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Estado de Minas DA ARQUIBANCADA

Reinaldo é muito maior do que Pelé. Na terra de Tiradentes, quem manda é o Rei

Em seu confinamento no alto da Serra da Mantiqueira, Fred Melo Paiva fala de Tiradentes, Reinaldo e jogo de botão


postado em 11/04/2020 04:00

Para Fred Melo Paiva, o atacante Reinaldo foi muito maior do que Pelé entre as quatro linhas(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Para Fred Melo Paiva, o atacante Reinaldo foi muito maior do que Pelé entre as quatro linhas (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
 
 
Como paciente oncológica, Fabi faz parte dos grupos de risco do coronavírus. Por isso, viemos nos refugiar no alto da Serra da Mantiqueira, fugidos de São Paulo, onde vive este atleticano exilado. Agora no mato, cercado de montanhas, vacas e mosquitos, guardados por Fidel Castro e Fantasma, meu pastor e meu galgo, cumprimos a quarentena apartados da humanidade.

Em nossa Sierra Maestra dorme-se cedo. Não há televisão. Para acessar a internet é preciso escalar uma montanha vizinha, subir a trilha driblando as bostas da vaca e atingir o cume e a glória do 4G sentado na pedra como um Zaratustra. Melhor se ater aos livros.

Ontem mesmo a biografia de Tiradentes, de Lucas Figueiredo, me ensinou que a Serra da Mantiqueira tinha o acesso proibido durante o período colonial, obrigando os viajantes que iam de Minas Gerais para o Rio de Janeiro a passar pelos “registros” de coleta de impostos. Foi ele, o alferes arrancador de dentes, o encarregado de abrir a primeira estrada, tendo ganhado depois uns lotes de terra por essas plagas. Também ajudou a combater o Mão de Luva, um bandido local com esse nome de goleiro (alguns são Mãos de Alface). Quando subo o morro no encalço da internet, bato os olhos na vastidão de outros morros em busca do meu vizinho famoso.

Na baixa densidade demográfica em que me encontro, dou notícia de um único atleticano, residente a cerca de 10 quilômetros. Não o conheço, é amigo do amigo do amigo, mas é famoso por dormir e acordar com uma camisa do Galo, beca com a qual desfila na vila mais próxima. Avanço na história do nosso Joaquim e posso vê-lo de punho cerrado, como Reinaldo, o primeiro a desafiar Portugal, o outro a confrontar a ditadura. Certeza que Tiradentes era atleticano, ainda que não houvesse Atlético, o que eu duvido (o Galo é eterno, pra trás e pra frente).

Na matula que trouxe de São Paulo, vim preparado para o fim do mundo, com a perspectiva de me embrenhar na mata profunda, entre cobras e onças, caso o “Coronga” se aproxime. Para tanto, calculei necessárias umas duas ou três camisas do Atlético. Com o passar dos dias e das noites, sempre iguais, dei pela falta de um item que pode ser de grande eficácia no combate senão ao corona pelo menos ao saco cheio: o meu jogo de botão. Parto hoje mesmo em missão de resgate.

Sim, vou até a casa do inimigo, São Paulo, em busca de João Leite, Nelinho, Luisinho, Batista e o Touro Walença; Cerezo, Manco e Renato Dramático; Catatau, Reinaldo e Éder – eis o meu histórico 4-3-3, imbatível no alto da rua do Ouro, quando ainda não existia a avenida dos Genocidas, digo, dos Bandeirantes. O leitor mais atento certamente estranhou a escalação de Manco com a camisa 8. Também estranhei quando, ali pelos meus 12 anos, dispus a selegalo sobre o Estrelão e um dos nossos apresentava um defeito de fabricação – era desalinhado na parte de baixo. Virou o Manco, espécie de Emerson Conceição, ou um Zé Welison piorado porque capenga.

Junto com o Atlético, virá também mais dois Atléticos, além do Cosmos de Nova York e as seleções da Argentina, Brasil, Inglaterra e Itália. O Estrelão joguei fora depois de ter grafado uma suástica em um dos campos e um A da anarquia no outro. Uma peleja história. Mas mal compreendida antes de o nazismo voltar à moda no Brasil com discursos de Goebbels e o Nazista de Unaí. Demolido logo após servir de abrigo aos filhotes de Cajango, meu falecido Akita, ergueu-se em seu lugar um campo oficial sobre cavaletes, minha mesa de jantar quando me mudei para São Paulo, em 1996. Como alugara um quarto e sala no Edifício Guaraporé, achei por bem concedê-lo o naming right, batizando-o Gigante do Guaraporé.

A exemplo de uma arena que se erguesse no improvável bairro Califórnia, o Gigante do Guaraporé despontará entre as montanhas proibidas da Serra da Mantiqueira. Chega dessa abstinência de jogos do Galo! E na estreia contra o Cosmos, restará provada a verdade histórica: Reinaldo é muito maior do que Pelé. Na terra de Tiradentes, quem manda é o Rei.

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