Plínio Barreto, Salomé, Felício Brandi, Pablito, Roberto Batata, Niginho Fantoni e Zé Carlos. Além da obviedade por terem sido cruzeirenses apaixonados, todos carregam uma segunda marca em comum: a de só terem recebido justas homenagens por suas dedicações (no caso, ao Cruzeiro Esporte Clube) depois do ostracismo, da aposentadoria ou mesmo da morte, fosse ela trágica ou inesperada.
Mudar essa cultura de adiar reconhecimentos, de desdém aos mais velhos ou de desprezo pela história dos anônimos é praticamente impossível devido à natureza humana do imediatismo e do individualismo. Porém, alguns gatilhos históricos nos possibilitam contrariar essa vergonhosa sina da sociedade brasileira. A passagem do Centenário do único gigante de Minas Gerais é uma dessas janelas de oportunidade, das quais, nós, cruzeirenses, não devemos abrir mão.
Na semana passada, assistimos a uma emocionante movimentação da torcida cruzeirense pela dolorosa perda de um grande patrimônio da arquibancada. Pablito virou pintura de muro no Barro Preto e se tornará bandeira no estádio. Exatamente ele, que, em vida, fazia questão de dizer um “muito obrigado” a qualquer pessoa, fosse anônima ou famosa, que dissesse amar o clube azul estrelado. Uma gratidão pura e gratuita que a maioria dos jogadores (medalhões ou pratas da casa) e diretorias (velha guarda ou startapianas) quase nunca demonstram fora dos holofotes ou das redes sociais.
A homenagem prestada a Pablito também fez relembrar o quanto choramos pela morte da maior torcedora de futebol do mundo, Maria Salomé da Silva, assassinada por desgosto, em 2019. Se em vida foi tantas vezes desprezada, hoje ela é idolatrada.
A história de Pablito e Salomé também nos faz pensar no quanto o Cruzeiro, e mesmo nós, torcedores, poderíamos ter rendido mais tributos “em vida” a ícones como Felício Brandi, Zé Carlos, Geraldo II, Piorra, Ninão e Niginho Fantoni. Assim como faltou dar as devidas páginas heroicas e imortais para os geniais Tolentino Miraglia, Jadir Ambrósio e Aldair Pinto, nossos mestres musicais de hinos e charangas.
Mas como disse no preâmbulo desses rabiscos, ainda é tempo de se aproveitar o marco do Centenário para não repetirmos os erros do passado. Agradecer aos familiares de precursores italianos e dos guerreiros dos tempos difíceis dos anos de 1950. Assim, celebrar os jogadores e torcedores que seguraram as pontas na década de 1980. Ou mesmo valorizar profissionalmente funcionários, que por amor são guardiões de nossa história, como a doce Joanita Souza da Silva.
Em especial, um desses personagens do dia a dia do Cruzeiro deveria estar sendo exaltado incessantemente. Trata-se do narrador de futebol do planeta: Alberto “Vibrante” Rodrigues.
Sou da leva de alguns milhões de torcedores que cresceram sem poder ver o escrete periodicamente no estádio ou na TV. No interior do meu passado, a imagem do jogo, o gol simples ou a emoção do golaço chegavam ao ouvido pela voz do “Mais Vibrante do Brasil”. Em quase 60 anos de narração, ele construiu em nosso imaginário mais de 4 mil gols do Cruzeiro. Graças a esse monstro sagrado do rádio brasileiro, para mim e para milhares de cruzeirenses o futebol nasceu tendo som, poesia e alma.
Recentemente, numa resenha de pré-produção para um filme documentário, José Silvério, um dos maiores radialistas do país, adorado por diversas torcidas do Rio de Janeiro e de São Paulo e referência para centenas de profissionais da crônica esportiva, soltou: “Sabia que comecei no rádio em Belo Horizonte”?
Diante da resposta negativa e curiosa, emendou: “E devo a minha carreira a uma pessoa que, lá no meu início, me estendeu a mão. É o Alberto Rodrigues, a voz do Cruzeiro. Vocês devem ser gratos a ele, não é”?
Passou da hora de a instituição Cruzeiro, dos veículos de imprensa, da crônica esportiva mineira e de nós, cruzeirenses, rendermos um tributo de forma notável – e numa alegria incontida – à voz dessa história centenária.