Jornal Estado de Minas

ECONOMÊS EM BOM PORTUGUÊS

Sem política econômica, Brasil apela para o populismo



É bem provável que os neoliberais sintam-se mal representados pelo conjunto de economistas que hoje estão à frente do super Ministério da Economia. O governo brasileiro está chegando ao final de seu terceiro ano de mandato abusando da Lei de Acesso à Informação e da Lei Geral de Proteção dos Dados para obscurecer suas ações, criando política assistencial despudoradamente eleitoral, rompendo com seu discurso fiscalista e privatista, ignorando que todo e qualquer País precisa de política de investimento, de estratégia de formação de mão de obra e de ambiente de negócios para se inserir no cenário econômico internacional. O Brasil está conseguindo a proeza de não ter política econômica.



Dados atualizados pelo site da Controladoria Geral da União indicam que, do total previsto de 6.081 bases de dados abertas para o ano de 2021, 75% (4.591 bases) foram cumpridas até o momento, enquanto 16% (952 bases) encontram-se em atraso e 9% (538) não tem sequer Plano de Dados Abertos (PDA).

Dentre as 9% sem PDA, destacam-se o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), o Instituto da Reforma Agrária (Incra), todo Ministério do Turismo e a Vice-Presidência do País.

Na área socioeconômica, outros dados sem previsão de serem abertos são:

- (i) o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) – importante para avaliar se os trabalhadores estão tendo perda real ou não desse benefício ao longo do tempo -;
- (ii) o atendimento dos Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS) – para quem não sabe, os CREAS são de extrema relevância no combate às vulnerabilidades sociais e na definição das políticas de assistência social, uma vez que atuam na ponta junto às comunidades carentes;
- (iii) Resultados da Arrecadação; e
- (iv) Cadastro Nacional de Obras, para avaliarmos o volume, extensão e qualidade dos investimentos do governo em obras públicas. 



Adicionalmente, dados de segurança das barragens, da Agência Nacional de Águas, e do plano de manejos florestais, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), também figuram na lista dos sem PDAs.

Praticamente todas as informações sobre os gastos do Comando do Exército incluem-se nessa categoria, bem como os dados do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Enfim, a lista, como dito anteriormente, engloba quase 1.500 bases de dados indisponíveis na atual gestão. Transparência, certamente, não é o forte!

Há algum tempo que a comunidade acadêmica e representações do terceiro setor já vêm manifestando preocupação com o “apagão de dados” na atual gestão federal. Para além do apagão, três evidências de efeito prático sobre a economia de que o atual governo não está comprometido com a produção, disponibilização tempestiva e transparência dos dados são:

- (i) o adiamento do Censo Demográfico de 2020 para 2022;
- (ii) a disponibilização, sem critérios técnicos, do Auxílio Emergencial de R$600,00; e 
- (iii)  as estatísticas do Novo Caged (Cadastro Geral de Emprego e Desemprego) - importante registro administrativo que sinaliza tendências do mercado de trabalho formal, atuando como prévia da Relação Anual das Informações Sociais (Rais). 

O Censo Demográfico 2022, adiado não somente pela pandemia, mas pelo corte de recursos do Ministério da Economia, para sua realização em 2021, contará com menos perguntas que seu antecessor, realizado em 2010. No questionário básico, serão 26 ante 37 perguntas na versão anterior, e no questionário amostral passará a contar com 77 perguntas ante 108 do Censo 2010. 



Lembremos que a viabilização do Censo, em 2022, conta com intervenção do Supremo Tribunal Federal e, na prática, certamente, perderá base de comparação longitudinal com a supressão de perguntas para caber no orçamento. Aqui, a lógica é inversa: o Censo que se adeque ao orçamento. O Censo é base para planejamento de diversas naturezas, além de balizar parte da redistribuição de recursos do Governo Federal para estados e municípios. A atual equipe econômica parece ignorar sua relevância.

O Caged sofreu alteração metodológica desenhada na atual gestão do Ministério da Economia (ME) – a pasta do antigo Ministério do Trabalho ainda se mantém vinculada ao ME. Sua mudança metodológica claramente permitia subestimação de declaração das demissões, fato esse negado em nota técnica elaborada pela própria Secretaria do Trabalho, mas amplamente refutada por especialistas, dentre eles a que escreve essa coluna – vide “Brasil e seu desemprego na idade da pedra lascada”, publicado em 03/08/2021.

Passados quase dois anos da mudança metodológica, os técnicos do Ministério da Economia admitiram que os dados de 2020 de contratação líquida (empregados menos desempregados) estavam superestimados em 46,8%: o país contratou 75.883 ao invés de 142.690 pessoas em 2020.   

O Auxílio Emergencial, apoio fundamental para minimizar os efeitos da pandemia sobre a atividade econômica e dar garantias sociais mínimas aos mais vulneráveis, foi implementado de forma atabalhoada e chegou a beneficiar, nos primeiros meses, pessoas ocupando cargos militares, funcionários públicos, empresários e outra sorte de desonestos.



O Cadastro Único para Programas Sociais, conhecido como CadÚnico, é a mesma base de dados capaz de identificar os indivíduos aptos a receberem auxílio emergencial, Bolsa Família, Benefício da Prestação Continuada (BPC), dentre outros. 

Vale lembrar que toda e qualquer mudança nas políticas assistências nacionais devem passar por análise do CadÚnico. É sabido que o Ministério da Cidadania carece de mão de obra que possa manusear seu bigdata Cadúnico.

Nesse ambiente, nasce o programa que busca aglutinar tudo e todos, com prazo certo de duração de doze meses. Vem aí o Auxílio Brasil, novo programa social desenhado para reeleger a falta de política econômica e social – meta única e clara da atual equipe econômica.

O conceito de economista neoliberal está empregado erroneamente na nossa sociedade. As escolas neoclássicas de economia pautam-se em técnicas, modelagens, acurácia e rigor para defenderem seu conceito de bem-estar social. Não gostariam de saber que certo grupo de ex-alunos brasileiros, por caminhos estranhos, têm se mostrado, além de desatualizados, inábeis e incompetentes. Esse “seleto grupo brasileiro” defende, sem apresentar critérios claros e transparentes, novo modelo “natimorto” de política social. 




audima