O nosso pão voltou a cair com a manteiga para cima. A expressão popular para exaltar o fim de uma sequência de desventuras resume bem o momento vivido por nós, cruzeirenses. Sinaliza a real possibilidade de caminharmos firmemente para mais uma superação na história centenária do Palestra/Cruzeiro. E se na noite de hoje voltaremos a transformar o Mineirão num céu azul estrelado, em busca da vitória sobre o CRB, para o próximo domingo, quando enfrentaremos o Vasco no Maracanã, teremos uma missão histórica. Colocar fim a um miolo de pão – sem manteiga – engasgado há 48 anos.
No dia 10 de agosto de 1974, a partir de um dos maiores assaltos da história do futebol brasileiro, fomos derrotados pelo mesmo Vasco, por 2 a 1, e o título do Campeonato Brasileiro nos foi roubado. Desde então, ainda não conseguimos nos vingar (esportivamente) do time da Cruz de Malta no mesmo Maracanã.
Já nos enfrentamos (e vencemos a maioria dos confrontos) em diversos estádios. De São Januário ao Raulino de Oliveira, em Volta Redonda. Do Mané Garrincha, em Brasília, ao Morenão, em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul. Aplicamos sonoras goleadas, como o 6 a 2 da Copa do Brasil de 1996, em pleno São Januário. Mas também tivemos amargos momentos, como a desclassificação nas semifinais do Brasileiro de 2000, dentro do Mineirão.
Mas certo é que, nesse quase meio século após o roubo de 1974, foram apenas três confrontos no Maracanã, todos empatados: 0 a 0, pelos Brasileiros de 1983 e 1986, e 1 a 1, pela Copa do Brasil, em 1993.
Alguém dirá: “Ah, na verdade, não perdemos para eles no Maracanã há 48 anos.” Pois tente usar esse argumento para acalmar a raiva represada dos cruzeirenses que vivenciaram intensamente aquele assalto “a apito armado” de 1974.
O Cruzeiro havia chegado ao quadrangular em crise financeira, com salários atrasados e jogadores com contratos vencidos. Mas, em campo, se superava e mostrava o quanto estava tecnicamente muito à frente de seus adversários, no caso, Santos, Internacional e Vasco.
Na penúltima rodada, no Mineirão, bastava uma vitória contra o time carioca para chegar à partida derradeira contra o Santos podendo ser campeão com apenas um empate. Jogo truncado, 1 a 1 até o pênalti cometido por Joel em Palhinha. Porém, o árbitro Sebastião Rufino simplesmente ignorou o óbvio. Não anotou a irregularidade.
Briga, revolta, confissão do zagueiro vascaíno. Nada adiantou.
Vencemos o Santos, mas como os cariocas também marcaram pontos na última rodada, foi preciso uma partida extra entre Cruzeiro e Vasco. Nova polêmica: jogo em Belo Horizonte ou no Rio de Janeiro? Passividade da diretoria cruzeirense e um general da ditadura militar vascaíno à frente da CBD.
Nas arquibancadas do Maracanã, 112.933 torcedores. Em campo, tínhamos uma máquina de jogar futebol: Vitor; Nelinho, Perfumo, Darci e Vanderlei; Piazza, Zé Carlos, Dirceu Lopes; Roberto Batata, Palhinha e Eduardo “Rabo de Vaca”, com Joãozinho ainda no banco.
O árbitro era o carioca Armando Marques. Desastre anunciado. Ademir abriu o placar para o Vasco. Nelinho nos deu o empate. Jorginho Carvoeiro voltou a colocar o Vasco à frente. Foi quando veio o assalto. Cruzamento da linha de fundo e Zé Carlos cabeceia para empatar. Armando Marques conseguiu ver impedimento na bola vinda quase da linha final do gramado. Seu apito deu o título brasileiro de 1974 ao time carioca (como ele).
Domingo, voltaremos ao Maracanã para enfrentar o mesmo Vasco. Não valerá título algum. Mas uma vitória pode ser o pagamento moral de uma dívida de 48 anos. Três pontos no maior estádio do mundo, lotado, como já se sabe, que será mais um passo na direção da maior superação de nossa centenária história, entoada em cântico pela TFC, a torcida que mais canta no Brasil: “Vamos, Vamos Cruzeiro! Vamos lutar! Vamos jogar com raça, sair dessa desgraça e voltar para a Série A.”