“Fabrício, guerreiro! Fabrício, guerreiro!” Na cabeça do fotógrafo Rodrigo Mendes ressoava o cântico criado para o volante, recém-contratado junto ao Jubilo Iwata, do Japão e que, rapidamente, caiu nas graças da torcida cruzeirense, em 2008, por sua liderança e entrega em campo. Por outro lado, ele tinha a missão de fazer a foto de um“guerreiro” para a capa da Revista do Cruzeiro, mas Fabrício se mantinha preso à timidez frente à câmera, sem conseguir incorporar o personagem.
“Pensa no Danilinho (então atacante do Atlético de Lourdes) para ter raiva.” Foi aprimeira tentativa. Fabrício soltou um sorriso sarcástico e respondeu: “Ahdanilinho!?!? Pede uma coisa menos fraca.”
Gelo quebrado, o fotógrafo, metaleiro de coração e tatuagens, sugeriu que Fabrícioescolhesse uma música para relaxar durante o ensaio fotográfico. Quando esperavapor um Pagode ou, no máximo, um Rap, veio a surpresa: “Opa, mano! Então, coloca qualquer uma do AC/DC.”
Ao som da lendária banda de heavy metal australiana, Fabrício incorpou o título lhedando pela Nação Azul. Rodrigo Mendes conseguiu a foto de um Fabrício “Guerreiro”para a capa da edição 93 da Revista do Cruzeiro.
Desde a década de 1970, quando se popularizaram as concentrações pré-jogos, amúsica – ao lado do carteado e do bilhar – era um dos principais passatempos dosjogadores de futebol. Na preparação para a Copa do Mundo de 1970, o cantor WilsonSimonal, maior ídolo da MPB naquele ano, integrou a concentração da SeleçãoBrasileira no México.
Mas desde aquela época até o final da década de 1980, o Samba era o ritmo oficial dosboleiros. Não por menos, as carreiras de sambista e jogador de futebol eram tidascomo “marginais”.
Muitos ídolos, como Pelé e o lateral Júnior, chegaram a gravar sambas. No Cruzeiro, aofinal da década de 1980, o praiano Balu, sambista raiz, comandava as concentraçõescom suas rodas de “malandragem”.
Veio a década de 1990 e, com o estouro de sucesso do grupo Racionais MC’s, naperiferia de São Paulo, o Samba passou a dividir a preferência dos jogadores com oRap.
No início dos anos 2000, duas febres musicais derrubaram de vez o reinado do Samba:o Sertanejo e o Axé. Porém, junto desses novos ritmos brasileiros, também surgiu umavariação avassaladora do Samba: o Pagode.
Até hoje, esse é o ritmo dominante nas concentrações, nos ônibus a caminho doestádio e nos vestiários. Ainda há espaço para os amantes do Rap, do Sertanejo, do Axé e da nova onda da música Gospel, mas, de longe, o Pagode continua soberano noshits dos boleiros brasileiros.
Por isso, houve tanto espanto da imprensa e alvoroço dos roqueiros quando o nossonovo matador, Gilberto, filho do sertão nordestino, não optou pelo Pagode ou algum ritmo regional para celebrar seus três gols contra o Villa Nova, mas sim, pelo clássico “Back in Black” do AC/DC, assim como fez Fabrício, 15 anos atrás.
A magia não para por aí. Existe uma simbologia perfeita entre o momento do Cruzeiro e um trecho da música escolhida por “Gil Metalzeiro”, que, talvez, nem ele mesmosaiba:
“Fiquei longe por muito tempo, estou feliz por estar de volta/Sim, estou livre da forca/Que me manteve pendurado até agora/Estou só olhando para o céu porque ele está me deixando feliz/Esqueça o velório porque nunca morrerei/Tenho nove vidas, olhos de gato/Abusando de cada uma delas e sendo selvagem/Porque estou de voltaSim, eu voltei”
Se rabiscar uma crônica me desse o direito de pedir uma música, hoje, eu voltaria aoritmo precursor entre os boleiros – o Samba – e pediria “Zé do Caroço”, de LeciBrandão. Faria do seu refrão – “está nascendo um novo líder” – prenúncio para o papel que “Gil Metalzeiro” irá assumir nessa temporada de tantos espinhos que nos espera.E que ele se inspire no maior líder metaleiro que já tivemos, Fabrício “Guerreiro”.
* Deixo o meu salve aos meus amigos e guerreiros da arquibancada, Ricardo“Cavera” e Rodrigo Mendes, por me ajudarem a encontrar o ritmo dessa crônica.