O filósofo Walter Benjamim, em um de seus textos, destaca duas figuras importantes na sociedade: o camponês e o marinheiro comerciante. E o que une dois sujeitos com ofícios tão diferentes? O ato de contar histórias.
Ambos pertencem à família de oradores capazes de sustentar as narrativas de uma determinada comunidade. O agricultor, por sua forte ligação com a terra, costumes e feitos antepassados. O comerciante, por trazer notícias de outras paisagens, hábitos diferentes, outras divindades e a diversidade moral de culturas diversas.
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Confesso que tenho acompanhado, de longe, os dramas familiares de Larissa Manoela. No entanto, acabei tomado de espanto com a quantidade de manchetes nas páginas de vários jornais e o poder com que esse assunto pautou a opinião pública, sem distinção de classe, crença, ideologia e torcida de futebol.
A preguiça de acessar as manchetes continua, mas o espanto filosófico foi aguçado. Estamos carentes de histórias? Os problemas de uma menina rica são de interesse nacional, de maioria pobre? A relação familiar, como espaço privado de decisão, precisa ser publicizada para ser resolvida? E a pergunta mais filosófica de todas: o que você, que pega ônibus todo dia, corre para pagar a conta de luz e briga com seu filho para ir bem nas provas, tem a ver com os dramas existenciais da garota de zona sul?
Talvez discutamos, apenas pelo prazer da fofoca mesmo. Nenhuma novidade. Somos um dos países que mais consomem novelas no mundo. Quando o romance policial vem com “tonalidades de vida real”, melhor ainda! Brigas familiares, culpas lançadas, ataques morais e muita futilidade aguçam nosso gozo pela vida alheia. E o melhor de tudo: o prazer de tomar assento na cadeira de juiz e avaliar o melhor final para histórias que não são nossas.
Afinal, como não temos nenhum problema urgente mesmo, podemos nos dar ao luxo de nos inteirarmos dos imbróglios dos outros. Civilização feliz a nossa! Realmente, não precisamos mais de bons contadores de história.