Jornal Estado de Minas

ECONOMÊS EM BOM PORTUGUÊS

Reforma Tributária precisa incluir grandes fortunas e lucros das multis



Nesta terça-feira (13/7), o relator da reforma tributária, Celso Sabino, deve apresentar relatório preliminar com ajustes à proposta original apresentada pelo Ministério da Economia - Projeto de Lei (PL) no. 2.337/2021.



Na onda da discussão tributária, o senador Randolfe Rodrigues protocolou, no dia 02/7, Projeto de Lei Complementar - PLC no.101/2021 - que institui a contribuição extraordinária sobre grandes fortunas e direciona os recursos arrecadados para (i) a área de saúde e (ii) o financiamento complementar ao auxílio emergencial. 

A PLC no.101/2021 prevê imposto com incidência única e alíquota progressiva, entre 0,5% e 5,0%, para indivíduos com patrimônio a partir de R$4,67 milhões de reais. A proposta encontra ressonância naquela desenhada por técnicos da Receita Federal, cujo estudo projetava arrecadação de R$38,9 bilhões de reais, valor esse que já descontava 27% sobre a estimativa original, considerando-se o histórico de sonegação fiscal no país.

Recentemente, a Argentina criou o “Aporte Solidario y Extraordinario para Ayudar a Morigerar los Efectos de la Pandemia”, com imposto único e progressivo, destinado às áreas mais afetadas pela Covid-19. Bolívia foi mais adiante e criou projeto para tributar, anualmente, grandes fortunas.



Na mesma linha e com escopo mais robusto e perene, tem-se estudo desenvolvido pelo Wealth Tax Comission, em discussão pelo governo do Reino Unido. Um diferencial desse estudo é a criação de mecanismo preventivo de fuga de cidadãos, ao definir sua incidência sobre aqueles que tinham residência, sete anos anteriores ao ano fiscal de sua vigência, em um dos quatro países que compõem o Reino Unido. Há poucos anos, na França, com a instituição do imposto sobre grandes fortunas, viu-se a imigração de cidadãos franceses de alta renda para a Bélgica e, caso esse mecanismo compusesse a lei, o país não teria sofrido tanta evasão. 

Reforma tributária é populista e compromete longo prazo, diz economista 

O estudo “Concentração de Riqueza no Brasil”, elaborado e divulgado no início deste ano pelo Instituto de Justiça Fiscal, estima que o Brasil sofreu, entre os anos de 2007 e 2018, perda fiscal da ordem de R$650 bilhões de reais decorrente da regressividade das alíquotas efetivas do imposto de renda pessoa física para as classes de altas rendas. Por isso, e por tantas outras disparidades tributárias, urge  discutir-se mais seriamente a reforma tributária no país e incluir na pauta a tributação sobre grandes fortunas.
 
Especificamente sobre o PL no. 2337/2021, a questão principal, em uma perspectiva mais ampla sobre equidade e justiça social, é corrigir a aberração de isenção tributária das pessoas físicas sobre lucros e dividendos. A proposta original prevê tributação de 20% sobre lucros e dividendos – sem contar caso específico em que pode chegar a 30% - e isenção para microempresas e/ou empresas de pequeno porte, cuja distribuição de lucros e dividendos seja até R$20 mil. Acima desse valor, o microempreendedor passa a ser tributado também em 20%. 



Tributação das pessoas físicas que recebem lucros e dividendos é medida urgente! Correção da regressividade que retirou cerca de R$650 bilhões do Estado é imperativo! No entanto, caso seja instituída a declaração simplificada para pessoa física, com limite de descontos para os rendimentos tributáveis, no valor de até R$40 mil reais, e esta mesma pessoa não tenha despesas dedutíveis, como saúde, educação etc.,a reforma ainda promove distorções. Em um primeiro momento, os indivíduos que se enquadram nesse grupo aumentam seus rendimentos líquidos, mas são punidos no ato de suas declarações anuais de imposto de renda. 

Limitação de gastos com saúde, assim como já ocorre com educação, parece ser mecanismo de melhor correção de distorções, mas pode afetar também a classe média que tem sido parte mais prejudicada no desenho atual. Esse tema, assim como a possiblidade de tributação diferenciada para mulheres chefes de família com filhos, não foram contemplados pelo projeto e não parecem encontrar coro no Congresso Nacional. Considerando-se a existência de discriminação salarial em prejuízo às mulheres, a reforma traria mecanismo de correção indireta com frescos ares de justiça social.

Do lado das pessoas jurídicas, destaca-se a redução da carga tributária do Imposto de Renda sobre as pessoas jurídicas (empresas) – em cinco pontos percentuais e escalonados para os próximos dois anos. O relator da reforma sinalizou que a proposta deve ser mais ousada, com corte de 10 pontos percentuais sobre a tributação das empresas, mas que está em discussão também o fim de algumas concessões tributárias – a indústria química já chiou.



Outro ponto relevante da proposta original do governo é a incidência de 20% sobre o lucro das filiais das multinacionais instaladas no país. Se o Congresso Nacional alterar esse ponto, em breve, terá que revê-lo por motivos alheios à sua vontade.

Na última sexta-feira (09/7), os ministros das finanças dos países que integram o G20 definiram nova arquitetura tributária para as empresas multinacionais. Até outubro deste ano será concluído o plano tributário, cuja implementação deverá se iniciar em 2023. Alguns pilares do acordo são:
- (i) a garantia de repartição mais equânime entre os lucros das multinacionais, entre seus países de origem e os países onde exercem suas atividades e obtêm respectivo lucro;
-  e (ii) o imposto mínimo de 15%, considerado imposto suplementar sobre faturamento. 

As primeiras estimativas da decisão do G20 são de arrecadação adicional global da ordem de US$250 bilhões de dólares, sendo US$150 bilhões de receita tributária global e US$100 bilhões de lucros para diferentes países. Em tempo, 130 países devem se beneficiar dessa medida que, além de quebrar histórica guerra fiscal, corrige distorção escandalosa entre quem produz e quem se apropria do lucro gerado. Por trás dessa decisão inédita, encontra-se um vírus que já foi capaz de provocar mais de 4 milhões de mortes no mundo. Sinais de ruptura histórica fortes têm sido soprados no Ocidente, maior regente do capitalismo e palco de grandes disparidades. Está nas mãos do Congresso Nacional a missão de nos tirar desse teatro do absurdo.





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