Jornal Estado de Minas

RACISMO

Perfilamento Racial: negro parado é suspeito, negro correndo é ladrão


“Negro parado é suspeito, negro correndo é ladrão”. Muito provavelmente, se você já ouviu essa frase, foi em um contexto de racismo recreativo, mas além disso ela também é a síntese perfeita para traduzir o que é perfilamento racial. A nomenclatura “perfilamento racial” pode até ser desconhecida para você, mas é uma constante na vida dos homens negros que começam vivenciar essa realidade no exato momento em que entram na pré adolescência. Esse corpo negro, masculino, periférico ou não, que é visto e tratado com desconfiança. Desconfiança essa embasada no racismo que forja no imaginário popular  uma percepção do homem negro como perigoso e, para os policiais, como o padrão de elemento suspeito.





Constatar que uma pessoa é suspeita, perigosa ou culpada única e exclusivamente porque essa pessoa é negra é perfilamento racial. E isso gera inúmeros transtornos para quem é vítima dessa discriminação quando praticada pelos agentes de segurança pública. A racialização é utilizada como um dispositivo de segurança em que, quanto mais escura a pele, mais vigiada a pessoa deve ser, interferindo diretamente no direito de ir e vir e de viver das pessoas que têm a pele preta.

Como se não bastasse vivenciar de forma recorrente revistas vexatórias em praças, dentro do transporte público, dentro do seu próprio carro, o perfilamento racial ocasiona prisões de forma arbitrárias como aconteceu com o até então estudante da Universidade Estadual de Minas Gerais, Pedro Henrique Afonso que, em 2015, foi abordado de forma truculenta, algemado e conduzido à delegacia por policiais que o acusaram de roubar um carro que era dele. Imagine o que é ser detido acusado de roubar o seu próprio carro. 

Imagine o que é está sentado na Praça Sete, fazendo uma hora para ir a um compromisso ou olhando o movimento, observando quem vai e quem vem, ou até mesmo aguardando alguém e você ser a única pessoa solicitada pelos policiais a se levantar,  colocar a mão na cabeça, o rosto grudado na parede, não poder questionar para entender o porque está sendo abordado ou abordada, passar a documentação solicitada por eles, ficar ali dez minutos naquela posição desconfortável e constrangedora para eles puxarem sua ficha e descobrir que o único “crime” que você cometeu foi nascer negro.





Toda essa cena bem no centro da cidade, que é um verdadeiro Big-Brother de tantas câmeras de olho vivo que têm, de tantas câmeras que são monitoradas 24h por dia por agentes de segurança  que dão um suporte à polícia militar e à guarda municipal. Através das câmeras, eles monitoram e sabem quem está ali cometendo algum ato ilícito ou quem só está ali exercendo seu direito de ir e vir. Pois é, o perfilamento racial é, também, uma forma de constranger, uma ferramenta para intimidar e afastar pessoas negras dos espaços públicos, tornando esse espaço perigoso para a população negra, até porque ninguém quer ser confundido com criminoso e ser tratado como tal.

Quando agentes do estado pautam a sua abordagem pela raça, eles cometem racismo institucional. As abordagens policiais só podem ser realizadas por “fundada suspeita” e é urgente e necessário criar artifícios que impeçam a atuação policial baseada em elementos de discriminação como raça, local da moradia e renda.

O constrangimento submetido pelo  perfilamento racial já seria uma justificativa mais do que o suficiente, porém esse perfilamento aprisiona e mata pessoas negras.

Aprisiona quando colocam fotos de pessoas negras de forma aleatória em banco de imagens de reconhecimento para que vítimas de crimes indiquem quem as violentou, sem que essas pessoas das fotos tenham nenhum histórico de criminalidade e a vítima sob pressão, ou por falta de empatia, indica o primeiro preto que ela vir pela frente, mesmo esse preto sendo inocente.





Mata quando cinco jovens negros saem de carro para comemorar e são atingidos por 111 tiros, porque o fato deles serem negros fez com que os policiais que os viram tivessem certeza que os jovens eram bandidos e se sentiram autorizados a atirar. Mata também quando os policiais avistam um homem negro com um guarda chuva ou uma furadeira na mão e confundem com uma arma e atiram para matar. 

É contra o perfilamento racial e a favor da vida que entidades do movimento negro estão lutando quando propõem e exigem a nulidade de processos que tiveram motivação de abordagem em razão da filtragem racial. Até porque os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2022) indicam que as pessoas negras representam cerca de 67% da população prisional e que, a cada 10 pessoas assassinadas neste país em 2021, 8 eram negras. Negros foram 87 % dos mortos pelas forças policiais. Isso mesmo, quase 90% das pessoas que a polícia matou no Brasil eram negras. As chances de uma pessoa negra ser assassinada são 2,6 vezes maiores que uma pessoa não negra.