Ano começou e, com ele, a agenda de 2023. No audiovisual, o calendário será aberto com a 26ª edição da Mostra de Cinema de Tiradentes, de 20 a 28 de janeiro. A seleção inclui 134 filmes – longas, médias e curtas – em pré-estreias e mostras temáticas, de 18 estados brasileiros. "Trata-se de um empreendimento audiovisual de Minas Gerais para o Brasil e o mundo, que reúne as manifestações da arte numa programação cultural abrangente oferecida gratuitamente ao público", resume Raquel Hallak, coordenadora-geral da Mostra.
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Este ano serão homenageados Glenda Nicácio, de Poços de Caldas, e Ary Rosa, de Pouso Alegre, ambos radicados em Cachoeira (BA), desde 2010, onde fundaram a produtora Rosza Filmes.
O ano começa com um respiro de esperança especialmente para a cultura tão massacrada no governo anterior. Para você, quais são as atitudes de urgências do agora Ministério da Cultura para o fomento das artes em geral?
A primeira atitude é de reconstrução e resgate do Ministério da Cultura. A segunda de recuperar e recompor os impactos negativos e o desmonte sobre o orçamento destinado à pasta, às estruturas públicas, de gestão da cultura, o acesso e o exercício dos direitos culturais, e às atividades artísticas e dos trabalhadores da cultura.
E a terceira é uma ampla avaliação das políticas públicas que foram responsáveis por um rico ciclo da cultura. Rever a participação do setor cultural na economia brasileira, a participação de setores da sociedade nas políticas públicas.
Devolver o papel central da cultura como área fundamental de apoio e estímulo à diversidade de manifestações culturais do povo brasileiro, tanto como meio para assegurar o mais amplo acesso aos bens e serviços quanto de instrumento indispensável ao fomento da produção cultural e à promoção de uma economia da cultura, como estratégia fundamental de desenvolvimento social, humano e econômico para o país.
E a terceira é uma ampla avaliação das políticas públicas que foram responsáveis por um rico ciclo da cultura. Rever a participação do setor cultural na economia brasileira, a participação de setores da sociedade nas políticas públicas.
Devolver o papel central da cultura como área fundamental de apoio e estímulo à diversidade de manifestações culturais do povo brasileiro, tanto como meio para assegurar o mais amplo acesso aos bens e serviços quanto de instrumento indispensável ao fomento da produção cultural e à promoção de uma economia da cultura, como estratégia fundamental de desenvolvimento social, humano e econômico para o país.
De onde surgiu a expressão “Cinema mutirão”?
“Cinema mutirão” é a temática adotada pela curadoria para a 26ª edição da Mostra. Ela responde aos últimos três anos, quando a pandemia de COVID-19 e os desarranjos anticulturais do governo federal afetaram drasticamente a economia criativa no país. A 26ª Mostra de Tiradentes traz a questão à tona não pelo viés do lamento, e sim da ideia de “Cinema mutirão”, que caracterizou o período e manteve continuidade de produção, ainda que frágil, porém sempre constante.
O conceito de “Cinema mutirão” tem por objetivo chamar para o debate todos aqueles e aquelas que queiram colaborar para construir uma base sólida para a construção e reconstrução do audiovisual brasileiro. O cenário dramático dos últimos cinco a seis anos não impediu a resiliência de quem buscou alternativas à sobrevivência e procurou não abrir mão das suas conquistas anteriores, ainda que insuficientes ou ameaçadas.
Muitos grupos de lugares diferentes e de campos artísticos distintos (dança, música e teatro) se uniram para fazer audiovisual com os recursos dos editais emergenciais da Lei Aldir Blanc, que, no seu caráter abrangente e flexível, trouxe algumas inovações nas obras, na forma de mobilização do setor e na elaboração de uma política pública em contexto adverso.
O conceito de “Cinema mutirão” tem por objetivo chamar para o debate todos aqueles e aquelas que queiram colaborar para construir uma base sólida para a construção e reconstrução do audiovisual brasileiro. O cenário dramático dos últimos cinco a seis anos não impediu a resiliência de quem buscou alternativas à sobrevivência e procurou não abrir mão das suas conquistas anteriores, ainda que insuficientes ou ameaçadas.
Muitos grupos de lugares diferentes e de campos artísticos distintos (dança, música e teatro) se uniram para fazer audiovisual com os recursos dos editais emergenciais da Lei Aldir Blanc, que, no seu caráter abrangente e flexível, trouxe algumas inovações nas obras, na forma de mobilização do setor e na elaboração de uma política pública em contexto adverso.
Qual a importância de Ary Rosa e Glenda Nicácio, homenageados deste ano, na construção da linguagem do audiovisual brasileiro?
Eles representam a temática desta edição "Cinema mutirão". A homenagem a Ary Rosa e Glenda Nicácio é também estendida à Rosza Filmes e resulta dos bons frutos de uma política de descentralização de recursos ao audiovisual promovida na década de 2000 e parte da década de 2010.
Aproveitando-se do bom momento, a dupla de realizadores se insere ainda num cenário de emergência de universidades e da invenção de modos de produção e trabalho pensados e praticados numa hierarquia mais fluida e menos fixada na figura de diretores-autores.
A valorização da cocriação se torna fundamental no processo, algo também presente em diversos filmes, coletivos e cineastas de regiões e quebradas que apontam a superação do industrialismo decadente e impessoal que até então dominava o audiovisual no país. Prolíficos, Glenda e Ary assinaram a direção conjunta de cinco longas-metragens em cinco anos: “Café com canela” (2017), “Ilha” (2018), “Até o fim” (2020), “Voltei!” (2021), “Mugunzá” (2022) e “Na rédea curta” (2022).
Glenda ainda dirigiu um projeto solo, o média-metragem “Eu não ando só” (2021). A singularidade do trabalho de Ary Rosa e Glenda Nicácio é um esforço coletivo a somar as pequenas diferenças em um território comum que é a região de efusiva cultura negra nas cidades de Cachoeira, São Félix e Muritiba.
Aproveitando-se do bom momento, a dupla de realizadores se insere ainda num cenário de emergência de universidades e da invenção de modos de produção e trabalho pensados e praticados numa hierarquia mais fluida e menos fixada na figura de diretores-autores.
A valorização da cocriação se torna fundamental no processo, algo também presente em diversos filmes, coletivos e cineastas de regiões e quebradas que apontam a superação do industrialismo decadente e impessoal que até então dominava o audiovisual no país. Prolíficos, Glenda e Ary assinaram a direção conjunta de cinco longas-metragens em cinco anos: “Café com canela” (2017), “Ilha” (2018), “Até o fim” (2020), “Voltei!” (2021), “Mugunzá” (2022) e “Na rédea curta” (2022).
Glenda ainda dirigiu um projeto solo, o média-metragem “Eu não ando só” (2021). A singularidade do trabalho de Ary Rosa e Glenda Nicácio é um esforço coletivo a somar as pequenas diferenças em um território comum que é a região de efusiva cultura negra nas cidades de Cachoeira, São Félix e Muritiba.
Como foi chegar à Mostra Aurora?
A Mostra Aurora foi criada em 2008, por uma iniciativa do curador Cleber Eduardo e abraçada de imediato pela coordenação da Mostra de Cinema de Tiradentes diante do cenário que se colocava no processo de inscrições de filmes, em que já apontava para uma mudança na produção cinematográfica brasileira provocada pela era digital, que fez surgir expressivo volume de filmes de baixíssimo orçamento, realizados às margens dos editais públicos, com formas e estilos libertos das gramáticas da média do cinema autoral brasileiro em circulação pelos principais festivais brasileiros e internacionais.
Foi pensada para ser a mostra competitiva de Tiradentes como estímulo a uma produção de realizadores em início de carreira ( até três longas), para dar visibilidade às produções de estreantes..
Foi pensada para ser a mostra competitiva de Tiradentes como estímulo a uma produção de realizadores em início de carreira ( até três longas), para dar visibilidade às produções de estreantes..
São 26 anos de festival. De bate-pronto, quais os maiores perrengues e as maiores alegrias?
Olhando desde o início e prestes a comemorar 26 anos de existência podemos afirmar que a Mostra de Cinema de Tiradentes do ponto de vista da cidade foi o evento precursor da descoberta da vocação turística de Tiradentes, atraindo olhares, investimentos e exemplo para novas iniciativas de evento na cidade.
Do ponto de vista do audiovisual, tornou-se o maior evento do cinema brasileiro contemporâneo, um espaço rico e generoso de exibição, formação, apreensão e discussão do cinema brasileiro. Um trabalho coletivo, participativo, democrático, que sempre esteve à frente de seu tempo, atento às mudanças do audiovisual, seja do campo tecnológico, seja pelo lado de quem pensa, vê e faz cinema. No decorrer de sua trajetória, presenciou avanços, transformações e continuidades no cinema brasileiro. Viu as séries de televisão ocuparem o lugar antes do cinema.
E as telas de TV e dos computadores tornaram as superfícies da imersão em uma narrativa. Foi testemunha do surgimento de uma nova geração de realizadores e instrumento que favoreceu a visão de conjunto. Foi pioneira ao criar a Mostra Aurora, um recorte da programação que criou oportunidades para os diretores estreantes ganharem espaço na cena audiovisual brasileira e exibiu filmes instigantes e desafiadores, de baixíssimo orçamento, precários enquanto estrutura de existência, mas com senso de provocação, deslocamento dos sentidos e das sensações, de culto do enigma e do estranhamento.
Os perregues e desafios de toda edição são a busca desenfreada pelo patrocínio, pois o evento não tem receita e precisa de empresas patrocinadoras para sua realização e, mesmo com trajetória consolidada, precisa atuar ano a ano para assegurar sua realização.
Do ponto de vista do audiovisual, tornou-se o maior evento do cinema brasileiro contemporâneo, um espaço rico e generoso de exibição, formação, apreensão e discussão do cinema brasileiro. Um trabalho coletivo, participativo, democrático, que sempre esteve à frente de seu tempo, atento às mudanças do audiovisual, seja do campo tecnológico, seja pelo lado de quem pensa, vê e faz cinema. No decorrer de sua trajetória, presenciou avanços, transformações e continuidades no cinema brasileiro. Viu as séries de televisão ocuparem o lugar antes do cinema.
E as telas de TV e dos computadores tornaram as superfícies da imersão em uma narrativa. Foi testemunha do surgimento de uma nova geração de realizadores e instrumento que favoreceu a visão de conjunto. Foi pioneira ao criar a Mostra Aurora, um recorte da programação que criou oportunidades para os diretores estreantes ganharem espaço na cena audiovisual brasileira e exibiu filmes instigantes e desafiadores, de baixíssimo orçamento, precários enquanto estrutura de existência, mas com senso de provocação, deslocamento dos sentidos e das sensações, de culto do enigma e do estranhamento.
Os perregues e desafios de toda edição são a busca desenfreada pelo patrocínio, pois o evento não tem receita e precisa de empresas patrocinadoras para sua realização e, mesmo com trajetória consolidada, precisa atuar ano a ano para assegurar sua realização.