Diário da quarentena
Na linha de frente
Breno de Mello Vitor
Oftalmologista
Festas e fogos foram o prenúncio de um 2020 cheio de oportunidades.
As notícias sobre o coronavírus começaram a circular na mídia, mas parecia algo tão distante... Aquele pensamento brasileiro – somos mais abençoados do que os demais – tomava conta do país.
Minha agenda profissional a pleno vapor, com cirurgias, atendimentos e, claro, encontros com os amigos. Tudo na maior tranquilidade. Até que, em março, um agente invisível me tirou da zona de conforto.
O coronavírus chegou...
Por causa dele, em pouco mais de 36 horas cancelei procedimentos de rotina, reuniões, estudos. Foi preciso definir o fechamento ou não de parte do hospital do qual sou um dos diretores. Novos protocolos se tornaram urgentes, viraram rotina. O encontro com a nova realidade me fez sentir em um filme hollywoodiano, usando capote, óculos, máscara e gorro para atender o paciente em quarentena. Universo comum aos infectologistas, eu sou oftalmologista. Mas todo cuidado vale, especialmente no caso de um vírus facilmente transmissível.
Firme, sempre lembrando o juramento feito na formatura em medicina, supero medos, inseguranças e, com serenidade, sigo para meus plantões e atendimentos, que agora têm outro nível de exigência.
O frio na barriga existe. Não há como negar! Mas vamos utilizando estratégias de controle emocional de forma a seguir com a nossa missão. Atualmente, tenho atendido somente urgências, e meu tempo livre aumentou. Li quatro livros em menos de 10 dias. Há anos não fazia isso. Bons autores conseguem nos levar para outra realidade, confortando a mente e alimentado a alma. Restante do tempo dividido entre Netflix, lives médicas e sertanejas, farra virtual com amigos. Foi diferente para nós, acostumados a encontros nas baladas quase sempre lotadas, mas deu um alento.
Há poucos dias, comemorei meu primeiro aniversário isolado, com meus pais, em casa. Um bolo surpresa deles foi o auge da festa aparentemente simples, que me deixou muito feliz.
Não deixo de pensar também na crise econômica e nos que estão à margem do sistema. De alguma forma, tento colaborar e minimizar o sofrimento de alguns. Tenho esperança de que sairemos desta mais fortes, mas, por incrível que pareça (rs...rs), quero a minha rotina de volta.