Se tem alguém que tem o que dizer sobre vitalidade e requalificação das cidades, são os europeus.
Eles não inventaram as cidades, mas tiveram enorme sucesso na transformação de vilas em burgos, burgos em cidades, cidades em favelas (revolução industrial), e favelas em cidades. Sucesso na reconstrução das cidades destruídas pelas guerras e na requalificação de seus centros urbanos e distritos portuários.
O sociólogo francês Pierre Bourdieu descreveu três tipos de capital pessoal: o capital econômico, o capital social e o capital cultural. O mais importante deles, o capital cultural, trata da educação e outras formas de conhecimento, e é aquele que proporciona vantagens por meio das quais é possível adquirir capital econômico e capital social.
Não discordo, mas contextualizo: Pierre Bourdieu descreveu o que viu mas, tivesse nascido 40 ou 50 anos depois, teria se dedicado a algum outro assunto, tal o acesso ao capital cultural para qualquer habitante de uma cidade (média ou grande) europeia.
Sistema educacional moderno, museus, teatros e eventos culturais com entrada gratuita, centenas de exposições, feiras, simpósios e seminários a cada ano.
Sistema educacional moderno, museus, teatros e eventos culturais com entrada gratuita, centenas de exposições, feiras, simpósios e seminários a cada ano.
Com o sistema de transporte urbano e ciclovias disponíveis, nem o deslocamento e a mobilidade chegam a ser uma questão. Para qualquer cidadão da comunidade europeia, hoje, basta dedicação.
- Belo Horizonte: só decola se fechar o aeroporto
A realidade europeia não é, por certo, a brasileira. Ainda fazemos pouco caso da coleta e tratamento de esgoto (como se fosse sequer uma opção), e o metrô varia entre uma miragem ou uma piada, a depender da cidade analisada.
Ainda assim, Belo Horizonte possui, em seu município, 332 escolas municipais, 255 estaduais e 5 federais. Tem também 1.477 escolas privadas, a maior parte com oferta de bolsas integrais ou parciais, ampliando o acesso à boa educação.
Além das escolas, Belo Horizonte concentra, ainda, a maior parte das atividades culturais, serviços, comércio, tecnologia e, como consequência, os empregos e oportunidades de negócio da região metropolitana.
A Comissão Europeia concluiu, em 2017, no painel Cidades Como Centros de Inovação, que "as cidades são, frequentemente, locais de grande energia e otimismo. É onde a maioria de nós escolhe viver, trabalhar e interagir com outras pessoas. Como resultado, as cidades são o local onde a inovação acontece, onde as ideias são formadas, das quais o crescimento econômico decorre em grande parte.” Nada faz mais sentido do que concentrar o máximo de pessoas morando num mesmo município.
A concentração (mesmo quando de baixa qualidade) permite que as pessoas tenham acesso à melhor educação, e concentra investimentos em infraestrutura, transporte e segurança pública, zeladoria e equipamentos de lazer. Torna a educação e as atividades culturais acessíveis a mais pessoas, e incrementa todos os negócios, serviços e comércio locais.
- Morrendo aos poucos: como as cidades escolhem pular no buraco
Voltando a Pierre Bourdieu, uma cidade densa e compacta disponibiliza a chance de que todos os seus cidadãos adquiram um capital cultural que, no decorrer de suas vidas, lhes propiciará os capitais social e econômico, estejam onde estiverem.
Quem já desvendou o segredo de alguma mágica, conhece aquela surpresa, quase decepcionante, do quão óbvio e simples era o truque. E o truque, aqui, é igualmente simples de entender: o bem estar europeu não vem do petróleo ou de de riquezas minerais; vem da cidadania e da disposição para enfrentar desafios, qualquer que seja ele, com altivez, com urbanidade, sem retrocessos. Esse é o capital cultural.
Cidades são, em última instância, não apenas o motor da inovação e da vitalidade mas também da oportunidade, do crescimento pessoal e do desenvolvimento social.