Mega influencers. Este é o nome usado por profissionais de marketing para classificar influenciadores digitais que conseguiram atingir um milhão de seguidores em determinado canal ou rede. Já na base desta escala estão os nano influencers que contam com uma audiência entre mil e dez mil seguidores.
Apesar de encontrarmos esta e outras classificações e de conseguirmos identificar facilmente um influenciador em ação, não é tão simples formular um conceito para esses profissionais da rede.
Há uma noção geral. São pessoas que conseguem influenciar uma audiência com seus hábitos, opiniões e estilo de vida. Mas quando isso passa a acontecer? Podemos identificar alguém como influenciador pela quantidade de seguidores? Há como medir essa tal influência? E, mais que isso, é realmente relevante termos esse conceito?
Para os parlamentares franceses, sim. Na semana passada, a Assembleia Nacional da França aprovou um projeto de lei prevendo regras para a atuação dos influenciadores digitais.
Segundo a proposta, que ainda precisa passar pelo Senado para virar lei, influenciador digital é “uma pessoa física ou moral que usa sua notoriedade para comunicar ao público, via meios eletrônicos, conteúdos visando fazer a promoção, direta ou indiretamente, de bens, serviços ou uma causa, em contrapartida, de lucros econômicos ou vantagens de outra natureza”
Eis algumas regras do projeto para quem se enquadrar nesta definição.
Não serão permitidas a promoção de bebidas alcoólicas e cigarro, a oferta de procedimentos estéticos e a consultoria em operações financeiras como aquelas relacionadas às criptomoedas.
O projeto proíbe também o merchandising, ou seja, o influenciador precisa informar por escrito que a promoção de determinado produto ou serviço tem como fim a sua venda.
E, se quiser falar de beleza, o influenciador digital deverá informar se usou um filtro ou outro tipo de retoque em sua imagem.
Se aprovada, essa proposta de regulação mais ampla será pioneira dentre os países ocidentais. (Na China já há regras bem rígidas sobre o tema).
Por aqui, já existem alguns movimentos esparsos de regulação. No final de 2020, o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (CONAR) lançou um código de ética publicitária para influenciadores digitais. Em fevereiro do ano passado, o Ministério do Trabalho incluiu a profissão na classificação brasileira de ocupações.
No congresso está em trâmite um conjunto de projetos de lei para regular a atividade.
São os PLs 2347/2022, 1282/22, 929/2020 e 1335/22.
São os PLs 2347/2022, 1282/22, 929/2020 e 1335/22.
Em geral, iniciativas regulatórias acendem dúvidas e preocupações quanto à utilidade e os impactos das novas regras criadas. Há, por exemplo, o temor de uma indevida interferência do Estado e também o receio de que a nova lei sirva somente para contribuir para o nosso já conhecido inchaço legislativo.
Analisemos, então, alguns trechos das propostas de nossos parlamentares.
O PL 2347/22 exige do influenciador a comprovação de conhecimento técnico, representado por um título de graduação que envolva assuntos relacionados à área em atuação.
O PL 1282/22 traz como deveres do influenciador digital não divulgar conteúdos falsos; respeitar o direito autoral, a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem de terceiros.
O PL 929/2020 que regula as profissões de blogueiro e vlogueiro exige para o exercício delas a graduação em jornalismo.
Já o PL 1335/22 prevê que, para a divulgação de informações jornalísticas, entrevistas e opiniões, é necessária a contratação de jornalista devidamente credenciado e com curso superior na área.
Como qualquer projeto, para que sejam aprovados, sua constitucionalidade será examinada.
Vale lembrar que nossa Constituição Federal (art. 5°, XIII) traz como regra o direito fundamental ao livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão. Determinadas qualificações profissionais que o restrinjam deverão ser justificadas e previstas em lei.
Recordemos que o STF entendeu que a lei não pode exigir a graduação para o exercício da profissão de jornalismo (RE 51196). Para outras áreas, a corte considera válida essa imposição. De que forma, então, poderá se exigir a qualificação de um influencer?
Não há muitas dúvidas (ou não deveria haver) de que a prescrição de medicamentos e tratamentos devem ser feitas por pessoas habilitadas.
Para outras áreas, contudo, isso não é tão simples. Deve uma lei obrigar que dicas de receitas sejam feitas só por pessoas habilitadas em gastronomia? E como ficam os influenciadores da área de investimentos?
Já as regras que exigem respeito a direitos autorais e direitos da personalidade são louváveis. Ainda mais se considerarmos a estratégia de marketing de alguns influenciadores. Para ficarem em evidência nas redes e alcançarem o chamado engajamento, muitos deles apostam na produção de conteúdo polêmico que, muitas vezes, também são ofensivos, discriminatórios e até bizarros.
É certo que eles devem ser responsabilizados por seus excessos. Mas, com exceção do tema fake news, nossa legislação já tem regras suficientes para impor-lhes um filtro, sem que, para isso, seja necessário incluí-los em uma categoria específica.
Talvez os franceses nos deem boas respostas para estas questões, mas por enquanto nos parece que uma regulação por temas específicos envolvendo esses profissionais é o melhor caminho.
O autor desta coluna é Advogado, Especialista e Mestre em Direito Empresarial. É sócio da Empresa Tríplice Marcas e Patentes e do escritório Ribeiro Rodrigues Advocacia.
Sugestões e dúvidas podem ser enviadas para o email lfelipeadvrr@gmail.com