Jornal Estado de Minas

DIREITO E INOVAÇÃO

De quem é a camisa amarelinha?

O ano era 2019 e a Seleção Brasileira estava se preparando para a estreia na Copa América a ser disputada em nosso país.

 

Iniciava-se ali, também, uma disputa judicial entre a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e a Adidas. O motivo foi o lançamento pela empresa alemã de uma camisa estilo retrô semelhante à da nossa seleção.





 

Para a CBF, a comercialização daquele modelo e as campanhas publicitárias para sua divulgação configuram concorrência desleal, pois induzem os consumidores a acreditarem que se trata de um produto oficial. A camisa oficial é produzida e vendida pela Nike, concorrente histórica da Adidas.

 

Segundo a entidade, a conduta também é ilegal porque a Adidas estaria utilizando símbolos exclusivos da entidade, definidos como tal pela Lei Pelé (Lei 9615/98). 

Pediu, então, que a empresa interrompa a venda das camisas e que seja condenada a pagar indenizações pelos prejuízos sofridos.

 

Em sua defesa, a Adidas citou uma antiga lei (5.700/71) que regula a forma e apresentação dos símbolos nacionais. Segundo seus artigos 28 e 29, as cores nacionais (verde e amarelo) podem ser usadas sem quaisquer restrições. 



O desejo da CBF seria, então, segundo a Adidas, apropriar-se do uso exclusivo de cores, o que também é vedado pela lei que regula o registro de marcas e trata da concorrência desleal (Lei 9279/96).

 

Acrescentou que uma camisa verde e amarelo, sem o emblema da Confederação Brasileira de Futebol, é uma camisa qualquer que não se associa necessariamente, à Seleção Brasileira. 

Por fim, apresentou um argumento interessante de que os consumidores, fãs do futebol, são especializados e podem diferenciar a origem das camisas e que não há risco de confusão ou associação indevida.

O desfecho dessa discussão, por enquanto, foi favorável à Adidas.





 

Para o juiz da 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, a seleção se confunde com a representação do próprio país em campo e que a associação de uma camisa verde e amarela com o time de futebol não implica na confusão entre os consumidores acerca da marca da CBF.

 

Ele destacou, também, que na camisa da seleção de futebol, há a marca da CBF, enquanto que na camisa da Adidas, há uma bandeira do Brasil. Por fim, chamou a atenção de que a população brasileira pensa muito mais em um time do Brasil do que num time organizado por uma entidade privada

Diante da improcedência de seus pedidos, a CBF recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e insistiu na tese de que o uso indevido se refere à cópia do layout da camisa oficial e não somente ao uso das cores verde e amarelo. Destacou, também que encomendou uma pesquisa de opinião junto ao IBOPE que atestou que, um em cada dois brasileiros adquiriria a camisa da Adidas pensando se tratar de um produto oficial da Seleção Brasileira de Futebol

 

A corte fluminense não se sensibilizou com os argumentos da entidade. E o voto vencedor trouxe um interessante elemento para a discussão. A comparação do trade dress relativo a cada camisa. O termo, surgido na legislação americana, refere-se ao conjunto de elementos que formam a identidade de um produto, de um serviço ou de uma empresa. Pode se referir ao formato, à embalagem, às cores e a outros elementos. Vale dizer que, no Brasil, não há um registro específico para esse conjunto. Aquele que se sentir prejudicado deve valer-se das regras gerais sobre concorrência desleal.

 

O Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, reconheceu que uma empresa havia copiado o trade dress do Biotônico Fontoura e a condenou ao pagamento de uma indenização.

 

Em outro caso, a Justiça Paulista determinou que uma empresa interrompesse a comercialização de sapatos femininos com sola vermelha, pois estaria imitando o trade dress da grife francesa Christian Louboutin.





 

Assim, para o desembargador relator do caso da CBF, somente uma perícia técnica indicará se o layout da camisa da Adidas é uma imitação do modelo confeccionado pela Nike. Como a perícia não foi requerida, a sentença de 1º grau foi mantida.

 

Só restou à CBF recorrer ao STJ. No recurso ela defende que o processo retorne para a 1ª instância para que a perícia ocorra.

 

Segundo o entendimento do tribunal superior, a perícia é, de fato, necessária para estes casos. Mas os ministros avaliarão se a CBF ainda tem o direito processual de requerê-la.

 

O autor desta coluna é Advogado, Especialista e Mestre em Direito Empresarial. É sócio do escritório Ribeiro Rodrigues Advocacia e da Tríplice Marcas e Patentes 

 

Sugestões e dúvidas podem ser enviadas para o email lfelipeadvrr@gmail.com