Sandra Laucas é uma das grandes figuras da capital mineira. Numa época em que a palavra empreendedorismo nem estava no dicionário, ela, com muita força de vontade, conseguiu transformar a Cultura Inglesa – que começou no Consulado Britânico, no Edifício Guimarães, na Afonso Pena – em referência no ensino de inglês no estado. Hoje, são 16 escolas na capital, uma em Ipatinga e outra em Diamantina. Até chegar à direção da Cultura, Sandra foi um exemplo de dedicação. Imigrantes italianos, os pais dela, Epaminondas Serrano Pires e Lina Gauzzi Pires, não tinham condições de bancar os estudos de inglês dos sete filhos. Aos 13 anos, Sandra conseguiu a vaga de assistente de secretaria do consulado. Com parte do salário pagava os estudos. Mais tarde, tornou-se secretária do cônsul britânico Harold Walter.
Há 10 anos, com a proximidade da aposentadoria, Sandra foi transferindo aos poucos a direção da empresa aos filhos, Giuliano e Olavo. Passou a se dedicar às coisas de que mais gosta: os netos – Maria Clara, Eduardo, Valentina, Gabriel e Catarina – e viagens com as amigas.
Festeira, ela sempre fez questão de comemorar o aniversário. Não foi diferente em seus 77 anos. Ela cuidou de todos os detalhes da festa – da escolha do layout do convite à lista de convidados, passando pelos detalhes do bufê e da trilha sonora.
COM A PALAVRA
SANDRA LAUCAS
Aos 77 anos, qual foi a melhor lição que a vida lhe deu?
Devemos ter sempre alegria de viver e muito amor para dar às pessoas, respeitando seus valores e aptidões.
A senhora se considera uma das pioneiras do empreendedorismo em Minas Gerais?
Sim. Na minha época, a mulher não tinha espaço no mercado. Minha avó, Conceição Pires, foi uma grande inspiração. Ela era dona de uma escola preparatória para concursos públicos chamada Escola Darcy Vargas. Quando comecei na Cultura Inglesa, em 1961, a maioria das mulheres saía de casa para fazer trabalho coadjuvante. Levei um pouco da visão importante e cuidadosa da dona de casa para dentro da Cultura Inglesa. Assim, professores e recepcionistas trabalhavam melhor e os alunos se sentiam acolhidos. A mulher dá muito valor a seu espaço, asseado e devidamente organizado. A antiga filial da Cultura Inglesa na Avenida Carandaí, entre 1973 e 1980, era um exemplo de casa inglesa, com arte, tradição e cultura. Com muita paciência e dedicação, eu tentava treinar as pessoas com aquilo que tinha de melhor: fazíamos piqueniques e passeios com o objetivo de tornar os estudos mais interessantes e prazerosos; mantínhamos um freezer com picolés, onde sempre havia uma surpresa para os alunos. Lembro-me também de um fato divertido: os alunos adotavam nomes britânicos!
Voltando ao início da Cultura Inglesa em BH, a senhora imaginava que a empresa seria uma das escolas de inglês mais importantes do estado?
Na época, eu trabalhava para sobreviver. Nunca imaginei que a Cultura seria o que é hoje. Quando comecei na administração da Cultura Inglesa, a empresa devia ao INSS. O FGTS nunca havia sido recolhido. Consegui pagar tudo, a duras penas. Tornei-me diretora em 1977, fundei a Associação Brasileira de Culturas Inglesas (ABCI) e fui um dos membros fundadores da Latin American British Cultural Institutes (LABCI). Presidi essas duas instituições. Em 1990, trouxe oficialmente para o Brasil a English Speaking Union (ESU), que promove a difusão do conhecimento por meio da língua inglesa. Fico orgulhosa, pois posso dizer que esse trabalho foi reconhecido. Em 1989, tornei-me membro honorário do Império Britânico, honraria concedida pela rainha Elizabeth II em homenagem aos serviços prestados. Em 1994, recebi, em Ouro Preto, a Medalha da Inconfidência. Também tive o privilégio de me encontrar com Margaret Thatcher, príncipe Phillip, príncipe Charles, príncipe Harry e Camila Parker Bowles, entre outras personalidades britânicas.
A senhora fez questão de reunir a família e os amigos em seu aniversário de 77 anos. O que mais a emocionou no encontro?
Sempre gostei de comemorar meu aniversário. O que mais me emocionou foi ver tantos amigos e familiares reunidos, ver os médicos que cuidam e cuidaram de mim, os funcionários atuais da Cultura e os que já se aposentaram, grandes amigos meus.
Como a senhora vê o trabalho de seus filhos Olavo e Giuliano à frente da Cultura Inglesa? Foi preciso muito puxão de orelha para que aprendessem a gerir o negócio?
Olavo se dedicou mais aos estudos, fez duas faculdades – de economia e direito na PUC –, tem MBA na Fundação Getúlio Vargas e pós-graduação na UFMG. Já o Giuliano, apesar de ter estudado, é empreendedor nato, assim como eu. Sempre os ensinei a enxergar oportunidades em todos os momentos, inclusive nos momentos de crise. Isso eles aprenderam comigo.
Qual é a sua definição para o professor, profissional que não tem o reconhecimento merecido?
O professor deve ser sempre valorizado e respeitado. Como também fui professora, na Cultura nós sempre os valorizamos e os remuneramos bem. Além disso, sempre exigi deles estarem atualizados através de cursos e seminários. Em julho, grande parte de nossos professores esteve em um congresso no Chile. Infelizmente, professores não têm o devido reconhecimento no Brasil. De minha parte, sempre tentei manter o ambiente animado e com muitos recursos para que eles se sentissem motivados. Em cada filial, valorizei as bibliotecas, ricas e cheias de materiais. Assinávamos um grande número de revistas inglesas e americanas, que faziam enorme sucesso na época em que não havia internet.
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