“O maior patrimônio do Cruzeiro é sua torcida”. Lancei essa máxima ainda antes do desastre de 2019, quando a organização criminosa da gestão Wagner Nonato Machado Pires de Sá “assassinou por desgosto” a maior torcedora do mundo, Maria Salomé.
Desde então, muitas outras vozes da arquibancada, da crônica esportiva e do próprio clube definiram a Nação Azul como principal fator para o gigantismo do time celeste.
Veio a pandemia de COVID-19. Sem a torcida nas arquibancadas, sucumbimos nos dois primeiros anos na divisão de acesso. Ela voltou em 2022 e ali empurrou nosso escrete até o fim do pesadelo. Definitivamente, a China Azul reafirmava o seu posto de maior patrimônio do clube.
Hoje, um novo capítulo da relação torcida/instituição começa ser escrito. Tomam posse os membros do recém-criado Comitê de Torcedores.
O anúncio do Comitê veio em março para aplacar a justa ira da Nação Azul sobre a absurda decisão da SAF de “branquear” os mascotes Raposão e Raposinha. Cheguei a questionar se tudo não passaria de uma cortina de fumaça para gerenciar aquela crise. Hoje, com satisfação, testemunho que minhas suspeitas não se concretizaram – ainda bem e parabéns aos envolvidos. O Comitê dos Torcedores não ficou só no discurso.
Importante dizer que essa iniciativa não é inédita na história do Cruzeiro. No início dos anos de 1980, a então relações públicas do clube, Ângela Azevedo, e representantes da torcida criaram a Astoca (Associação das Torcidas Organizadas do Cruzeiro). A entidade se reunia regularmente dentro da sede social do Barro Preto; tinha voz ativa na gestão de Benito Masci e agia concretamente para manter a torcida cruzeirense como a maior de Minas Gerais, mesmo durante um período crítico de penúria desportiva e financeira.
Graças à mobilização da Astoca, por exemplo, no dia 8 de novembro de 1981, o Cruzeiro venceu o “Desafio das Torcidas” proposto pela administração do Mineirão. Também foi ela que promoveu, na mesma década, o replantio das árvores do entorno do estádio, completamente destruídas pelos “filhinhos de papai” da Turma do Sapatênis, revoltados após uma derrota do Atlético de Lourdes.
Relembro a precursora Astoca para desejar que o Comitê de Torcedores realmente não se restrinja à prestação de contas daquele lamentável episódio do Raposão. Nomes qualificados para isso, ele possui.
Dentro os escolhidos estão dois monstros sagrados das arquibancadas, pelos quais nutro carinho profundo: a lenda viva Cristiano “Maranguape”, meu companheiro dos tempos de AGC, e o mestre Wilder “Nem do Rato”, torcedor interiorano, como eu.
Dos grotões mineiros veem outros importantes integrantes. Da cidade de Ipanema, Victor Carvalho, um dos coordenadores do projeto que mais amo nessa minha vida de cruzeirense, os Redutos Celestes. E de Conselheiro Lafaiete, Karina Dornelas, uma militante de causas importantíssimas, como os direitos das pessoas autistas.
A escolha do ídolo Nonato, companheiro de prosas e bares, por sua simplicidade e amor incondicional pelo Cruzeiro, foi um gol de placa.
Já Ronan Almeida, por seu tom conciliador, traz o respeito do caldeirão das torcidas organizadas, essas que são o pulmão celeste.
Por méritos, Aline Pereira Silva, Alysson Caires e Clémenceau Chiabi Saliba Jr. completam esse escrete, juntamente com membros da SAF Cruzeiro.
Em se tratando de futebol, consenso é algo utópico; e certo que a formação do Comitê jamais agradaria a todos, fosse essa ou outra qualquer. No meu caso, por exemplo, tenho restrições ao privilégio dado a algumas categorias, como os Sócios Diamante, em detrimentos aos demais sócios torcedores, mas nada que me impeça de elogiar a concretização dessa iniciativa.
Temos assuntos importantes que há anos são negligenciados pela instituição (Associação e SAF), como a valorização aos torcedores do interior e de outros estados; a salvaguarda e promoção da história do clube e a não elitização do futebol. Enfim, parafraseando a Torcida TFC, espero que o Comitê dos Torcedores tenha voz e que do seu canto, saiam gols.