Em 29 de janeiro, comemoramos o Dia Nacional da Visibilidade Trans, mas infelizmente essas pessoas não têm muito o que comemorar. O Brasil é o país que mais mata travestis e transexuais no mundo. A expectativa de vida de uma pessoa trans é de 35 anos nos Brasil, menos da metade da média nacional (IBGE).
Com o tempo, os números só pioram. De acordo com a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), entre janeiro e fevereiro de 2020, o Brasil apresentou aumento de 90% no número de casos de assassinatos de pessoas trans quando comparado ao mesmo período de 2019. Ainda assim, os dados não refletem exatamente a realidade, pois há uma subnotificação sistêmica principalmente por se tratar de um grupo em que a sua própria humanidade lhe é negada.
O que são pessoas trans?
Os sistemas de género (português europeu) ou gênero (português brasileiro) são as estruturas sociais que estabelecem o número de géneros e seus papéis associados na cada sociedade. No nascimento, todos nós sofremos uma determinação de gênero classificada pela genitália. Essa classificação é arbitrária e limitadora, pois identifica-se apenas os homens pelo pênis e as mulheres pela vagina.
Uma pessoa trans é aquela cuja identidade de gênero não coincide com a designação dada pelo sexo biológico. Por exemplo: uma pessoa que nasce com pênis e se identifica socialmente como mulher, é uma mulher trans. Quando a identidade de gênero de uma pessoa corresponde ao seu sexo biológico, ela é uma pessoa cis, ou cisgênero.
Acontece que o ser humano possui uma multiplicidade de formas de existência e, consequentemente, de performar os seus gêneros. A identidade de gênero é como a pessoa se reconhece enquanto homem cis, mulher cis, homens trans, mulher trans, gênero fluido, intersexo, não binário ou nenhum deles.
Sistemas de gênero e o ódio a pessoas trans e travestis
Os sistemas de género são as estruturas sociais que estabelecem o número de géneros e seus papéis. Michel Foucault trata sobre concepção moderna de sexualidade no segundo nos três volumes de A história da sexualidade e aponta uma série de fenômenos que são utilizados para controle das práticas e comportamentos sexuais. Os mecanismos biológicos da reprodução humana, os costumes, a moral e as ideologias predominantes na sociedade são dispositivos para normatizar e reprimir toda expressão não binária de gênero.
A transfobia é toda forma de preconceito, discriminação ou violência contra pessoas trans e é estrutural. A nossa sociedade é pautada pela cisnormatividade e julga como adequado apenas as expressões de gêneros de pessoas cis. Pessoas transfóbicas encontram justificativa para o seu ódio no discurso de segmentos religiosos conservadores.
Pautada pela crença de que Deus fez o homem e a mulher, a sociedade nega às pessoas trans a sua condição de existência, restando apenas o lugar de "aberração". "Em nome de Deus" e "pela família" pessoas trans são expulsas de suas casas, marginalizadas pela sociedade, vítimas de agressões físicas e verbais, sofrem estupros coletivos e são assassinadas com requintes de crueldade.
Diferentemente do que se a maioria acredita, a binaridade de gênero interessa mais ao capitalismo do que a Deus. Fundamentado na divisão social do trabalho e na noção de herança, sem binarismo e sem sexismo o capitalismo se desestruturaria. É exatamente por isso que somos socializados para aceitar pensamentos e ações sexistas e reproduzir o controle dos comportamentos sexuais e das diversas expressões de gênero.
Como apoiar as pessoas trans e travestis?
Além de serem expulsas das suas famílias e marginalizadas socialmente, as pessoas trans e travestis também são excluídas das escolas e do mercado de trabalho. Segundo a ANTRA (2019), 90% das mulheres transexuais tem na prostituição a sua principal fonte de renda. Já parou para pensar quantas pessoas trans e travestis trabalham na mesma empresa que você?
É urgente reconhecer a humanidade de pessoas trans e travestis e criar oportunidades para que elas mostrem suas potências pessoais, profissionais e intelectuais. Precisamos desconstruir a cisnormatividade e celebrar a multiplicidade dos seres humanos.
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Para finalizar, é muito importante reforçar que a luta antissexista passa, necessariamente, pela causa transexual. Mulheres, entendam, se o seu feminismo não inclui as mulheres trans e travestis, não há feminismo.