Após o sucesso de sua derradeira temporada, Succession, da HBO Max, está no topo da lista de indicações para o Emmy Awards de 2023. São 27, ao todo.
Seu enredo central conta a trajetória da Waystar Royco, uma empresa familiar bilionária, e os dilemas e conflitos para a escolha do sucessor do patriarca que a comanda.
O processo de sucessão, mostrado com uma boa dose de sátira, revela a rotina da empresa e da família, o caráter duvidoso dos filhos, a relação pouco leal entre eles e as tensões com o pai durão. Tudo isso acompanhado de um jogo de poder que pode despertar também questões éticas e morais.
Há muitas razões para o sucesso da série. Uma delas, sem dúvida, é que a trama não está tão distante da realidade.
Na ficção ou na vida real, o caráter familiar de uma empresa, bilionária ou não, pode representar um sério risco para a sua longevidade.
Mas fato é que a maioria das empresas mundo afora são familiares. No Brasil, segundo dados do IBGE e do Sebrae, mais de 90% das empresas são familiares.
Algumas delas são bem conhecidas do público em geral, como JBS, Votorantim e Magazine Luiza. Em Minas, podemos citar a MRV e o grupo Mater Dei,
Segundo um estudo do Banco Mundial, apenas 30% das empresas familiares chegam à 3ª geração e apenas metade sobrevivem a ela. Para alguns, vale o ditado: “Pai rico, filho nobre, neto pobre”.
Assim como é retratado na ficção, há na realidade das empresas familiares diversos elementos que explicam esse cenário e que podem refletir na sucessão de seu comando. Todos eles ligados à intercomunicação entre família e empresa.
A transferência das desavenças familiares para dentro da empresa e vice-versa, a diferença de valores entre gerações, a idiossincrasia de seus fundadores, integrantes da família exercendo cargo de gestão sem a devida qualificação, dentre outros.
Não faltam estudos sobre o tema em várias áreas do conhecimento. A Fundação Getúlio Vargas (FGV), por exemplo, mantém programas de pós-graduação sobre gestão de empresas familiares.
A abordagem jurídica também encontra um leque bem amplo, pois o assunto esbarra em áreas do direito empresarial, de família e tributário.
Ao tratarmos do controle da empresa familiar, entramos na questão envolvendo sua propriedade e gestão. Alguns filhos serão apenas sócios ou acionistas, enquanto outros, que se mostrarem aptos para tanto, poderão exercer cargos de gestão. A família pode optar também pelo afastamento da administração, mantendo apenas o controle da empresa por meio da maioria de suas ações ou cotas.
Para colocar isso em prática, é comum recorrer-se a arranjos jurídicos sofisticados. A holding familiar é um deles. Sua criação tem como um dos propósitos evitar que eventuais desavenças entre os familiares interfiram na operação da empresa.
Embora não esteja previsto na lei brasileira, algumas empresas familiares elaboram um documento chamado protocolo de família, que serve de base para orientar a conduta de seus membros. Seu conteúdo é variado, mas geralmente contém valores a serem seguidos pelos sócios, integrantes da família ou não, cláusulas de negociação e mediação, regras sobre regime de casamento a ser seguido pelos sucessores, limite de tempo na presidência, regras para desvinculação da empresa e, claro, regras sobre o planejamento sucessório.
O planejamento sucessório, vale dizer, é importante em qualquer organização. Mas tratando-se de empresas familiares, ele é ainda mais relevante e deve focar tanto na passagem do bastão para as gerações seguintes, quanto na hipótese de uma falta repentina do líder da família. Evita-se, com o planejamento, situações complexas, como o condomínio de cotas e de bens, a dilapidação patrimonial e o gasto com impostos de transmissão.
Lacunas e imprecisões nos documentos jurídicos podem trazer muita dor de cabeça. O terreno é fértil para litígios, que podem quebrar laços familiares, comprometer a continuidade de um negócio e impactar marcas consolidadas.
O biscoito Globo, por exemplo, famoso nas praias cariocas, está no centro de um litígio já há alguns anos. Os herdeiros de um dos sócios, morto em 2015, e os sócios remanescentes, divergem sobre o valor a ser pago pelas cotas que ele tinha na empresa.
Enquanto isso, Bernard Arnault, presidente e diretor geral do grupo LVMH, detentor de marcas como Louis Vuitton e Christian Dior, está realizando uma espécie de processo seletivo entre os filhos para escolher qual deles assumirá os negócios da família. O empresário é considerado, atualmente, o segundo homem mais rico do mundo.
O autor desta coluna é Advogado, Especialista e Mestre em Direito Empresarial. É sócio do escritório Ribeiro Rodrigues Advocacia e da Tríplice Marcas e Patentes
Sugestões e dúvidas podem ser enviadas para o email lfelipeadvrr@gmail.com