Jornal Estado de Minas

CLARA TEIXEIRA

Sororidade e o mito da rivalidade feminina

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Há um ano, as buscas pela palavra “sororidade” no Google cresceram 250% após Manu Gavassi usar o termo para justificar o seu voto em Felipe Prior para o paredão no Big Brother Brasil. Hoje, estamos vendo uma edição do programa em que as mulheres não se mobilizaram em um movimento de união e que, algumas delas, estão reproduzindo violência e abuso diariamente na televisão aberta.





Recuperando o significado do termo, sororidade vem do latim soror, que significa irmã. A palavra representa a união entre as mulheres com base na empatia e no companheirismo. Para a jornalista Babi Souza, autora do livro Vamos juntas? O guia da sororidade para todas, o conceito se refere à um “olhar carinhoso para outra mulher”. Para além do acolhimento (que também é importante) a autora traz a importância de se pensar a aliança feminina como mobilização coletiva para alcançar objetivos comuns.

Desde a infância, fomos socializadas a nos sentirmos inferiores aos homens. A competitividade feminina é fruto de uma busca incessante pela aprovação masculina seja na família, nos relacionamentos amorosos ou no trabalho. Fomos educadas a encarar as outras mulheres como inimigas. A rivalidade feminina é fruto e ao mesmo tempo motor do patriarcado.

Como a crítica ao pensamento sexista não é incentivada, muitas mulheres julgam estar se empoderando quando repetem os homens. Esse é um dos momentos em que a gente reforça a ideia de que homens seriam superiores às mulheres e reproduz um olhar punitivo umas às outras. O mercado de trabalho é um ótimo exemplo de como reproduzimos o machismo nas nossas relações com outras mulheres, pois é muito comum ouvir mulheres dizendo que preferem trabalhar com homens. 





São muitas as mentiras que o patriarcado nos conta. Márcia Tiburi afirma que a maioria das pessoas foi ensinada a acreditar no “mito da rivalidade feminina”. A filósofa explica que esse mito é parte integrante da própria ideologia da dominação masculina, pois desmobiliza qualquer possibilidade de força coletiva entre mulheres. A união feminina, tão temida pelo patriarcado, é de fato transformadora. 

A estruturação política da sororidade seria capaz de nos tornar muito mais autônomas sobre nossas vidas e nossos corpos, teria potencial para colocar fim à violência contra as mulheres e provocaria mudanças estruturais em nossa sociedade. Como afirma bell hooks (2018), a “solidariedade política entre mulheres sempre enfraquece o sexismo e prepara o caminho para derrubar o patriarcado”.

A sororidade estruturada de forma política chama-se feminismo. Não é à toa que há um projeto incessante de desmobilização do movimento feminista, pautado nessa crença de que mulheres não são unidas. É muito importante pontuar que o movimento feminista precisa ser interseccional, ou seja, precisa considerar as particularidades de cada tipo de mulher. No penúltimo texto dessa coluna, por exemplo, vimos como a pauta das mulheres trans é urgente. Em outro texto, discutimos como o racismo atravessa as opressões sofridas pelas mulheres negras dentro do patriarcado. Ao contrário do que muitos propagam, isso não é desunião, isso é olhar com cuidado, acolhimento e respeito para todas as mulheres.





Para continuar promovendo as mudanças que queremos na construção de uma sociedade livre do sexismo, precisamos renovar o nosso comprometimento com a solidariedade política feminina. Esse comprometimento pede, além de um olhar acolhedor entre mulheres, um movimento constante de reflexão e autocrítica sobre o sexismo internalizado em cada uma de nós. É preciso abrir mão do poder de dominação e exploração que algumas mulheres possuem sobre outras.

A sororidade vai além da compaixão, ela é uma luta coletiva.

audima