A coluna da semana passada apresentou duas das três questões de língua portuguesa propostas ao Chat GPT. Uma foi sobre a conjugação do verbo falir e a outra sobre o emprego da vírgula. Na resposta, ele trocou a flexão do falir pela do falhar. Acertou a vírgula, mas se atrapalhou na explicação.
Hoje é a vez da crase. A pergunta feita ao logaritmo foi esta: Ocorre crase em “O bom filho a casa torna?” Ele respondeu que sim. Errou. Não ocorre.
Crase
O Chat GPT se esqueceu (ou nunca aprendeu) que o acento grave indica o casamento de dois aa. Um deles é a preposição. O outro, quase sempre, o artigo definido.
A casa da gente
O xis da confusão: a palavra casa. Jogo de mata-mata, a dissílaba exige atenção plena. Se falamos da nossa casa, o artigo não tem vez. (Saiu de casa. Voltou para casa.) Sem o pequenino, o uso do acento da crase é impedimento certo: Depois da partida, o goleiro se dirigiu a casa sem demora. O bom filho a casa torna.
A casa dos outros
Se for a casa dos outros, o jogo vira. O artigo entra em campo (a casa dos pais, saiu da casa dos amigos). Aí, escala-se a crase: Depois da partida, o goleiro se dirigiu à casa dos amigos. O bom filho à casa dos pais torna. Foi à casa do adversário.
Bola no pé
Há um acento indicador de crase solto no campo. Onde colocá-lo? Você decide. Olho na palavra casa:
a. José voltou a casa depois de meses de ausência.
b. Quando retorna a casa, Maria desliga o celular.
c. Os católicos dizem que bons filhos a casa voltam sempre.
d. Será que todos retornaremos a casa do Pai?
Bola na rede
Escolheu a letra d? Gol de placa. Casa, nas demais opções, se refere à casa onde a pessoa mora. Aí, não tem artigo. Sem artigo, frustra-se o casamento de dois aa. Um azinho solitário pode fazer verão. Mas não admite crase.
Carlos Gaspar escreve
Leitores participam da coluna. São pra lá de bem-vindos. Eles enriquecem o conteúdo e sugerem novas abordagens. É o caso de Carlos Gaspar. Ele escreve:
“Minha cara, entendo que esse chat apresenta muitos erros, como você mencionou. Mas ocorre um fator ainda mais grave. Esse chat não é democrático. Peça, cara professora, um poema para o Lula e outro para o Bolsonaro. Veja a grande diferença”.
Que tal tentar?
Não combina
Há algo que não combina com o futebol? Há. É o racismo. O jogo da bola no pé é alegria, confraternização, equipe. Os espanhóis não entendem assim. De vez em quando, escolhem um atleta para atacar. Ronaldo Fenômeno já foi uma vítima. Agora é a vez de Vini Jr.
O brasileiro atua no Real Madri. Brilha. Mas, quando pega a bola, ouvem-se gritos da plateia. “Macaco”, diz o coro. As autoridades se fingem de mortas. Mas, na partida contra o Valencia, houve excessos. O governo brasileiro se manifestou. A ONU também. Atletas de todo o mundo deram mostras de solidariedade. No que vai dar? Enquanto esperamos a resposta, vale uma dica de etimologia.
Racismo
A palavra racismo vem do italiano razza, que nasceu do latim ratio-onis. No inglês deu racism e, no francês, racisme. A doutrina sustenta que há raças superiores a outras. Bobeia. A ciência prova o contrário.
Leitor pergunta
Como se conjuga o verbo reaver?
• Clóvis Costa, Porto Alegre
À primeira vista, reaver tem pinta de derivado de ver. Mas é só à primeira vista. Os dois nunca se viram nem no elevador. Reaver é filhote de haver. Significa haver de novo, recobrar, recuperar: Ladrões assaltaram a casa de Gilda. Levaram joias e dinheiro. A polícia os prendeu, mas não conseguiu reaver os bens.
Tal pai, tal filho
Reaver se conjuga como haver, mas só nas formas em que o v do paizão se mantiver: reavemos, reavei, reouve, reouveste, reouvemos, reouveram; reavia, reavias, reavíamos, reaviam; reaverei, reavereis, reaverá, reaveremos, reavereis, reaverão; reaveria, reaverias, reaveríamos, reaveriam; reouver, reouveres, reouver, reouvermos, reouverem; reouvesse, reouvéssemos, reouvessem; reavendo, reavido.