Ao contrário do que muitos pensam, coragem não significa ausência de medo, mas a habilidade de conviver com eles. Nos tornamos corajosos quando aprendemos a dialogar com nossos temores, chamá-los pelo nome e registrar sua presença em momentos importantes.
O medo não é bom professor, mas um ótimo vigia. Sem ele talvez não estivéssemos aqui. Foi fundamental na vida de nossos ancestrais e continua essencial em nosso dia a dia. Quem não tem medo é doido.
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Acontece que estamos falhando aí. Nossa rotina perversa, nosso interesse na carreira e nossos próprios medos estão nos distanciando desse lugar-adulto: ser suporte para os que chegam. Um dos atos mais corajosos que alguém pode demonstrar é se abrir em relação às suas inseguranças com alguém.
Não podemos negar que esse é um lugar difícil de ser ocupado, pois escutar os medos de alguém é lidar, sobretudo, com aquelas covardias que marcam nossa própria história. No entanto, cada um construirá seu próprio caminho e precisará, ao longo da vida, de companheiros “escuta-dores”.
Vale lembrar que o medo não é uma coisa que se trata com medicação. Essa tem sido uma ação recorrente, que parece eficaz em um primeiro momento, mas não passa de uma atitude de silenciamento. Calamos o outro e ainda confundimos esse sentimento com ansiedade, tristeza, frustração ou outros sentimentos. Questões de afeto se tratam com afetividade, não com medicamento.
Nossa disponibilidade para uma escuta sincera faz toda a diferença, apesar de todo receio de conversar sobre os medos alheios. Isso acontece porque essa atitude ressalta nossa impotência diante das decisões e escolhas que só cabem ao outro, geralmente alguém que nos foi confiado pelo destino, pelo acaso ou pela genética.
Como ímpeto, ainda temos a triste mania de culpar alguém pelo medo de nossos filhos, como se esse sentimento fosse algo impresso, de fora para dentro, no corpo daqueles que amamos. É importante lembrar que o medo opera na subjetividade e, na maioria das vezes, não é um dado objetivo que passeia pelos campos, ruas e ambientes físicos. Isso pode se tornar um grande problema, na medida em que misturamos dois afetos distintos e perigosos: insegurança e culpabilização. Não vá por esse caminho.
Se nossos filhos nunca nos procuraram para falar sobre seus projetos de vida, frustrações e medos tem algo de errado aí. A vida perdoará grande parte de nossas inseguranças como pais, mas nos cobrará caro por não termos a coragem de ouvir o medo de nossos filhos.