Jornal Estado de Minas

DIREITO E INOVAÇÃO

Nudges, algoritmos e superendividamento



A internet e as redes sociais estão hoje – e especialmente após a pandemia – entre os principais canais de venda utilizados por empresas de todo tipo, seja ela um pequeno empreendedor ou uma grande marca do varejo.





Não é à toa que o marketing digital está tão em alta. Com a comunicação certa, para o público certo, no canal adequado, as chances de compra do produto ou serviço aumentam consideravelmente. E nesse contexto, o consumidor nem percebe que foi atraído por um “gatilho” enquanto rola a tela de seu smartphone. 

Sabe-se que bigs techs como Google, Microsoft e Meta (antigo Facebook) usam algoritmos para rastrear e interpretar a navegação dos consumidores na internet e lhes oferecer produtos e serviços diversos.

Baseando-se em dados como localização geográfica, curtidas e postagens em redes sociais, algoritmos automatizados conseguem traçar um perfil comportamental do consumidor e, por meio de várias técnicas, influenciar na sua escolha de adquirir mais produtos e serviços. 





Traduzido do inglês como empurrão ou cutucão, o termo nudge foi difundido por Richard Thaler (vencedor do prêmio Nobel de economia em 2017), e Cass R. Sunstein em seus estudos sobre economia comportamental publicados no best-seller Nudge, O Empurrão para a Escolha Certa.

Em linhas gerais, nudges são estímulos capazes de mudar o comportamento das pessoas para fins diversos. No livro, há vários exemplos de como eles podem ser de grande valia para empresas, para a administração pública e para as pessoas comuns. 

Entretanto, podem também servir de instrumentos para uma publicidade baseada na manipulação de dados pessoais e no perfil comportamental dos consumidores.

Chamados de nudges digitais, eles podem ser representados no mercado on-line pelo design dos produtos, por técnicas de escassez, spams publicitários, cookies, dentre outros.





Um exemplo simples que ilustra bem esse empurrãozinho para o consumo é o das promoções de Black Friday. A utilização destes nudges digitais é feita como técnica preditiva (baseadas nos hábitos de navegação e consumo) aplicadas por algoritmos automatizados que acabam influenciando na escolha do consumidor.

Esse modelo de negócio, cada vez mais fortalecido pela transformação digital, acaba aprofundando a vulnerabilidade do consumidor; fortalece o consumismo e contribui para o endividamento das famílias.

É necessário, portanto, que ele tenha consciência desta dinâmica das relações de consumo para que sua vontade não seja ditada por algoritmos.

Código de Defesa do Consumidor (CDC) prevê desde sua criação normas que garantem não somente o direito de informação dos consumidores sobre produtos e serviços, mas também o direito à educação sobre seu consumo adequado. 





Em julho deste ano, entrou em vigor a Lei 14181/21, conhecida como Lei do Superendividamento.

 
Definindo o superendividamento como a impossibilidade do consumidor, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo sem o comprometimento de seu mínimo existencial, a lei acrescentou ao CDC normas que reforçam a necessidade do crédito responsável e da educação financeira dos consumidores. 

Neste sentido, porém, o legislador perdeu a oportunidade de tratar destas novas abordagens de publicidade baseadas na utilização de dados pessoais e no perfil comportamental dos consumidores, ou seja, através da utilização dos algoritmos. 

Cabe, então, aos órgãos de defesa do consumidor como os Procons, o Ministério Público e a Defensoria Pública atentarem-se para essa nova dinâmica das relações de consumo e garantirem uma efetiva proteção dos consumidores contra os chamados nudges digitais.

O autor desta coluna é Advogado, Especialista e Mestre em Direito Empresarial

Sugestões e dúvidas podem ser enviadas para o email lfelipe@ribeirorodrigues.adv.br

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