Toda estreia no cinema provoca burburinho. Afinal, são meses de dedicação de nossos diretores e atores preferidos a histórias que, de alguma forma, vão nos emocionar.
Agora, imagine quando o longa que chega à telona foi rodado no início da década de 2000 e ganhou apenas uma exibição há 10 anos?
Cena rara na história do audiovisual brasileiro, que jamais registrou demora tão grande para o lançamento de um filme, a sessão de “O homem de Lagoa Santa”, dirigido por Renato Menezes, vai marcar muita gente, especialmente o elenco.
“Finalmente, depois de 22 anos, vamos ver o filme no cinema”, comemora o ator Chico Aníbal, que interpreta o paleontólogo dinamarquês Peter Lund (1801-1880). Depois de sua primeira visita ao Brasil, o cientista se instalou em Lagoa Santa, onde morreu aos 79 anos.
O trabalho do dr. Lund era respeitado mundialmente, inclusive por cientistas como Charles Darwin.
O filme entra em cartaz na sala 1 do UNA Cine Belas Artes, às 19h de hoje. Chico considera o longa um divisor de águas em sua carreira. “Foi a partir dele que fiz trabalhos na televisão (o mais recente, uma participação na novela “Travessia”) e atuei em outros projetos no cinema como “Mão na luva” (2014), de Roberto Bontempo”, conta.
Amigo do diretor Renato Menezes, ele viu o filme pronto, há muito tempo. “É como se eu estivesse escavando uma gruta e retirando dela um tesouro”, compara.
Expectativa
Luiz Hippert, que faz o papel de Brandt, amigo de Lund, não esconde a emoção. “Minha expectativa é total. Foi o projeto mais legal de que participei. Estou louco para ver”, afirma o ator, feliz com o fato de a exibição ser realizada no UNA Cine Belas Artes.Hippert não seguiu carreira no cinema. “O homem de Lagoa Santa” é seu único trabalho no audiovisual e, por isso, vê-lo na sala de cinema torna o momento ainda mais emocionante.
O ator lembra a grandiosidade da produção, com locações em Lagoa Santa, nas grutas de Maquiné (em Cordisburgo) e Rei do Mato (em Sete Lagoas), além de Pedro Leopoldo, Matosinhos e Ouro Preto.
A primeira e única apresentação do filme foi feita, cheia de protocolos, para o príncipe herdeiro da Dinamarca, Frederik André Henrik Christian, e a princesa Mary Elizabeth, que foram a Lagoa Santa, há 10 anos, para a inauguração do Museu Peter Lund.
Produtora do longa, Lúcia Fares comemora o lançamento do filme, especialmente pelas agruras enfrentadas ao longo de duas décadas. Houve de tudo. Em um momento da finalização faltaram recursos, a parceria esperada com a Dinamarca não saiu do papel e houve problemas com a distribuidora Rio Filme na época.
O diretor Renato Menezes viu o longa pronto, mas morreu em 2014, vítima de câncer. Apesar de tantos percalços, Lúcia garante que o acabamento foi primoroso. “A direção de arte foi muito cuidadosa”, afirma. Ela cita a importância do paleontólogo mineiro Castor Cartelle, responsável pelo acompanhamento técnico e científico da produção.
A produtora destaca também a dedicação do elenco. Como o filme tem poucos diálogos, depende muito do trabalho dos atores. “No início, Renato queria que a história fosse narração em off, mas depois decidiu buscar um ator para contar a história do cientista bem-nascido que sai da Dinamarca para o interior do Brasil, onde faz descobertas e opta por viver em Lagoa Santa onde morreu.”
Lúcia conta que Silviano Santiago escreveu um texto depois de se debruçar sobre a vida de Lund. O áudio foi gravado por Marcos Caruso. “O filme está aí”, vibra.
No set com Renato Menezes
“O homem de Lagoa Santa” tem o carinho especial desta coluna, que visitou o set e conversou com o diretor. Renato Menezes contou que Peter Lund levou muito mais que conhecimento científico à cidade mineira. Filho de pais muito ricos, o dinamarquês doou o que pôde para a região.
“Ele criou uma banda de música, ensinava crianças a ler, atendia como médico a população carente”, rememorou.
Lund manteve intenso contato com pesquisadores de todo o mundo. Fato constatado em mais de duas mil cartas trocadas entre ele e cientistas. Em Lagoa Santa, recebeu visitas dos maiores naturalistas da época. “Charles Darwin, o criador da teoria da evolução, reconheceu o trabalho de Lund. Em uma de suas obras, fez referência às pesquisas em Lagoa Santa”, lembrou Menezes à “Hit”.
Prestigiado no meio científico, Lund não teve a mesma sorte com o grande público. “Esta história não pode morrer”, defendeu o diretor, que acreditava na importância de seu filme para divulgar o legado do cientista dinamarquês.