Jornal Estado de Minas

1º DE MAIO

O dia do trabalhador, em meio à pandemia da COVID-19 : ''o que você quer que eu faça?''

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1º de maio - um dia que, historicamente, é marcado por atos de luta, shows e confraternizações dedicados aos trabalhadores de todo o mundo. Neste ano, as ruas estarão vazias, os movimentos em prol de melhores condições de trabalho e de valorização da força motriz da economia não acontecerão.


O 1º de maio de 2020 será um dia como tantos outros que estamos aprendendo a viver: comércios fechados, rotinas alteradas, crianças e trabalhadores em casa. Fato é que ninguém se planejou para a pandemia que estamos vivendo mas para algumas profissões e cargos de liderança não é tolerado não saber, não fazer e não falar. 

Os mestres dos cuidados paliativos, com os quais tenho a honra de aprender todos dias, afirmam que "sempre há o que fazer". Um analgésico para a dor, um antitérmico para a febre, o conforto da palavra e até mesmo o aconchego do silêncio. A arte de cuidar e de liderar é composta por diversas habilidades e a comunicação é  essencial. Respostas prontas, ríspidas ou mal pensadas não contribuem e pioram o sentimento de angústia do ser humano.

Inúmeros trabalhadores não puderam ficar em casa, muitas atividades não foram possíveis de serem realizadas em home office e muitos serviços que, a princípio não eram essenciais, passaram a ser. Ainda que o foco atual seja os profissionais de saúde, não podemos nos esquecer que precisamos nos alimentar, que equipamentos devem ser revisados e consertados, os pneus furam, os carros batem, as redes elétricas necessitam de suporte e a internet tem que funcionar. A maioria dos serviços e trabalhos será essencial em algum momento durante essa longa jornada da pandemia.



"Eu preciso trabalhar, o que você quer que eu faça?” Que se for possível faça de casa, mas se não for viável, trabalhe da forma mais segura possível e entenda que a doença está mais próxima de cada um de nós, por isso não podemos relaxar com os cuidados de higiene e com as proteções necessárias. Aqueles que estão trabalhando merecem mais empatia com os medos e com as dificuldades enfrentadas. As mensagens de carinho e de amizade são sempre bem vindas e necessárias para tranquilizar e deixar as horas mais leves, mas não espere respostas ou delicadezas de prontidão.

Da minha parte, posso falar dos cenários da área de saúde. Os profissionais na linha de frente são os soldados da batalha e, muitas vezes, só conseguem responder ou ler as mensagens em um momento de descanso que nem sempre tem hora marcada para acontecer.  Não cobre tranquilidade, não exija respostas e não se coloque na posição de que você entende - se você não está lá, você não entende. 

Você consegue imaginar o que é ter que trabalhar na presença confirmada do vírus que está matando pessoas no mundo inteiro e parando a tal falada economia? Você entraria em um quarto com a certeza do perigo? O que muitos profissionais vivenciam diariamente é entrar, sair e trabalhar na presença do maior medo atual: o medo de uma partícula entrar nos pulmões e se contaminar. Será que vou me curar? Será que vou contaminar meus amigos e familiares? Se tudo der certo ficarei imunizado ou serei mais um número nas estatísticas de óbito?.



Todos que estão trabalhando, independente do serviço realizado, sabem da suas responsabilidades e estão tentando realizar da forma mais segura possível. E o que se espera dessas pessoas? O que se espera dos profissionais, dos líderes e dos governantes? Responsabilidade.

O feriado de hoje vai ser lembrado pelo dia das ruas vazias, o dia sem shows, o dia sem festas e churrascos. Então, o que eu quero que você faça?

Quero que você saiba que o isolamento social é importante e que a flexibilização é perigosa (países como Alemanha, exemplos de atuação contra a COVID-19, já observaram aumento dos casos após a flexibilização). Países sérios estão mantendo o isolamento social de maneira consciente, mesmo sabendo que o impacto econômico será gigantesco, mas nada vale mais que a vida de seus cidadãos.

Quero que você entenda que os insumos hospitalares não devem ser usados nas residências ou em situações triviais, os profissionais que estão em contato direto com o vírus precisam desses itens para continuar cuidando dos outros e viver - sim, os profissionais de saúde adoecem e precisamos de todos saudáveis. Quero que você use água e sabão quando disponível e reserve o álcool em gel para situações adequadas. Quero que você use as máscaras de maneira correta. Quero que você seja protagonista do achatamento da curva, que você se informe bem e não multiplique notícias falsas. Quero que você confie na ciência e em quem está à frente de maneira responsável. Quero que você entenda como é difícil diariamente receber notícias graves e não desistir. Quero que você saiba que também desejo ver nossas cidade de volta; queremos viajar, comemorar e abraçar.



O que eu quero que você faça? Entenda que cada um de nós não é herói, Deus e nem messias, mas esperamos muito daqueles que podem conduzir este caos de maneira correta, respeitosa e responsável. É necessário respeitar o conhecimento técnico, realizar investimentos adequados e se responsabilizar pelas ações irresponsáveis. O Brasil ocupa hoje o grupo de países em crescimento de número de casos da doença e morte. Não vou nem discutir a falta de testes e de estrutura, mas o fato é que a doença está alcançando seus números mais terríveis e o que mais precisamos é foco na verdade, ciência, segurança e, se possível, mais leveza e apoio. 

A ansiedade por um dia de festa, shows e alegria coletiva vai passar, outros primeiros de maio virão, outros brindes acontecerão, outros recordes da economia serão quebrados, mas por enquanto não me pergunte se estou cansado, se a doença é grave, se eu vi o número de mortos, se eu conheço alguém com a doença ou se eu acho que é realmente perigoso. 

Tente neste momento fazer as medidas que são exaustivamente divulgadas por pessoas sérias e entenda que todos nós que vamos trabalhar no dia do trabalho, assim como estamos trabalhando mais intensamente desde que a pandemia chegou, gostamos das suas mensagens de carinho e de amor, mas faça sem esperar nada em troca. Foque suas cobranças naqueles que tem por obrigação ter respostas e atitudes.

“O que você quer que eu faça?” Me respeite, respeite meu país e nossos cidadãos; a “gripezinha” vai passar mas nem todos passarão bem por ela.

Tem alguma dúvida ou gostaria de sugerir um tema? Escreva para mim: ericksongontijo@gmail.com