O lindo do inverno rigoroso é o tom de azul celeste - vivo e compacto - a tomar conta do céu nas suas manhãs ensolaradas. Esse resplendor beirando o divino, por si só, é capaz de gerar alegria num simples contemplar. Em contraponto ao baixo astral do cinzento das nuvens pretas e brancas.
Preâmbulo feito, sou tomado pela tranquilidade de um multicampeão para descrever a manhã do último domingo, moldura do embate entre Cruzeiro e Sampaio Corrêa, como sendo uma das mais alegres da história de Belo Horizonte.
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Mas no último domingo, como num passe de mágica vindo no sopro do vento frio, ao adentrarem o estádio, eles deixaram de ser crianças. Transformaram-se em gigantes.
Foi preciso, pois logo perceberam seus pais, mães e avós se converterem em meninas e meninos, tamanha era a euforia pueril por estarem ali com seus rebentos, no instante de retomada do Cruzeiro, revivendo assim seus próprios tempos de criança.
Parei num canto estratégico para a contemplação. Postei o olhar de forma a dividir a atenção entre os lances do escrete encardido do Pezzolano (como chamamos os times pegadores e "chatos" lá na minha Mariana) e as trocas de carinho e cuidado entre os novos gigantes e os velhos meninos.
Bola em jogo. A cada mordida certeira do Lucas Oliveira para roubar a bola do adversário, o pequeno gigante Bernardo – com a sua fita na testa, a la Renato e Roberto Gaúcho – dava uma bocada eufórica no pacote de pipoca. Era seu jeito de divertir o Vovô Fernando e o Papai Leandrinho, reduzindo a tensão de seus velhos meninos.
A sequência de dribles e passes rasteiros de Jajá para dentro da área, na tentativa de encontrar alguém para empurrar a bola para o fundo das redes, deixava todos aflitos pela abertura do placar.
O pequeno gigante Dieguito, sabidamente, usava da artimanha de esticar os pezinhos no alambrado para serem carinhosamente tocado pelo Raposão e pelo Raposinha. O Papai Bruno, então, chorava e ria como um menino.
Quando Rafa Silva invadiu a área e finalmente fez explodir o Mineirão lotado - 1 a 0, Wilder, o Nem do Rato, lenda do futebol amador de Belo Vale, comemorou como se fosse ele menino e autor do tento.
Seu pequeno gigante, Mateus, pulou em seu colo e lhe conteve com um abraço dos mais gostoso do universo.
Faltava o gol do Edu. "Ele vai fazer daqui a oito minutos." Sussurrou uma voz conhecida da torcida, em meio aos milhares de tenores da orquestra a cantar incessantemente nas arquibancadas.
Gol. 2 a 0. Edu. Explosão! O menino e papai Gleyson Lage, autor daquela profecia, olhava para o azul do céu de inverno. A sua pequena gigante Nina lhe protegia num abraço de profundo amor.
Até o Mineirão, velho gigante – da Pampulha – por natureza, pulsava. Vivo. Ressoava os cânticos de uma multidão de quase 60.000 apaixonados. Seus arcos de concreto, com detalhes pontiagudos, pareciam enormes mãos dadas, a circundar um tapete verde e encantado.
Veio o apito final. Tudo girou como numa enorme ciranda de roda. Foi quando o Mineirão virou menino. Rodava. Dava gargalhadas à medida que, por seus poros, os torcedores, com vestes azuis e brancas, iam saindo, como se lhe fizessem cócegas.
Como cirandeiros, eles se dançavam pela esplanada. Foram ganhando as avenidas. A cidade já não sentia mais frio. Foi se esquentando na alegria deles. No azul deles. No ensolarado deles. Na vitória deles.
Cantavam, se abraçavam. Jogavam a blusa para longe. Não havia inverno rigoroso, cinzento, de preto e branco mal humorado capaz de sufocar o calor gostoso do coração feliz dos cruzeirenses. Fossem eles gigantes ou meninos.