No texto anterior a esta coluna, você leu sobre o projeto de instalação do Parque Linear de Belo Horizonte e uma estação de trem que pode levar as pessoas do bairro Belvedere até o Inhotim, em Brumadinho. É fato que nossa cabeça voa só de pensar numa estrutura dessas para a capital mineira. Ao mesmo tempo, pode-se pensar que a estrutura beneficiaria apenas a uns poucos abastados moradores do bairro Belvedere e do Vila da Serra, já no município de Nova Lima. Entretanto, quando falamos em planejamento e gestão do turismo, estamos nos referindo a um enorme impacto na vida de pessoas que podem viver a quilômetros de distância de um atrativo turístico. E como isso acontece?!
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Para minimizar os impactos negativos de uma atividade turística desorganizada, e levando em consideração que o setor necessita de um sem número de equipamentos e serviços bem articulados para se ter um destino turístico organizado, muitos locais do mundo começaram a trabalhar o turismo de forma regionalizada.
Normalmente, regiões próximas geograficamente tendem a ter similaridades culturais, naturais e até mesmo arquitetônicas. E são exatamente essas similaridades que fazem com que o turista tenha vontade de circular além das barreiras municipais, para explorar mais um destino, e consequentemente ficar mais tempo, investindo em mais diárias e alimentação, movimentando assim a economia regional.
É baseado nessa simples – mas não fácil – equação, que tratamos a regionalização do turismo. Exemplos de regiões temos muitas. Quem nunca sonhou em, numa única viagem, conhecer diversos castelos?! Para esse público, nada mais atrativo do que a região do Vale do Loire, na França. Percorrendo 9 cidades, é possível conhecer pelo menos 20 castelos de tirar o fôlego. Sem falar na região da Toscana, na Itália, com suas 10 províncias e muitas vinícolas; e na Rota Romântica na Alemanha, que se estende por 400 km e passa por 12 cidades. No Brasil também temos belos exemplares, como a região da Serra Gaúcha, que nos mostra um belo exemplo de organização regional.
O que já acontecia como um movimento econômico natural acabou virando política pública no Brasil desde 2004: o Programa de Regionalização do Turismo. O programa foi criado a partir de recomendações da Organização Mundial do Turismo. Possuímos um Mapa Brasileiro do Turismo, que categoriza os municípios que aderem à política pública. Temos também eixos que organizam a política pública através da gestão descentralizada do turismo, do planejamento e posicionamento de mercado, da qualificação profissional, dos serviços e da produção associada ao turismo, do empreendedorismo, captação e promoção de investimentos, da infraestrutura turística, da informação ao turista, da promoção e apoio à comercialização e por fim, do monitoramento de projetos e ações do programa.
Documentos, planos e diretrizes temos aos montes. Desde última atualização do Mapa do Turismo Brasileiro, lançada pelo Ministério do Turismo em 2019, reuniram-se 2.694 cidades de 333 regiões turísticas. Minas Gerais sempre foi modelo na política de regionalização do turismo, com mais de 45 regiões turísticas.
Mas, mesmo com tudo isso, o país e o estado não conseguem entender o Parque Linear de Belo Horizonte como uma estrutura que se enquadra na política de regionalização do turismo.
Mesmo com sua localização estratégica na capital mineira – principal porta de entrada do estado, e reconhecida pela Unesco como Cidade Criativa pela gastronomia.
Mesmo passando por duas regiões turísticas reconhecidas e certificadas pelos governos estadual e federal, o Circuito Turístico do Ouro (através de Nova Lima) e o Circuito Turístico Veredas (com o fim da linha de trem em Brumadinho, no Inhotim).
Mesmo estes circuitos turísticos necessitando urgentemente de melhorar o fluxo turístico e diversificar a economia, tendo em vista as tragédias que aconteceram em Brumadinho e Mariana.
Mesmo a saída de Belo Horizonte para estes destinos abarrotada de prédios.
Mesmo com o potencial de melhoria na qualidade de vida de belorizontinos e novalimenses, de lazer que pode integrar moradores e visitantes e de melhora na mobilidade através do trem, que tanto nos conta da história de Minas, e que, aliás, é um dos principais meios de transporte em regiões europeias.
E o que fazemos?! Deixamos que se corra livre a possibilidade de leiloar uma área que poderia abrigar esse novo equipamento para o estado de Minas Gerais e suas regiões turísticas, para a possível construção de mais prédios e uma rodovia que dificilmente resolverá o problema do intenso fluxo de trânsito na região.
Não existe articulação entre o setor do turismo e as demais instâncias, que não percebem o potencial econômico sustentável da iniciativa. Precisamos aprender a inserir a prática das políticas públicas do turismo no dia a dia das decisões e articulações para o desenvolvimento do setor. Só assim o turismo poderá ser um dos protagonistas do desenvolvimento no Brasil.
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