir nossas células), conferindo ao vírus maior transmissibilidade e capacidade de driblar o sistema imune.
Coisa típica da natureza de um vírus RNA, nenhuma surpresa: quanto mais se dissemina, mais sofre mutações e, assim, quando mais modifica suas características, mais incertas ficam as perspectivas em relação à COVID-19.
Ou seja, o bom momento atual pode não durar muito. Já vimos esse filme antes nessa pandemia. Entretanto, parece que passear na praça enquanto seu lobo não vem é uma tentação maior que a contagiosidade viral.
Mal as taxas caem, já abandonamos as máscaras e voltamos a nos aglomerar nos mais diferentes ambientes. Geralmente, as pessoas confundem a não obrigatoriedade do uso de máscaras com obrigatoriedade de não usar.
Traduzindo, o que é obvio e comprovado que protege as pessoas, não precisaria ser obrigatório. Máscaras reduzem em até sete vezes o risco de uma pessoa adquirir COVID-19. Além disso, o risco de complicações aumenta a cada reinfecção.
Comparado com a primeira infecção, uma segunda infecção tem sido associada ao dobro de risco de óbito e ao dobro do risco de problemas cardiovasculares ou pulmonares.
Ter COVID-19 nunca foi e nunca será um bom negócio. Vale consultar o artigo Outcomes of SARS-CoV-2 Reinfection, cujo link encontra-se no final do editorial*.
Merece nossa atenção uma foto da badalada posse do ministro Alexandre de Morais no TSE, onde, em auditório lotado, apenas a ministra Carmem Lúcia encontrava-se com máscara. A mineira ministra deu mais um bom exemplo de respeito a princípios epidemiológicos e científicos.
Além disso, a ministra mostrou também que tem uma boa memória. Na posse do ministro Fux na presidência do STF, com a presença dos mesmos infectantes negacionistas palacianos, ocorreu um surto histórico de COVID-19 entre os membros da corte, levando vários a internação hospitalar.
Escolher caminhos não é fácil, mas, nesse momento, vale a velha regra da prudência e canja de galinha.
Use máscara, vacine-se, evite aglomerações e diante da encruzilhada, siga a trilha da ciência.
*Outcomes of SARS-CoV-2 Reinfection Ziyad Al-Aly, Benjamin Bowe, Yan Xie VA. Posted Date: June 17th, 2022 DOI: https://doi.org/10.21203/rs.3.rs-1749502/v1