O problema a que ele se referia envolve a aplicação da chamada teoria do nexo causal. Em resumo, ela diz o seguinte: para que uma pessoa seja responsabilizada por danos sofridos por alguém, deve haver um elo entre a conduta desta pessoa e aquele resultado.
A coisa complica quando estão presentes causas sucessivas ou simultâneas, as chamadas concausas. Um exemplo clássico retirado dos livros e das aulas de direito nos ajudam a explicá-las. Se um motorista atropela um pedestre que sofre ferimentos, a relação de causa e efeito está clara. Mas e se esse mesmo pedestre morre no trajeto, em virtude de um novo acidente, ocorrido agora, com a ambulância que o transportava. O motorista responsável pelo atropelamento poderá responder por essa morte?
Debates como esse adentram a esfera criminal e cível e não estão muito distantes das discussões que têm ocorrido sobre o caso de estupro ocorrido na capital essa semana. Afinal, alguém mais, além do autor da violência sexual, pode ser responsabilizado?
Para alguns criminalistas, a conduta do motorista da 99, que deixou a jovem na rua, deve ser tipificada como abandono de incapaz. Para outros, o crime seria a omissão de socorro.
A polícia não descartou a possibilidade de analisar a conduta dos amigos dela também Segundo as investigações uma sequência de erros teria levado ao estupro da jovem.
E a 99, nesta história? A plataforma emitiu um comunicado na terça-feira (1/8) para lamentar o ocorrido e informar que o motorista foi suspenso. Mas a vítima poderá, no futuro, obter uma indenização da empresa?
Geralmente, UBER, 99 e outras plataformas similares tentam se eximir de qualquer responsabilidade pelos atos praticados pelos condutores que utilizam seu sistema.
A defesa é sempre no sentido de que elas são empresas de tecnologia e que não prestam serviço de transporte. Por isso não podem ser responsabilizadas pelas condutas de seus usuários sejam eles passageiros ou motoristas.
Mas já temos várias decisões da justiça contrárias a essa tese. Recentemente o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve uma decisão de primeira instância que condenou a UBER ao pagamento de indenização à família de vítimas fatais de atropelamento causado por um motorista do app.
Para o desembargador relator, o serviço da plataforma ultrapassa a questão tecnológica e se confunde com o transporte de passageiro, pois gerencia todas as fases da contratação. Além disso a empresa, deve ser responsabilizada por culpa in eligendo, ou seja, por escolher mal o seu representante, no caso, o motorista.
Em outro caso, julgado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a Uber teve que indenizar uma passageira que sofreu abusos e ameaças do motorista credenciado. A juíza do caso destacou que a empresa deve assumir o ônus decorrente da falha, pois permitiu em sua plataforma um profissional com desvio de conduta
O caso do estupro em BH, por certo, ainda terá muitos desdobramentos. A conclusão das investigações apontará os responsáveis na esfera criminal e poderá ser utilizada para um pedido de reparação.
- O autor desta coluna é Advogado, Especialista e Mestre em Direito Empresarial. É sócio do escritório Ribeiro Rodrigues Advocacia e da Tríplice Marcas e Patentes
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