Há, inclusive, canais na plataforma especializados na disponibilização desse conteúdo. Basta digitarmos o termo "cover IA" que encontramos várias "interpretações" deste tipo. Segundo o Youtube, esses covers já acumularam mais de 1,7 bilhão de visualizações em 2023.
O sucesso vem muito da curiosidade sobre como será o resultado destas interpretações improváveis. Além disso, há sites que permitem que qualquer pessoa produza esses covers. Basta o interessado realizar o upload do arquivo da música alvo e escolher uma voz para a mixagem.
Mas, juntamente a com a propagação dos covers, vieram questionamentos de ordem ética e legal. Vários artistas mundo afora têm demonstrado sua insatisfação com o uso indevido da tecnologia.
Por aqui, por exemplo, a Legião Urbana Produções Artísticas, que administra os direitos relativos à obra de Renato Russo, está questionando o uso da voz do cantor em um hit sertanejo chamado "Batom de Cereja". A empresa solicitou que a gravadora Universal avaliasse as providências judiciais cabíveis.
Na última segunda-feira (21/08), então, o Youtube anunciou que tomará uma série de medidas para regulamentar o uso da inteligência artificial em seus vídeos.
Segundo a plataforma, a IA está impulsionando uma nova era de expressão criativa, mas proteções apropriadas devem ser levadas em conta para proteger pessoas que têm a própria voz usada em uma criação sem o seu consentimento.
É provável que seja disponibilizada alguma ferramenta para que artistas identifiquem o uso indevido de suas músicas e para que reivindiquem o recebimento dos royalties devidos.
O Google também estaria em contato com gravadoras como a Universal e a Warner para sugerir um programa que criasse vozes para desenvolver músicas geradas por IA.
Enquanto a empresa anuncia a criação de suas próprias normas, o uso da inteligência artificial vem se mostrando cada vez mais um tema central da discussão internacional sobre direitos autorais, que, por sua vez, tem se destacado como o maior desafio atual do ambiente digital.
Atentos a esse cenário, muitos países têm buscado regulamentar a questão, mas não há ainda um consenso de como fazê-lo.
No Brasil, desde a expansão da internet no final dos anos 1990, especialistas já apontavam a necessidade de modernizar a Lei de Direitos Autorais (Lei 9610/98) que, para alguns, já nasceu defasada.
De lá para cá, importantes leis foram criadas para regular o ambiente digital, como o Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados, mas a reforma da legislação autoral não veio. E a dificuldade do tema avançar fica cada dia mais evidente.
Recentemente, falamos aqui da reunião entre o Presidente da Câmara, Arthur Lira, e artistas para a discussão do PL 2370/19, que visa adequação da Lei de Direitos Autorais às novas tecnologias.
Havia uma expectativa de que que a votação ocorresse na semana passada, mas a ausência de um acordo entre artistas e representantes do setor de radiodifusão impediu que a proposta prosseguisse.
Ao que tudo indica, o PL ficará esquecido por um bom tempo. Enquanto isso, valem as regras das plataformas.
* O autor desta coluna é advogado, especialista e mestre em Direito Empresarial. É sócio do escritório Ribeiro Rodrigues Advocacia e da Tríplice Marcas e Patentes.
Sugestões e dúvidas podem ser enviadas para o email lfelipeadvrr@gmail.com