Animação nunca faltou às pistas de Belo Horizonte. Se nos anos 2000 a balada pegava fogo depois da meia-noite, na década de 1980 o fervo reaquecia às três da madrugada. Era assim na Tom Marrom, boate que atravessou três décadas de história na vida noturna da capital, funcionando na Rua dos Inconfidentes, entre a Rua Alagoas e a Avenida Cristóvão Colombo, na Savassi.
O público, que lotava a casa de quarta a sábado, já sabia: todos os dias, às três da madrugada, o repertório disco, sucesso da época, seria substituído durante alguns minutos pela versão clássica de “New York, New York” na voz de Frank Sinatra. Era o momento romântico da noite, com casais dançando coladinhos. Ao acorde final da canção, a pistava voltava a bombar.
Detalhe: ao contrário dos frequentadores das boates nos anos 2000, o público chegava cedo à Tom Marrom, às 21h. Ou seja, seis horas depois, a animação parecia não ter fim. “A casa só fechava quando o último cliente fosse embora”, relembra o DJ Amauri Campos (@amauricamposdj), que começou por lá aos 14 anos. Hoje, aos 53, depois de passar por outros empreendimentos da noite, ele continua em atividade.
Frank Sinatra era um dos preferidos do público, mas Amauri cita vários sucessos daquelas noites. Não podiam faltar Barry White (“Can't get enough of your love, baby”), Kool & The Gang (“Celebration”), George Benson (“Give me the night”), Michael Jackson (“Don't stop'till you get enough”), Chaka Khan (“I feel for you”), Grace Jones (“La vie en rose”), Billy Paul (“Your song”), Santa Esmeralda (“Don't let me be misunderstood”), Stevie Wonder (“Isn't she lovely”), Earth, Wind & Fire (“Let's groove”) e Evelyn Champagne King (“Shame”).
Amauri começou como ajudante de garçom na Tom Marrom. Conta que fez amizade com os DJs da época e aprendeu com eles os caminhos para se tornar disc jockey. Foi com Marquinho que mostrou que dava conta do recado até ser chamado para substituir Eduardo, que fazia dupla com Marquinho.
A Tom Marrom nasceu em junho de 1978, sob a direção dos irmãos Sérgio e Maurício Lopes, com projeto arquitetônico assinado por Freusa Zechmeister. Foi por causa das cores da casa que o nome surgiu. Sérgio Lopes revela que, durante uma reunião com a arquiteta, o irmão e o programador visual quiseram saber por que a boate foi pintada de marrom. “Como estávamos em busca do nome para o registro, alguém gritou: 'Por que não Tom Marrom?' A aceitação foi unânime e a boate um sucesso”, recorda Sérgio.
Nos primeiros anos, o sucesso foi tanto que reservas de mesas eram feitas com um mês de antecedência. A Tom Marrom se tornou parada obrigatória de artistas e celebridades em Belo Horizonte, como Pelé, por exemplo. A casa também mudou os costumes da cidade, levando festas de 15 anos para a pista das boates. O tempo passou, os ritmos mudaram, a Tom Marrom tentou se adequar, mas, com o crescimento do sertanejo, fechou as portas nos anos 1990. No mesmo endereço, hoje funciona a Church, que nada tem a ver com a histórica casa noturna de BH.
Os fãs da boate já se reencontraram em duas edições do “Remember Tom Marrom”, no Automóvel Clube, organizadas por Sérgio Lopes e Claudia Recchioni. “Foi uma época primorosa”, garante Sérgio.