O futebol é uma experiência estética. Nada mais que isso. Subir as arquibancadas, escutar os cânticos em grupo, enxergar o verde da grama, tomar o primeiro gole de cerveja gelada e sentir o cheiro da partida que retira do estômago o grito de gol. Quem não se contenta com isso procura outra coisa, que não um jogo.
Que falta faz Nelson Rodrigues, afirmando que o “ser humano precisa, de vez em quando, ser burro. E a nossa crônica de futebol parece inteligente demais”. Pouco importam os problemas de bastidores e os meandros das transações monetárias. Nada mais mesquinho que politizar a bola que corre entre as quatro linhas. Geralmente, essa é a principal característica dos seres de alma pequena, que tentam arrebanhar gente frustrada para gozar de uma boa dose de ressentimento.
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A partida profissional, o time amador e a pelada no final de semana ainda são espaços de respiro para aqueles que buscam, no esporte, aliviar as tensões do mundo produtivo e gerencial. Romper essa última barreira é permitir que o peso do patrulhamento político (sempre autoritário com verniz de boas intenções) invada esse oásis de fruição. O mundo ficará cada vez mais chato assim.
A pior coisa que poderia acontecer é uma arquibancada intelectualizada, exigindo, na compra dos ingressos, a apresentação da declaração de posicionamento político. Isso sim é negar a pluralidade de torcedores que se abraçam, no momento maior, sem se perguntar por profissão, renda e ideologia. É preciso ter medo disso, pois “os idiotas são como a força da natureza”.
Aliás, essa é uma das principais caraterísticas do esporte bretão. Do radinho de pilha aos camarotes decorados, gente de toda sorte se encontra para, simplesmente, torcer. Pessoas com muito ou pouco tempo de vida, jovens e idosos, ricos e pobres, éticos e imorais, vilões e heróis, progressistas e conservadores. Tentar fazer teoria política a partir disso é desconsiderar, por inocência ou desonestidade, a natureza estética da partida.
Lógico que os inteligentes do futebol irão reclamar, isso porque talvez seja essa a oportunidade de se mostrarem sabedores de segredos que não são revelados aos pobres mortais, conhecedores de coisas que ninguém mais sabe, portadores de teorias que não dizem nada da vida real, mas servem para massagear o próprio ego. Um bom divã resolveria tudo isso, não a arquibancada.
Poucas coisas são mais chatas que torcedor politizado, alienados que tentam reproduzir na peleja a separação “nós e eles”. São idiotas que, para continuar na veia nelsonrodriguinana, provavelmente irão dominar o mundo, “não pela capacidade, mas pela quantidade. Eles são muitos”