Não, este não é um texto filosófico. E tampouco científico. Estou lendo um livro que, em determinado momento, cita Dostoievsky: “Temo somente uma coisa: não ser digno do meu tormento”. Quando li esta citação, logo trouxe para a realidade que estamos vivendo há um ano. E se minha arrogância me permite parafraseá-lo, apenas colocaria a frase no plural, pois nosso tormento é coletivo. Tanto nos contaminados pelo vírus, quanto naqueles que veem seus empregos e negócios morrerem a cada dia. A cada nova onda da COVID-19, uma nova onda de desespero paira sobre nós. Entretanto, este também não é um texto de respostas, mas essencialmente de perguntas.
A OMT (Organização Mundial do Turismo) registrou o pior ano da história do turismo em 2020, com queda de 70% nos desembarques internacionais. 100 a 120 milhões de empregos diretos no turismo foram perdidos, a maioria em pequenas e médias empresas. O site Panrotas, dedicado ao setor, informa que o Brasil perdeu, em 2020, mais de 110 mil vagas de emprego no setor do turismo.
Segundo a pesquisadora da USP (Universidade de São Paulo), especialista em Turismo, professora dra Mariana Aldrigui as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Porto Alegre e Belo Horizonte, foram as que mais amargaram desempregados no turismo. A capital mineira foi responsável pela perda de 3.380 empregos diretos no setor, ou seja, sem contar o restante do estado. A Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) em Minas Gerais conta 30 mil empregos perdidos e 3,5 mil bares restaurantes fechados apenas em Belo Horizonte.
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Quem estuda e/ou trabalha com turismo está na vida a passeio, não é mesmo?! Sinto te decepcionar se você pensa assim, mas não. Quem trabalha com turismo não está a passeio, muito pelo contrário. É quando a grande maioria das pessoas estão relaxando e se divertindo, que estes profissionais estão lá, garantindo o seu lazer. Muitos deles, abrindo mão de finais de semana, feriados e verões consecutivos. Tal qual fazem outros profissionais como médicos, enfermeiros, policiais e bombeiros.
E não há mal nenhum nisso. Porque cada um é livre para escolher a profissão e a carreira que quer seguir, e quem trabalha com turismo, escolheu. Mas, quando se chega em um ponto onde sua família passa por sérias dificuldades, porque sua profissão não é essencial, a coisa complica. Pensando do outro lado, como consumidores, se o seu descanso, o seu relaxamento e o seu lazer não são essenciais, você deixou de viver. Apenas sobrevive.
O que quero dizer é que, essencial é uma palavra perigosa hoje em dia, pois é relativo. E relatividade, segundo Albert Einsten, é a constatação de que não existem valores universais e tudo passa a ser relativo do ponto de vista de cada um. Claro que tentei resumir e fui bem simplista nesse conceito tão amplo da Teoria da Relatividade. Mas o fato é, que se para você uma camareira na pandemia não é essencial, o salário que ela recebe para colocar a comida em casa é para ela e para os seus, essencial.
E agora, quando achamos que a vacina iria começar a reverter nosso tormento, somos surpreendidos com uma nova (e pior de todas) onda de contaminação. Não temos leitos suficientes, não temos profissionais suficientes, não temos vacinas suficientes. E me vejo cercada de perguntas. O que aprendemos sobre o coronavírus nesse último ano? Quando a quantidade de pessoas vacinadas vai começar a fazer diferença? Se o governo tivesse feito a encomenda das nossas vacinas um ou dois meses antes, não estaríamos vivendo essa nova onda agora? Voltamos a estaca zero, onde profissionais da saúde não sabem lidar com o vírus e ainda permanecem tão poucos nos hospitais?
Por que os hospitais de campanha foram fechados antes mesmo de abrir? Por que durante a campanha para as eleições municipais de 2020 não houve uma nova onda, mas houve com as festas de fim de ano e o carnaval de 2021 que não aconteceu? E a população? Não consegue ainda achar um meio termo entre o lockdown total e o baile funk?
As vidas são sim importantes, são mais que isso, são essenciais, sem relatividade. Cada vida, seja de um idoso, de um jovem ou de uma criança. Mas já não estava na hora de termos aprendido algo com isso tudo? Até quando vamos conseguir sobreviver dessa maneira, seja psicológica ou fisicamente? Viver nessa tensão constante, que não nos deixa um lastro de respiro, seja financeiro ou emocional? Até quando estaremos confinados em nossos anseios, medos e falta de perspectiva, seja para viajar ou para receber? Não, este não é um texto filosófico.
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