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Estado de Minas DA ARQUIBANCADA

O Galo vai vencendo, uma a uma, as grandes injustiças históricas

Com o bicampeonato na Copa do Brasil, poucos dias depois do bi no Brasileiro, o torcedor atleticano vai ao paraíso


16/12/2021 04:00

Festa atleticana em Curitiba
Em Curitiba, o Atlético se impôs mais uma vez e derrotou o Athletico: temporada alvinegra é mais que vitoriosa (foto: Heuler Andrey/AFP)


A princípio, não caibo em mim de felicidade. A gente não para mais de ganhar. O Galo é um acontecimento histórico e social. Coitado do Moro, Athelicano fajuto, o Galão ganhou mais uma vez. Pensávamos, com a nossa sempre cara convicção de sofredor, que o baile havia se encerrado naquele de Reinaldo que o Hulk não fez, o 5 a 0 que nos aliviaria a alma. Fiquei preocupado.

Deixo aos arqueólogos do futuro o registro fiel do ocorrido na noite de 15 de dezembro de 2021: o Galo ganhou. Ou, em versão mais fidedigna, o Gaganhô. De novo. Mais uma vez. Novamente. De modo que não se espantem se encontrarem vagando ébrio pelo Cosmos a estranha onda sonora que embalou o nosso povo nesse ano para sempre mágico, o acerto de contas de todos os acertos de contas: “Ai, credo, o Galão ganhou mais uma vez”.

Já nos arrastávamos como zumbis, arqueólogos do futuro, quando veio mais um bi, o da Copa do Brasil. Digo isso porque a celebração já se estendia como a festa que termina sem terminar, migra para o Bolão, de lá para o Mercado Central, e mais adiante recomeça naquele ciclo que, embora vicioso, é também virtuoso. Uma balada infinita, você me entende, a esbórnia total, esperada por tantos anos.

A gente se belisca, arqueólogos do futuro. É difícil acreditar, mesmo que sejamos nós os crentes da Igreja Universal do Reino do Galo. E, de tanto nos beliscar, nosso couro carcomido dá sinais de esgarçar-se em medonhas tosses secas, sapinhos nos cantos da boca, perebas no corpo cansado daquelas semanas de Carnaval feitas apenas de domingos, segundas e terças. Se quarta-feira tem mais, só se for pra morrer todo mundo de Atlético.

Com esse novo baile, 2 a 1 no time do Moro, estamos agora submetidos à mais profunda alegria. É a Amazônia que parou de queimar, o muro que caiu, a polícia que parou de matar. Somos a utopia de um mundo melhor.

O Gaganhô e isso somos nós saindo do caixa eletrônico depois de pagas as promissórias dos deuses para com a gente, uma dívida astronômica, impagável, cruzeirômica, vamos dizer – mas que não rolava mais de rolar, de modo que ficaram liberadas as primeiras parcelas, das muitas outras que virão.

O Galo de 21, arqueólogos do futuro, é implacável. Meteu 4 a 0 no jogo de ida da final e ficou barato, houve o gol de Reinaldo que o Hulk perdeu. O Galo de 21, a que o Caixa acertadamente chamou de Máquina 2021, não vacila, massacra, impõe o seu valor. Nunca antes, se não me falha a memória curtida nessas tantas Heinenkens da vitória, houve um Galo tão contundente, papo reto, pá pum. O azar gosta da gente, melhor mesmo não dar mole pra ele.

A finalíssima acaba de terminar, embora, já falei, 2021 é o nosso 1968, o ano que não acabou. O juiz, digamos, apitou o final do jogo. Credo, somos bi mais uma vez, apenas 13 dias depois do outro bi, o do Brasileiro. 13 é Galo! Os zumbis se arrastam em convulsão bem na minha frente, no Bar do Orlando, em Santa Tereza. Corpos que se beijam e se abraçam, queria beijar a careca do seu Orlando, ele que já viu tanta coisa, tanto azar, tanta injustiça. Agora é a sua hora, o ômicron que o perdoe em sua devastação capilar.

O Daniel de Oliveira, arqueólogo do presente, me deixa uma mensagem: “Começou a NOSSA ERA”. Foi isso mesmo, arqueólogos do futuro. Foi exatamente aqui, em frente ao Bar do Orlando que o duplo bi marcou o tempo das coisas: antes, o jejum, agora, o rodízio na churrascaria. Queremos tudo: sushi com picanha, abacaxi com farofa de ovo. O atleticano merece o paraíso. Se é isso que ele quer, então, toma!

Desdentados, investidores da bolsa, flagelados da pandemia, putas, viados, bolsonaristas, comunistas, ascensoristas, pedestres, motoristas, punks velhos, sertanejos universitários, toda a atleticanada reza em conjunto a sua oração de desbunde – a despedida de uma era que se poderia chamar, como no filme, LUTAR, LUTAR, LUTAR. O ingresso em outra, com a queda da Bastilha representada pelos dois bis, VENCER, VENCER, VENCER.

O que fazemos agora com o nosso sofrimento atávico, a nossa luta inglória, mas sempre luta, sempre resiliência, raça e amor? O que fazemos agora dos nossos calos, nossas bolas de ferro amarradas no pé? Digam, arqueólogos do futuro, o que fazemos com isso?

Nesta garrafa lançada ao mar, destinada ao futuro, tudo que sei é que nada sei. Festejamos o nosso sofrer, o nosso penar, mas agora recebemos o pagamento daquela sua traição. No dia 15 de dezembro de 2021, a gente foi feliz e sabia disso.


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