David Cope, cientista e professor americano, ficou conhecido por realizar estudos envolvendo música e inteligência artificial.
Nos anos 2000 desenvolveu seu mais famoso projeto, o programa EMI (Experiments in Musical Intelligence) que cria músicas imitando os estilos de Bach, Beethoven, Chopin e de outros compositores clássicos (algumas composições podem ser ouvidas aqui)
Como normalmente acontece, as composições fizeram sucesso junto ao público em geral, mas foram recebidas com ressalvas pelos críticos de música. Para eles, as canções eram excelentes, mas lhes faltava alma e profundidade.
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Para alguns, os algoritmos, ao criarem uma música, um poema, ou um texto literário, estariam apenas simulando o comportamento criativo humano. Não haveria, por isso, como se aferir em determinada obra, por exemplo, a emoção do compositor, ou a essência do poeta. Discute-se, enfim, se a inteligência artificial poderia ser capaz de competir criativamente com o ser humano.
Dificilmente teremos uma resposta para este dilema até porque ele também está presente quando comparamos criações exclusivamente humanas; pois afinal, o que é arte?
Já outro ponto não menos complexo que envolve as criações desenvolvidas por máquinas refere-se à apropriação de seus frutos. De quem seria a propriedade intelectual de uma música composta por um algoritmo?
A lei (Lei 9610/98) trata dos direitos autorais no Brasil. Suas normas protegem criações como livros, músicas, fotografias, softwares, filmes, dentre outras. Para tanto, seu texto define obra intelectual como criação do espírito expressa por qualquer meio e autor como a pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica.
Tratando-se de uma obra gerada por um sistema de inteligência artificial, poderíamos, a princípio, identificar o programador do software como legitimado para requerer os royalties advindos daquela criação. O que está em discussão, todavia, é a possibilidade de uma obra ser criada por programas de computador, sem a intervenção humana.
Um tribunal chinês reconheceu há cerca de dois anos direitos sobre um artigo produzido pela Dreamwriter, inteligência artificial desenvolvida pela Tecent, empresa de internet mais utilizada daquele país.
A Tecent ajuizou uma ação indenizatória por violação de direitos autorais afirmando que outra empresa teria copiado um relatório financeiro produzido pelo sistema. Seu pedido foi deferido e o caso tornou-se um precedente sobre o tema, embora não tenha ficado clara a definição de quem seria o real criador do artigo, a máquina ou a empresa.
Já o Escritório de Direitos Autorais dos EUA (USCO) rejeitou em 2019 um pedido de direitos autorais para uma obra de arte criada pelo algoritmo Creativity Machine. O pedido feito por seu desenvolvedor foi negado pelo órgão que entendeu que a imagem gerada pela máquina não possuía um elemento humano.
Esta é a interpretação que vem prevalecendo no Brasil e em outros países ocidentais. O certo é que temos um vácuo regulatório em relação à matéria, o que tem sido habitual quando o tema é inteligência artificial.
Por aqui, a necessidade de reforma da Lei de Direitos autorais é tema recorrente, mas de pouca evolução. E como já escrevemos aqui, o Senado Federal nomeou uma comissão de juristas para elaborar um anteprojeto de marco regulatório para a inteligência artificial no país.
O prazo final para a conclusão dos trabalhos previsto inicialmente para agosto foi adiado para dezembro deste ano. Esperamos que o tema da propriedade intelectual mereça a atenção que merece.
O autor desta coluna é Advogado, Especialista e Mestre em Direito Empresarial. É sócio-fundador do Escritório Ribeiro Rodrigues Advocacia e da Tríplice Marcas e Patentes
Sugestões e dúvidas podem ser enviadas para o email lfelipe@ribeirorodrigues.adv.br